O cérebro como cliente

O sucesso da venda de um produto ou serviço depende de como o cérebro humano processa e memoriza as informações sobre ele

O sucesso da venda de um produto ou serviço depende de como o cérebro humano processa e memoriza as informações sobre ele. O autor do livro O cérebro consumista conta algumas técnicas para chamar atenção da mente e do subconsciente.

Sem dúvida nenhuma, o cérebro é a “máquina” mais poderosa e complexa do nosso corpo. Apesar de já entendermos um pouco como ele funciona e quais são as capacidades que ele possui, ainda há algo que exige mais explicações e que desafia a ciência moderna: compreender como o ser humano aprende e memoriza.  Conhecido como o guru mundial da neurociência, A. K. Pradeep não só tem conhecimento sobre como reage inteiramente o cérebro, como ajuda empresas do mundo todo a entenderem esse órgão e, assim, realizarem negócios de sucesso. Tudo isso é relatado em seu best-seller The buying brain, que acaba de ganhar uma versão brasileira – O cérebro consumista – publicado pela editora Cultrix.

Pradeep é presidente da NeuroFocus, empresa do grupo Nielsen com atuação mundial na área de neuromarketing, e auxilia as grandes companhias a aplicarem os últimos avanços da neurociência na criação de marcas, de produtos, de desenhos de embalagens, de campanhas de marketing e de ambientes de lojas que sejam realmente eficazes para atrair a atenção do cérebro. Microsoft, Google e Citibank são algumas das gigantes que o especialista já prestou consultoria.

O Dr. A. K. Pradeep falou com exclusividade à revista VendaMais sobre as estratégias de marketing na era da neurociência e os conceitos abordados no livro.

Existem diferenças geográficas que influenciam a mente do consumidor ou os segredos apresentados no livro valem para todas as pessoas, independentemente de viverem no Oriente ou Ocidente?
Um fato central e científico sobre o cérebro humano – e um dos principais fatores que permitem que a neurociência do consumo seja tão eficaz – é que o nosso cérebro é notavelmente similar, não importando o local em que vivemos. Alguns fatores culturais podem influenciar a forma como o cérebro responde a um estímulo no nível subconsciente, mas a verdade é que por nosso cérebro funcionar de forma tão parecida o teste neurológico é o método de pesquisa mais preciso e confiável ​​do mercado para descobrir como os consumidores reagem. Atuamos em vários continentes com o NeuroLabs, e uma das conclusões a que chegamos  é que as respostas subconscientes dos consumidores são iguais, independentemente de qual país eles chamem de lar. Mas é claro que detectar as diferenças também é muito importante.  

O que a evolução do cérebro humano tem a ensinar para o neuromarketing?
O cérebro humano moderno tem cerca de 100 mil anos de idade. Ele ainda mantém os sistemas que os humanos primitivos utilizavam para sobreviver. Mas hoje a experiência mais próxima de uma “selva” que a maioria de nós tem é o supermercado. Nosso cérebro tem de extrair sentido de ambientes muito complicados e ricos em estímulos, a cada segundo do dia.

Somos atraídos para certas coisas básicas. Por exemplo, o rosto humano causa uma forte atração. Estamos programados para perceber e prestar atenção nos rostos; logo no início das civilizações, nossa sobrevivência dependia da rápida compreensão e da definição das intenções de outra pessoa: amigo ou potencial inimigo? Então, mostrar rostos na publicidade e nas embalagens é uma forma comprovadamente eficaz de chamar atenção do cérebro e conduzi-lo ao envolvimento emocional.
Também sabemos muito sobre como o cérebro responde no ambiente de varejo. O cérebro é um excelente caçador de novidades – algo que foi fundamental para o desenvolvimento da humanidade – e as compras chamam à ativa algumas dessas capacidades básicas neurológicas.

Nosso subconsciente pode ser satisfeito de maneiras muito simples. Por exemplo, algo tão básico como ter o seu nome em um copo de café para viagem poderá representar o que chamamos de “pequenos momentos de luxo” para o subconsciente. É uma forma de reconhecimento pessoal, no qual o subconsciente encontra uma recompensa pequena, mas significativa.

A maneira como funciona o cérebro consumista é alterada pela classe social a qual a pessoa pertence?
A parte subconsciente do nosso cérebro, que é de longe a maior parte da mente, responde a estímulos de maneiras aparentemente infinitas. Um carro de luxo pode apelar para o subconsciente, pois seu design curvo é atraente – o cérebro gosta de curvas e não de pontas aparentes. Um produto alimentício pode apelar para o subconsciente porque o pacote mostra a origem do produto, informação que o cérebro gosta de conhecer. As mulheres respondem de forma particularmente forte para imagens que mostram pessoas interagindo – o subconsciente feminino pode ser alcançado apresentando cenas com várias pessoas envolvidas. Não há um “cérebro classe alta” ou um “cérebro classe trabalhadora”. Como já explicado, nosso cérebro funciona extraordinariamente de forma parecida em qualquer ser humano. A mente consciente, que é de longe a menor parte de nossas mentes, faz distinções gerais, escolhas e caracterizações. Mas cerca de 2% de nossas decisões diárias são tomadas por nossa mente consciente, o restante é governado pelo nosso subconsciente.

O livro cita que para vender para cérebros com mais de 60 anos, é eficaz acentuar aspectos positivos. Por quê?
É um assunto complicado de se discutir brevemente, mas a ideia principal é que o cérebro mais velho tem experiência suficiente para ser capaz de avaliar o que encontra, a partir da sabedoria acumulada. Então o antigo ditado “Não faça tempestade em um copo d’água” tende a se aplicar ao cérebro mais velho. Cérebros maduros tendem a não ficar tão impactados como os cérebros jovens com os altos e baixos diários da vida – ter um cérebro mais velho dá um tipo de perspectiva mais ampla para viver a vida. Nosso cérebro pesa muitos fatores quando consideramos situações, e cérebros mais velhos trazem mais experiências e, portanto, maior capacidade de analisar situações utilizando as experiências e memórias anteriores. Então, os aspectos negativos que podem potencialmente afetar um cérebro jovem não têm necessariamente o mesmo impacto sobre o cérebro maduro. O resultado poderá ser, de modo geral, perspectivas mais “positivas” no cérebro mais velho.

Entre os segredos contidos no livro para vender para mulheres, qual você considera mais eficiente?
Existem diferenças estruturais entre os cérebros feminino e masculino que afetam as funções cerebrais. Uma delas é que o cérebro feminino é fortemente atraído por cenas de pessoas interagindo. Nossos estudos têm mostrado isso em diferentes produtos, culturas e países. Os homens respondem a imagens com pessoas também, é claro, por exemplo: em cenas que mostram homens praticando esportes juntos. Mas o ponto é que as mulheres respondem de maneira particularmente forte a imagens de pessoas interagindo. O contato físico entre pessoas também poderá desencadear respostas subconscientes fortes no cérebro feminino, assim como cenas de crianças, que são altamente eficazes.

Há um capítulo do livro dedicado exclusivamente à venda para mamães. O que muda no cérebro consumista feminino com a maternidade?
A lista é longa demais para detalharmos, mas o fato é que a gravidez e a maternidade alteram o cérebro feminino de maneira fundamental e permanente. O resultado é que a “inteligência de mãe” é a mais evoluída do planeta. Novas redes neurais são criadas quando uma mulher engravida. Seu olfato fica mais aguçado. Ela ganha poderes de observação maiores do que tinha antes. A mesma coisa acontece com seus instintos e suas habilidades intuitivas. Ela é menos medrosa em relação a si mesma e mais protetora com o outro, seu filho. As mamães de hoje são extremamente bem relacionadas, por conta da internet. Elas são consumidoras muito críticas – o que significa que os vendedores têm basicamente uma chance para ganhar a sua decisão de compra. Se o produto ou serviço não funcionar como prometido, provavelmente não haverá uma segunda chance. E outras mães saberão disso rapidamente pelas redes sociais específicas para mamães que existem atualmente. Assim, o produto e a mensagem de marketing precisam ser vinculados e consistentes, a fim de atrair e manter o interesse delas.

Na questão do design dos produtos, quais são as preferências do cérebro consumista?
Há algumas coisas específicas sobre produtos e design de embalagens que nosso cérebro gosta e não gosta. No projeto de produto, por exemplo, sabemos que geralmente o cérebro gosta de curvas e, em alguns casos, de texturas na superfície. Então, incluir tais elementos ao design dá ao fabricante uma oportunidade maior para envolver o subconsciente do consumidor. No design de embalagens, defendemos a colocação de imagens no lado esquerdo do rótulo e as palavras à direita. Nós defendemos o uso de fontes originais e um número cuidadosamente limitado de fontes diferentes. Também a criação de desenhos de etiquetas com um esquema visual no sentido horário (quando o projeto requer). E defendemos o uso de rostos em embalagens alimentícias que mostram a origem do produto.

Entre os cinco sentidos, qual exerce maior influência no processo de consumo?
Todos os cinco sentidos exercem influência na maneira como o nosso cérebro percebe as marcas, os produtos, as embalagens e as configurações de lojas de varejo e de publicidade. O sentido visual tende a ser o mais dominante, porque somos criaturas visualmente orientadas, cujos cérebros foram desenvolvidos para depender da visão, principalmente para obter comida, encontrar abrigo, localizar um companheiro e assim por diante. Hoje utilizamos a visão para muitas outras coisas, basta olhar o tanto de telas que nos rodeiam.

Na sua opinião, qual é o futuro do consumismo, levando em conta as previsões do colapso no planeta caso ele não seja controlado?
Uma das informações que nós explicamos sobre o teste neurológico é que ele pode e deve beneficiar tanto consumidores quanto vendedores. Nós todos seremos beneficiados se os produtos e serviços que comprarmos estiverem mais sintonizados com nossas reais necessidades e desejos. Medir as respostas do cérebro no nível subconsciente dá às empresas os insights que lhes permitem fazer esses produtos e oferecer esses serviços. Considere a estatística amplamente reconhecida de que mais de 80% dos novos produtos fracassam no mercado. Imagine o colossal desperdício e a ineficiência que isso representa, e incluo o impacto ambiental nesse cálculo. Se pudermos melhorar esse histórico, poderemos diminuir tal impacto. Os testes neurológicos nos mostram com precisão os pontos fracos e fortes de um produto antes mesmo de ele ser lançado. Sabendo disso, as empresas poderão fazer produtos melhores e mais úteis, eliminando grande quantidade de desperdício de tempo, de energia, de dinheiro e de outros recursos. Sou uma pessoa otimista por natureza. Acredito que poderemos fazer do mundo um lugar melhor, e eu acredito que essa tecnologia que desenvolvemos, baseada no cérebro humano poderá e deverá desempenhar um papel determinante nesse processo.

Para saber mais

  • Livro: O cérebro consumista
  • Autor: Dr. A. K. Pradeep
  • Editora: Cultrix – www.editoracultrix.com.br

Acesse www.vendamais.com.br/plus e leia a entrevista completa com o Dr. Pradeep.

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