Eduardo Giannetti da Fonseca

O Brasil, a economia e as vendas Eduardo Giannetti da Fonseca é graduado em Economia e em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo e Ph.D. em Economia pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Em 2004, foi eleito Economista do Ano, pela Ordem dos Economistas de São Paulo.

É professor do Ibmec São Paulo e autor dos livros Felicidade, O Mercado das Crenças e O Valor do Amanhã, entre outros. Em nove de outubro, passado o primeiro turno das eleições, ele abre o Fórum Internacional da ExpoVendaMais, com a palestra: ?Onde estão as oportunidades de negócio?.

Em entrevista exclusiva, Giannetti faz uma análise da atual conjuntura econômica brasileira e das perspectivas para o mercado de vendas para o próximo ano. Explica também por que é fundamental que você, vendedor de sucesso, acompanhe a evolução dos indicadores econômicos de seu país. Confira!

VendaMais ? Estamos a um mês das eleições, período em que sempre se criam muitas expectativas. O que se pode esperar da economia, em 2007?

Eduardo Giannetti ? Vai depender muito do resultado das eleições. O Brasil, hoje, tem uma situação macroeconômica bem equilibrada, pois estamos cumprindo a meta de inflação, a dívida pública está sob controle e as contas externas estão superavitárias. Mas, por outro lado, o País não cresce, o que deixa o mercado nacional muito restrito. O grande desafio do novo governo será tomar medidas que permitam ao Brasil encontrar o caminho de um crescimento mais acelerado. Essas medidas não são simples de serem implementadas, pois pedem reformas nos campos da previdência, trabalhista, tributação e dos gastos públicos.

VM ? Quais os cenários mais prováveis para a área de vendas no próximo ano?

EG ? Desde o Plano Real, a média de crescimento do PIB brasileiro tem ficado em 2,4% ao ano. Se nada for feito, não há expectativa de aumento substancial de renda e de vendas. Em especial porque o crescimento das vendas depende do crescimento da economia do País que, por sua vez, depende de um maior investimento na ampliação da capacidade de produção das empresas. Em alguns anos, a economia ameaça um crescimento um pouco maior, como ocorreu em 1995, 2000 e 2004. Mas esse ensaio de crescimento não tem seqüência, desdobramentos. E a economia acaba regredindo para um nível muito baixo de expansão. Enquanto o Brasil cresce 2,4% ao ano, países como Chile, Coréia do Sul, Índia e China crescem, em média, 8% ao ano. E tudo isso significa mercado em expansão, maiores vendas, mais renda no bolso do consumidor e uma expectativa mais favorável para a ampliação dos negócios.

VM ? Quais setores de vendas têm as melhores perspectivas?

EG ? Nos últimos anos, o setor que vem liderando a expansão do consumo é aquele ligado ao crédito. O Brasil viveu, nos últimos três anos, uma expansão muito forte do crédito à pessoa física. Então, bens de maior valor agregado, que dependem mais da oferta de crédito, tendem a liderar as vendas. Mas acredito que esse movimento está se esgotando, pois a inadimplência vem aumentando muito. Por isso, creio que o crescimento será mais equilibrado e deverá recuperar um pouco a venda dos chamados bens de consumo popular, como: alimentos, bebidas, vestuário.

VM ? Com esse aumento da inadimplência, que providência tomar em relação ao crédito? O que as empresas e os vendedores devem fazer?

EG ? É preciso ter uma análise muito mais criteriosa do risco representado por uma expansão indevida do crédito. As empresas terão de ser mais seletivas. Os próprios financiadores perceberam que estão assumindo riscos exagerados.

VM ? Muitas pessoas acreditam que economia é assunto apenas para economistas. No caso de um vendedor, o que ele precisa saber sobre economia?

EG ? Um vendedor precisa acompanhar a evolução dos principais indicadores econômicos: saber se a renda do consumidor está aumentado ou caindo, em que direção estão se movimentando os empregos na região em que ele trabalha, se o crédito está se expandido ou se contraindo, saber os indicadores de preço, os movimentos da inflação. É fundamental, para quem trabalha com vendas, estar a par das informações econômicas que são relevantes para a sua atividade.

VM ? Como a economia interfere no dia-a-dia do vendedor?

EG ? Se não sabe qual é a inflação corrente do país e quais são as expectativas de inflação, não conhece sequer seu faturamento real e se o preço que ele cobra pelo que vende está adequado. Mesmo uma informação de mercado é importante para saber onde está o maior nicho, para que ele possa expandir seus negócios.

VM ? Quais são os mitos e as verdades da economia, na área de vendas?

EG ? A grande lição é que não se pode confundir o macro com o micro. O fato de você ter alguma tendência que vale para o conjunto do sistema não significa que ela se aplique diretamente a cada um dos componentes desse sistema. Então, você pode ter uma economia com um crescimento medíocre, mas alguns setores dentro dessa economia apresentando taxas de expansão muito expressivas. Uma grande falácia é você fazer uma aplicação mecânica e muito linear do que vale para o todo em relação às partes. O comportamento do todo nem sempre está refletido no comportamento de cada uma das partes. Trata-se de uma generalização indevida. É importante saber quais são as características do conjunto. Mas é preciso também ter um entendimento da dinâmica das partes que geram esse comportamento agregado.

VM ? Em seu mais recente livro, O Valor do Amanhã, você analisa os juros não só na esfera financeira, mas como um fenômeno maior. O que se pode dizer da relação entre os juros e a área de vendas?

EG ? As vendas, muitas vezes, se dão no tempo. Por exemplo: se você vende um produto agora, mas só receberá daqui a três meses, é preciso levar em conta que o recurso que não está disponível imediatamente tem um custo: a taxa de juro do país. Na verdade, se você vende para receber daqui a três meses, está financiando o seu cliente. E o valor desse financiamento é determinado pela taxa de juros do país. O vendedor também pode obter um financiamento do seu fornecedor, receber uma mercadoria e pagar por ela daqui a três meses. De repente, ele poderá financiar o seu cliente se obtiver um financiamento do fornecedor. Agora, ele precisa ter a noção de que, em um país com juros tão elevados como é o caso do Brasil, todas as trocas no tempo têm um custo muito elevado. Outra coisa muito importante é ter uma clara noção entre gastos correntes e investimento. O investimento é um capital que você cria, um ativo permanente do qual vai se beneficiar durante muito tempo. Já um gasto corrente é alguma coisa que se esgota no momento e não tem o poder de multiplicar a renda futura. O retorno do capital é o juro, é o recurso que ele deixa de consumir no presente, em nome de um ganho futuro. É o prêmio da espera. A dívida é exatamente o contrário disso, é o preço da impaciência.

VM ? Por falar em investimento, o Brasil tem ambiente favorável ao empreendedorismo? Por quê?

EG ? Esse tema tem muitas dimensões. Uma muito evidente é a dificuldade de abrir um novo negócio no Brasil. O Banco Mundial fez um estudo comparativo e mostrou que, no Brasil, demora-se, em média, 152 dias para se criar uma empresa. Em países em que o ambiente de negócios é mais favorável ao empreendedorismo, como a Austrália, o tempo é de apenas dois dias. No Canadá, são três dias. O outro lado dessa moeda é o tempo que se leva para fechar uma empresa no Brasil, que chega, em muitos casos, a mais de dez anos. Uma economia de mercado com um ambiente institucional adequado é uma economia na qual é muito fácil abrir e fechar negócios. Isso está muito longe de ser o caso do Brasil. Outra dimensão é o espantoso crescimento da informalidade nas relações econômicas no País, tanto no mercado de trabalho quanto na própria vida empresarial. Eu costumo brincar que se o equivalente brasileiro da Microsoft tivesse nascido no Brasil, estaria até hoje em um fundo de garagem.

VM ? Você afirma que a relação entre economia e trabalho deve transcender o plano econômico, sustentando uma visão integrada do ser humano. Como isso se aplica na relação entre os líderes e as equipes de vendas?

EG ? A mensagem básica é que uma pessoa que vê sentido no que faz será mais eficiente, produtiva e inovadora. O papel do líder é exatamente mobilizar esses recursos de talento, criatividade e empenho para a atividade realizada. Para isso, é preciso que as pessoas sintam-se bem naquilo que fazem. Há pessoas que são talhadas para a atividade da venda, que sentem-se muito bem vendendo e gostam do desafio da venda. Outras, não tanto. O líder tem de ter sensibilidade humana para saber colocar a pessoa certa no lugar certo, para que ela dê o melhor de si. O que acontece, hoje, é que uma empresa em que as pessoas não têm nenhuma alegria no que fazem está se condenando ao desaparecimento, pois essas pessoas dificilmente manterão níveis de produtividade e eficiência que permitam que essa empresa sobreviva em um mercado cada vez mais competitivo.

VM ? Você defende a idéia de que a empresa em que as pessoas se sentem mais realizadas e encontram sentido no que fazem tende a apresentar melhores resultados econômicos. Isso também vale para a área de vendas?

EG ? As pessoas faltam menos ao trabalho, fazem suas tarefas com muito mais empenho e cuidado, mobilizam sua criatividade para inovar. A área de vendas requer doses cavalares de motivação. Sem motivação robusta, não há esforço de venda. E essa motivação não vem do nada. Ela precisa ser despertada e renovada. A liderança tem um papel decisivo nesse processo de permanente mobilização das energias necessárias para um esforço de vendas agressivo.

VM ? Em seu livro Felicidade, você fala sobre o que torna as pessoas felizes, estabelecendo uma relação entre o bem-estar objetivo (renda, consumo, moradia) e o bem-estar subjetivo (grau de satisfação com a vida). Como isso se apresenta no dia-a-dia do vendedor?

EG ? O vendedor precisa estar atento ao fato de que a realidade objetiva não é toda a realidade. Muitas vezes, o dom de um bom vendedor está exatamente em conseguir capturar a imaginação dos seus clientes. O que ele vende não é só um produto físico, com atributos palpáveis. São também as associações, a maneira como é apresentado, todo o entorno emocional que cerca o ato de compra. É muito importante que se lembre que aquilo que é mensurável e objetivo é apenas uma parte da realidade. Muito do que se desenrola nas relações humanas não tem essa característica da objetividade. Estamos aqui, no plano da intersubjetividade. O ato de venda é um ato de relação humana, antes de qualquer outra coisa. Especialmente quando se trata de bens simbólicos ou gêneros que não são de primeira necessidade.

VM ? Que mensagem você deixa para os vendedores de todo o Brasil?

EG ? Eu gostaria de deixar clara a mensagem do quanto ainda precisamos fazer para que o País volte a crescer a taxas elevadas e de forma sustentável. Teremos uma chance rara, agora, com as eleições. É uma oportunidade para tomar as medidas que há muito tempo o Brasil vem adiando. Vou chamar todos os vendedores a participar do processo político e valorizar esse momento da democracia, para fazer uma renovação periódica dos governantes. Sou muito apreensivo quanto à descrença e desânimo, em relação ao processo democrático, que vêm tomando conta da sociedade brasileira. Isto é um desperdício para todos nós: não tirar o menor proveito dessa oportunidade que teremos, como sociedade, de avançar.

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