Cada mico em seu galho

Não são poucos os analistas que comparam o mercado de ações a uma selva, em que é preciso conhecer muito bem os ambientes e as regras para sobreviver. Se é uma selva, há um casal de leões reinando acima de todos. Mesmo quem não investe na Bovespa tem os dois nomes na ponta da língua: “Dizem que é bom investir na Vale e Petrobras”.

Logo, o investidor iniciante aprende um pouco mais sobre o mercado e descobre os grandes setores. Passa a dizer que é bom investir no setor elétrico, bancário, de mineração ou construção. Alguns desses setores se movem vagarosamente, como uma manada de elefantes, trazendo lucros certos, mas lentamente. Outros são dinâmicos e eficientes, como uma alcateia. Em um dia, estão aqui e, em outro, ali, liderados por seus lobos-alfa – empresas que volta e meia se encontram na carteira recomendada de várias corretoras.

 

Em seguida, um pouco escondidas, estão as small caps. Você precisa conhecer muito do ambiente para descobri-las. Eles vivem em cavernas, ou entocadas na terra, mas, de vez em quando, aparecem e fazem a alegria dos investidores/exploradores mais ousados. E há o que é considerado o fim da cadeia na selva da Bovespa. Algumas pessoas as chamam de ações “de terceira linha”, mas a maioria as conhece por sua classificação zoológica: micos.

 

São empresas em geral pequenas, pouco procuradas por grandes investidores, que não aparecem em nenhum índice e costumam ter uma volatilidade maior. Os preços dos micos sobem e caem muito em pouco tempo, gerando lucros absurdos. Como são ações com baixo volume de investimento, qualquer boato faz com que seus preços disparem ou despenquem – às vezes, até 50% em um dia. Geralmente, esses boatos são plantados por especuladores, o que aumenta o risco de se investir em micos.

 

Um engano comum das pessoas é associar “micos” com “empresas ruins”. Há muitas organizações boas que não atraem a atenção de grandes investidores e ficam “dormindo”, sem movimentação, por longos períodos na bolsa. A Bovespa tem interesse em atrair cada vez mais empresas pequenas, o que deve aumentar o número de possíveis micos.

Conhecendo-os bem, eles podem ser uma boa adição à sua carteira, acompanhe:

 

Mico-leão dourado

Vez por outra o dão por extinto. Passam-se anos e ninguém o vê, até que sua pelagem chamativa o torna alvo de atenção de todos. Então, ele se torna a grande estrela do mundo animal por algum tempo até se recolher novamente. Confira alguns exemplos de micos-leões da Bovespa:

 

  • Tectoy (TOYB3) Por um tempo, essa empresa foi a grande novidade no mercado nacional de brinquedos, trazendo sempre as maiores inovações tecnológicas e sendo a parceira da então gigante dos videogames Sega. Uma série de fatores, incluindo a liberação das importações, fez a companhia se refugiar, por determinado período, na produção de programas para telefones celulares, o que derrubou suas ações para a casa dos R$0,05. Recentemente, ela lançou um novo console de videogame, feito sob medida para países em desenvolvimento e, com isso, suas ações voltaram a ser procuradas.
  • Gradiente (IGBR3) Quem está na casa dos 40 certamente se lembra de ter pelo menos um aparelho eletrônico em casa com um G dentro de círculos concêntricos. Isso, é lógico, foi antes de a empresa passar por várias dificuldades e se afundar em dívidas. Por algum tempo, a família Staub, proprietária da marca, sempre conseguia fazer a companhia levantar após a queda. Entretanto, chegou um momento em que isso não foi mais possível. Agora, Eugênio Staub, presidente da organização, costura um novo acordo para reerguer a marca através de uma nova empresa, que teria como sócios, além dele, a companhia norte-americana de eletrônicos Jabil, a Agência de Fomento do Estado do Amazonas S.A. (AFEAM) e os fundos de pensão da Petrobras e Caixa. Esse plano foi o suficiente para atrair os caçadores de micos.
  • Ferreira Guimarães (FGUI4) Fundada em 1906, companhia do setor têxtil que já viu dias muito melhores está atualmente em recuperação judicial (medida legal destinada a evitar a falência). As ações da Ferreira Guimarães dobraram de valor entre fevereiro e março deste ano graças a rumores de interesse da Coteminas (CTMN4) em adquirir a empresa – ainda no aguardo de novidades.

 

Mico-leão-de-cara-preta

Acredita-se que existam menos de 300 animais dessa espécie – todos vivendo em uma pequena ilha do Paraná. Trata-se, para todos os efeitos, de uma espécie extinta, que só sobrevive por teimosia mesmo. As possibilidades de encontrá-la no, digamos, mundo real são nulas. Animais em situações similares só sobrevivem em condições controladas, como: zoológicos, reservas ou, em nosso caso, na bolsa de valores.

 

  • Cobrasma (CBMA4) Empresa ligada a equipamentos de ferrovia que encerrou suas atividades em 1993. Desde março de 2009, suas ações têm se valorizado constantemente e…  sim, você leu direito. Para todos os efeitos, a companhia está desativada desde 1993 e, mesmo assim, suas ações estão subindo.
  • Cerâmica Chiarelli (CCHI3) Outra organização em recuperação judicial.

 

Bugio

É um dos maiores micos do continente americano. Apesar de seu tamanho, não é muito ativo e se move pouco, buscando folhas, brotos, frutos e trepadeiras que ficam perto de seu galho. São nossos bugios:

 

  • São Paulo Turismo (AHEB5) Ao olhar o volume de negócios dessa empresa, também conhecida como SPTuris, uma coisa fica clara: dificilmente ele é diferente de zero. Passam-se semanas sem que ninguém se interesse em comprar ou vender suas ações. Aí, de repente, acontece uma corrida em busca de seus papéis. Dia 29 de janeiro, por exemplo, registrou mais de 500 negócios feitos com a AHEB5. No dia seguinte, foram dez e, no outro, cem. E voltou-se ao habitual zero.
  • Banco da Amazônia (BAZA3) Um dos poucos bancos autorizados a realizar operações de poupança rural, o Basa tem grandes ligações com o Banco do Brasil (BBSA3), o que leva a constantes rumores sobre incorporações.
  • Tecnosolo (TECNO3) Empresa de engenharia de solo envolvida em obras públicas de todo o País. Rumores sobre a escolha dessa companhia para tocar as obras de Angra 3 e estádios da Copa a tornam alvo fácil de especuladores.
  • Hercules (HETA4) Mico adormecido, fabricante de utilidades domésticas, pertencente à Mundial (MNDL3). Em determinado dia, pode ter um volume de transações extremamente baixo, igual a 1, e, quatro dias depois, registrar 274 mil transações.

 

Macaco-prego

É considerado um dos micos mais inteligentes, sendo um dos poucos que desenvolveu o uso de ferramentas simples, como gravetos para pegar insetos e mel e pedras para quebrar cocos ou cavar raízes. Essa esperteza faz com que as pessoas parem e pensem se são mesmo micos, ou alguma coisa a mais. Temos vários macacos-prego entre nós:

 

  • Marisol (MRSL4) Em novembro de 2008, a ação da Marisol estava abaixo de R$1. No mês seguinte, era comercializada próximo dos R$2. A companhia, detentora das marcas Lilica Ripilica e Rosa Chá, é alvo frequente de especulações. A mais recente onda de alta da empresa ocorreu devido à criação de uma rede de varejo destinada ao público de classes mais baixas, a One Store.
  • Ecodiesel (ECOD3) Quem frequenta chats e fóruns da bolsa sabe que a Ecodiesel é um dos assuntos favoritos, principalmente quando se trata de especulação. A Petrobras vai comprar ou não? Enquanto isso, a organização planeja aumentar seu capital, estudando a possibilidade de lançar mais ações no mercado e tomar outras medidas que recheiem seu capital em mais R$90 milhões. Do outro lado, reestrutura suas dívidas de curto prazo, conseguindo 12 meses de carência pela frente.

 

Macaco-aranha

Os braços são extremamente longos em relação ao corpo, o que dá ao macaco-aranha muita agilidade, subindo e descendo com bastante rapidez. Alguns caçadores consideram sua carne a mais saborosa da Amazônia. Recomenda-se muita cautela ao lidar com esse tipo de mico, pois nunca se sabe para que lado ele vai se mover.

 

  • Haga (HAGA3) Fabricante de fechaduras e cadeados. Em 12 de maio, suas ações foram cotadas na bolsa a R$27,80. Em 2 de junho, estavam a R$60,02. Certo, a empresa anunciou uma reestruturação de suas dívidas e um agrupamento de suas ações, mas, mesmo assim, a subida meteórica tem todo o jeitão de ataque especulativo.
  • Rasip Agropastoril (RSIP3) Originalmente, Rasip significava Randon Silo Pastoril. Continua ligada à Randon (RAPT4) e teve um primeiro trimestre negativo em 2009. Em maio, disparou de R$0,55 para R$0,72, mas logo em seguida caiu para a casa dos R$0,40. É um verdadeiro estudo de caso de especulação, com todos os elementos presentes.
  • Minupar (MNPR3) Empresa de alimentos que recentemente anunciou o desdobramento de suas ações: para cada ação que uma pessoa possuísse, receberia outras três. A Minupar teve um ano agitado, envolvida em rumores sobre sua fusão com a Perdigão e/ou Minuano. Por enquanto, prefere seguir sozinha.
  • Banestes (BEES3) Alguma coisa está muito errada quando a própria bolsa de valores questiona a companhia sobre a oscilação repentina de suas ações. O Banco do Espírito Santo (Banestes) está nessa situação, envolvido em uma interminável negociação de venda para o Banco do Brasil.

 

Macaco da noite

A pelagem da cabeça dá a impressão de estar sempre com um grande sorriso, mas não se engane, esse mico não é nada amigável. Por ser notívago, aparece apenas quando ninguém está esperando. Na maior parte do tempo, permanece escondido, dormindo, sem se mexer.

 

  • Inepar Energia (IENG3) Companhia que opera usinas a biodiesel e está aguardando a reestruturação do grupo Inepar. Não se sabe ainda como ficarão suas ações após isso. Mico vulnerável a ataques especulativos.
  • Triunfo (TPIS3) Atua em concessões rodoviárias, terminais portuários e energia elétrica. Depois de muito tempo, esse mico apresentou uma boa notícia: fechou o primeiro trimestre com um lucro líquido de R$11,13 milhões, ante uma perda publicada de R$11,43 milhões no mesmo período do ano passado. Além disso, a empresa anunciou uma possível venda de ativos, gerando mais especulações e forte alta em suas ações.
  • Laep (Milk11) A controladora da Parmalat no Brasil também passa por um período severo de reestruturação. Por meio de um acordo recente, a Companhia Brasileira de Agronegócios e Alimentação deverá ficar com as fábricas de biscoito da Laep. Em relação ao restante, há incessantes rumores de venda para a Nestlé. Essas notícias fazem da Milk11 uma constante na lista de compra de especuladores.
  • Lupatech (LUPA3) Outra figurinha carimbada nas discussões de investidores, a Lupatech atraiu até mesmo a atenção das agências de rating. O Moody’s, por exemplo, estuda rebaixar seu nível. Recentemente, lançou debêntures conversíveis em ações.

 

Caçadores de mico

Há basicamente dois tipos de caçadores de mico agindo na bolsa: o amador e o profissional. O amador é aquele que gosta de variar sua carteira, estuda o mercado e as empresas, encontra uma em que acredita e compra, não se importando em esperar para ver o resultado aparecer. Não há nada errado em ser esse tipo de investidor.

 

Já o profissional é o tipo mais perigoso. Ele espalha rumores, dá “dicas”, alimenta fóruns e rodinhas de conversas com notícias falsas. Não se preocupa se a empresa só existe mesmo naquele papel da bolsa. Ele enche a bolsa de armadilhas esperando pegar alguns investidores desavisados que, realmente, veem a empresa se valorizar 50%, 70% em poucos dias, entrando assim no negócio e alimentando ainda mais a alta do papel. Então, o caçador profissional age, vendendo os títulos que comprara anteriormente, tornando-se a única pessoa a lucrar com essa história.

 

Para evitar essas armadilhas, recomenda-se checar as informações e saber se o mico está vivo e em boa saúde fundamentalista antes de investir.

 

Colaboração: Brasílio Andrade Neto

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