A sabedoria das aves e as empresas familiares

Repartir poder e preocupações pode ser a chave do sucesso para empresas de pequeno porte e grandes corporações familiares. Com as transformações econômicas observadas no mundo inteiro e a mudança do perfil do emprego, tem aumentado consideravelmente o número de micro e pequenas empresas criadas no Brasil. Em grande parte, são negócios familiares, criados por trabalhadores desempregados ou que tomaram a decisão de se demitir, muitas vezes, investindo o dinheiro recebido por meio de programas de demissões voluntárias. O dado alarmante é que, de acordo com o Sebrae, 45% dessas empresas não ultrapassam o terceiro ano.

Analisando os motivos dessa vida tão breve, podemos chegar a várias explicações, mas acredito que uma delas é a mais importante e vale não apenas para o insucesso das empresas de pequeno porte, mas também o de grandes corporações familiares: a falta de preparação dos sucessores.

Em geral, as empresas familiares são criadas por um membro com espírito empreendedor e grande capacidade de gerenciamento do negócio. Entretanto, nem sempre esse fundador tem a preocupação de delegar poder, identificar os sucessores com mais aptidão para se envolver no trabalho e investir no seu aperfeiçoamento. As informações e decisões ficam centralizadas e todos dependem de uma só pessoa para dar a palavra final.

Esse tipo de comportamento tem uma analogia no mundo animal. Lembra o caráter dos búfalos, que andam em rebanhos e têm um líder do qual dependem totalmente. Tudo que o chefe faz o restante dos búfalos instintivamente imita, seguindo-o aonde quer que vá. Chegam ao cúmulo, segundo estudiosos de comportamento animal, de literalmente acompanhá-lo na morte. Como muitas espécies, os búfalos se afastam do grupo quando sentem se aproximar a hora da morte. É comum que alguns membros, incapazes de agir por vontade própria, sigam o búfalo-chefe, morrendo junto com ele.

Mas na natureza existem, por outro lado, brilhantes exemplos de gestão. Quem nunca observou uma revoada de pássaros ou gansos em época de mudança para locais de clima mais ameno? É só puxar pela memória e lembrar que esses animais voam numa curiosa formação, que lembra um V. Além dessa disposição dar maior resistência ao grupo para enfrentar o vento, pode-se observar que a ave que vem à frente está permanentemente mudando. Ela lidera a revoada durante um certo tempo, sendo substituída a seguir por outro membro, e assim sucessivamente, permitindo que todos se esforcem durante determinado período, mas tendo seu intervalo de descanso.

Essa imagem me parece suficientemente forte para exemplificar minha visão sobre a necessária descentralização do comando nas empresas. Ainda que o grupo empresarial seja também uma organização familiar, é importante que todos estejam a postos para assumir a liderança sempre que for necessário. A divisão do poder e das responsabilidades é benéfica para todos e, sobretudo, decisiva para a saúde do negócio. Afinal, ninguém é eternamente inquebrantável diante das chuvas, tempestades e ventanias do mercado.

Fica, portanto, o alerta aos responsáveis pelas empresas, sejam elas grandes ou pequenas: se quiserem ver prosperar o negócio que fundaram e ao qual se dedicam, sacrificando, muitas vezes, outros aspectos da vida, não sejam líderes búfalos. Usem sua sabedoria para repartir poder e, conseqüentemente, preocupações. Como as aves migratórias, saibam compartilhar o sucesso e os maus momentos, e não hesitem em delegar atribuições a outras pessoas, sejam elas da família ou não. Não podemos mais deixar que seja verdade aquele ditado segundo o qual a primeira geração constrói, a segunda mantém e a terceira leva à falência. É hora de enxergar longe e garantir um futuro duradouro para as empresas, preparando agora os sucessores de amanhã.

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