Ciúmes e trabalho: uma relação perigosa

Como controlar o ciúme no trabalho?

Pele vermelha, veias saltadas, coração acelerado, fisionomia severa, sensação de entrar em colapso nervoso. Quem já viveu alguma vez a sensação provocada pelo ciúme sabe o quanto ele pode mexer com o ser humano e fazê-lo ver os acontecimentos de maneira deturpada. Sentimento congênito à natureza humana, também pode ser utilizado de forma positiva. Para isso, basta saber lidar com ele. Mas também existe um tipo de ciúme que pode afetar o desempenho de uma pessoa ou, até mesmo, de uma equipe de trabalho inteira. Aprenda a evitar que isso aconteça e canalize suas emoções de forma a trabalhar por você. Como? Conferindo nos próximos parágrafos.

A cooperação dentro do ambiente de trabalho é fundamental para que os resultados sejam positivos para a empresa e, consequentemente, para os funcionários. Mas, em alguns casos, não é exatamente dessa forma que ocorre. Situações adversas podem prejudicar o desempenho de um ótimo vendedor e as vendas de uma grande empresa. Ao viver esse tipo de situação, é preciso ter controle e agir de maneira correta para que o ambiente de trabalho não se transforme em um inferno.

Há funcionário que se acha injustiçado porque o colega vende mais. Esse é o tipo de ciúme que afeta a empresa como um todo, uma vez que o vendedor que se destaca passa a ser alvo de críticas do gênero: “Você é fominha”, “O cliente chega e você pula no pescoço dele para fechar a venda”, “Você só pensa em si mesmo”, entre outros exemplos.

Ciúmes no ponto de venda

Essa delicada situação está ocorrendo com Israel Cruz, analista de crédito do interior de Minas Gerais. Em entrevista à VendaMais, Israel afirma que procura entender as motivações que levam seus colegas a reagirem dessa maneira. “Eu indaguei por que eles estavam me tratando assim. Eles disseram que minha mesa fica na ponta da loja e, quando os clientes entram, vêm direto a mim e eu ‘engulo’ todos, não deixo nada pra eles”, conta. São circunstâncias como essa que tornam desconfortável o cotidiano de trabalho do profissional.

Mesmo incomodado, Israel garante que o ocorrido ainda não inibiu sua produtividade: “Essa situação não atrapalha meu desempenho, pois eu me preocupo com meu cliente e em fazer uma venda de qualidade”. E ele ainda complementa dizendo que, “ao mesmo tempo, não incentiva isso, pois sou motivo de chacota e brincadeirinha na empresa”.

O analista de crédito diz que não procurou seu superior ou o departamento pessoal, porque acredita que seria interpretado como quem quer “puxar o tapete” dos colegas. O fato é que o desempenho de Israel em relação aos colegas já chegou a 150%.

Para tentar se conciliar com os demais funcionários, ele sugeriu um acordo. “A cada mês, propus que a gente intercalasse a mesa da frente. Assim, todos teriam acesso aos bons clientes. Já tentei fazer outra coisa também. Havia alguns contratos que eu entregava a cada um deles, por exemplo: se eu fizesse três vendas no dia e eles não tivessem vendido nada, eu oferecia um contrato para eles, mas já chegaram a me dizer que não precisavam de esmolas. Depois disso, falei para trocarmos de mesa, mas também não quiseram”, conta.

Entenda a emoção

Ocorrências como a de Israel podem ser mais comuns do que se imagina. Você mesmo pode se identificar com o caso por já ter vivido ou passado por situações semelhantes no trabalho. A reportagem da VendaMais entrevistou dois profissionais gabaritados para compartilhar noções e práticas que podem melhorar o convívio no trabalho e, consequentemente, propiciar a conquista de resultados positivos, tanto individuais quanto coletivos. O primeiro deles é Francisco Carlos Franco, doutor em psicologia da educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e professor do programa de mestrado em semiótica, tecnologias da informação e educação da Universidade Braz Cubas, em Mogi das Cruzes, no interior paulista.

Franco destaca que “o ciúme é uma das emoções humanas mais intensas, sendo um estado emocional comum entre as pessoas, tanto no âmbito pessoal quanto profissional. Assim, é natural termos ciúmes, porém o problema está em como se convive com esse sentimento, ou seja, o que é preciso fazer com o ciúme que se sente de um colega de trabalho”.

Para o psicólogo, é necessário estar consciente de que o ciúme intenso, sem controle, pode desencadear um processo destrutivo nas relações pessoais e de trabalho e desestabilizar a convivência não só entre as partes envolvidas, mas também afetar todo o grupo de trabalho e trazer prejuízos aos profissionais e à organização. E a perda é grande, com clima tenso, pessoas sem foco nem prazer em desempenhar suas atividades profissionais.

Assuma a responsabilidade

Afinal de contas, como atuar para que haja cooperação no ambiente de trabalho de forma que o ciúme não impeça o desempenho? Há a necessidade de que a “liderança que atua com as equipes de trabalho estabeleça normas de conduta e de convivência, o que pode ser efetivado com a participação de todo o grupo”, diz Franco. Se as normas são construídas coletivamente, as pessoas se sentem protagonistas e corresponsáveis pela sua condução.

A partir desse ponto, algumas posturas, atitudes e comportamentos devem ser debatidos e refletidos, tendo em vista o bem-estar coletivo, a cooperação entre as pessoas e o respeito mútuo. Para Franco, dessa forma, “o foco sai das relações individualistas, egoístas e mesquinhas e passa para uma perspectiva de construção de um ambiente coletivo de trabalho pautado na ética e em relações mais humanizadas no contexto organizacional”.

Resolver o pesado clima que envolve os colaboradores não é tarefa fácil. Se não há interferência dos superiores responsáveis, é preciso partir para o diálogo. Franco lembra que, nesse aspecto, “todo esse processo deve se orientar pelo respeito ao outro e pela ética, pois não precisamos, necessariamente, ter um comportamento de enfrentamento e destruição do outro”. Osconfrontos surgem por determinadas atitudes, e não pela desvalorização do outro, que precisa ter seus atributos positivos valorizados e percebidos.

Outro que explica os diferentes pontos do ciúme é Marcos Meier, psicólogo, professor de matemática e mestre em educação. Palestrante nacional e internacional de relacionamento interpessoal nas empresas e de educação e psicologia, ele explica que há dois tipos de ciúme: o bom, construtivo, e o mau, destrutivo. “Ciúme bom se chama cuidado, proteção. Se você tem ciúmes do seu aparelho de som, é porque não quer que ninguém o estrague. Ao emprestar o aparelho, você dá mil recomendações para que a pessoa cuide bem, mas você empresta. Isso é um ciúme construtivo. O ciúme destrutivo não cuida. Ele quer que o objeto de atenção seja exclusivamente propriedade do ciumento. Há um desejo oculto de que ninguém mais seja beneficiado pelo objeto, por sua presença ou, até mesmo, por sua existência. É egoísmo na mais pura forma”, afirma.

Casos como esse são comuns em vendas. Quem nunca se deparou com um vendedor que esconde informações confidenciais de clientes da empresa porque quer tê-las apenas para si mesmo? A longo prazo, o que poderia ser uma vantagem acaba se voltando contra o profissional, que, na opinião de Franco, pode ser visto como alguém não confiável e sem ética. Para Meier, pode ser um problema de gerenciamento, pois o banco de dados é um patrimônio da empresa e, portanto, é coletivo.

Outro caso comum é o ciúme do cônjuge pelo trabalho do companheiro. Nesse caso, quem sofre com o ciúme deve investir em melhorar sua própria estima e fazer dela um ponto positivo individual com vista ao coletivo.

Potencialize o ciúme positivo

Franco e Meier acreditam que o ciúme construtivo pode ser benéfico no trabalho. Franco acha que o ciúme é positivo “quando impulsiona a pessoa a desenvolver as habilidades e/ou competências dos atributos que o outro tem e que desencadearam o ciúme nela”. Para Meier, “uma equipe que se cuida é saudável. Quando um colaborador protege o outro de entrar em enrascadas, é bom. Quando os vendedores dão dicas uns aos outros para que todos se tornem melhores e tenham mais sucesso, é sinal de que os vínculos estão saudáveis. Isso é ciúme bom”.

A atitude, nesses casos, é fundamental. Com base nas explicações dos especialistas, fica claro que é possível contornar as situações se houver harmonia, compreensão e, acima de tudo, espírito de equipe com base nos valores individuais. Um time de futebol não vence se os jogadores não atuarem coletivamente. Uma empresa não vence se o individualismo for acima dos interesses gerais. A situação precisa ser assim encarada, e partir das peças que movem os lucros e os resultados, com ajuda e empenho mútuos.

6 formas de repensar as ações na organização

Francisco Franco destaca palavras-chave que norteiam um bom ambiente e o sucesso individual e coletivo em uma empresa. Analise como você e sua equipe têm atuado em relação aos seguintes pontos:
 

 

 

  smiley

Competição

ou

Cooperação
Ciúme

ou

Admiração
Individual

ou

Coletivo
Destruição

ou

Construção
Sonegação

ou

Partilha
Desestabilidade

ou

Estabilidade

Supere o ciúme!

Marcos Meier oferece nove dicas que podem ser fundamentais para superar o ciúme no trabalho:

   1. Compartilhe informações com seus colegas. Isso abre espaço para que eles façam o mesmo com você.
   2. Ter muito ciúmes é sintoma de autoestima baixa. O ciumento precisa de ajuda terapêutica.
   3. Parabenize o sucesso de seu colega.
   4. Elogie a criatividade de seus colegas.
   5. Se você for alvo de ciúme, não contra-ataque. Apenas mostre que seu sucesso foi resultado de estratégias bem aplicadas.
   6. Quando você receber algum prêmio por seu desempenho, agradeça também aos seus colegas que o ajudaram. Ajuda indireta também é ajuda. Agradeça sempre!
   7. Converse com sua equipe sobre o uso de críticas a colegas. Isso é outro nome para “fofoca”.
   8. Chefes também são seres humanos. Elogie-os com sinceridade, relacionando o elogio ao desempenho específico que gerou o fato positivo para a empresa.
   9. Não elogie “inteligência”, “criatividade”, “esperteza”, “perspicácia” ou qualquer outro termo resultado de interpretação. Elogie fatos reais.

           

Para saber mais:

Francisco Carlos Franco é doutor em psicologia da educação pela PUC de São Paulo e professor do programa de mestrado em semiótica, tecnologias da informação e educação da Universidade Braz Cubas, em Mogi das Cruzes, SP. Ele atua como palestrante e ministra cursos de formação em empresas e prefeituras.
E-mail:[email protected]

Marcos Meieré psicólogo, professor de matemática e mestre em educação. Ele é palestrante nacional e internacional a respeito de relacionamento interpessoal nas empresas e de educação e psicologia. Além disso, é autor, entre outros livros, de Mediação da aprendizagem eO castelo das sete portas. Suas obras estão na loja virtual: www.kapok.com.br

 

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