A difícil tarefa de demitir

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Demitir é um processo delicado, que exige equilíbrio e maturidade, tanto de quem demite quanto de quem é demitido. Em geral, essas duas virtudes nunca estão presentes quando mais se precisa delas, razão pela qual as demissões tendem a ser verdadeiros desastres capazes de destruir a autoestima das pessoas em vez de projetá-las para um futuro melhor.

Há pouco mais de 15 anos, eu vivi o período mais difícil da minha vida profissional quando, por determinação da matriz da empresa em que trabalhava, recebi a infeliz notícia de que a área comercial da minha unidade seria transferida para outro estado e, portanto, todos deveriam ser demitidos, exceto aqueles que concordassem em ser transferidos para outros locais, sem qualquer benefício adicional.

Em menos de três meses, fui obrigado a desmobilizar quase todos os membros da equipe que eu havia dado um duro danado para formar e consolidar. Éramos praticamente uma “família” que se desmantelou da noite para o dia. Nem a minha própria demissão, quatro anos depois, me custou tanto.

Demitir é um desafio – afinal, não conheço ninguém que tenha sido treinado para isso. Mas o fato é que, em cargos de liderança, não há como escapar dessa difícil tarefa, cuja responsabilidade não pode ser transferida.

Como líder da equipe, você é o único responsável pelos profissionais que a compõem, do início ao fim do ciclo. Contudo, não é um “bicho de sete cabeças” se você agir como um líder de fato, orientando, cobrando e respeitando as pessoas durante o tempo em que estiver com elas.

Dessa forma, compartilho aqui algumas lições que me foram extremamente úteis nesse sentido e espero que também sejam para você, quando precisar.

  1. Pare de enrolar: Se a decisão está tomada, não tem essa de ficar esperando mais tempo para ver se a pessoa melhora; se já houve um feedback realista e você concedeu uma, duas ou três oportunidades, no máximo, além de ter discutido internamente, esperar mais do que necessário para desligar alguém significa prorrogar o sofrimento de ambos os lados.

  1. Assuma a responsabilidade: Se você participou do processo de seleção, treinou o profissional, deu a ele oportunidades de melhoria e, mesmo assim, ele não conseguiu se desenvolver, nada de empurrar a missão para o RH. Como líder, você é o principal responsável pela demissão. Se necessário, solicite a participação de um profissional de RH, mas não transfira a responsabilidade – isso vai ajudá-lo a fortalecer o espírito de liderança.

  1. Ajuste os preparativos: Reúna os dados, alinhe com o RH, defina os detalhes e ajuste o que for necessário: comissões, horas extras pendentes, extensão de benefícios, carta de demissão, coleta de material de apoio – política comercial, tabela de preços, notebook, veículo etc. –, além do bloqueio de acesso aos sistemas. Mantenha sigilo até o dia da demissão.

  1. Tudo tem sua hora e seu local: Quando chegar o momento, que seja em local reservado e, preferencialmente, longe da equipe, para evitar aqueles constrangimentos desnecessários. Quanto ao horário, depende do gestor, embora eu recomende demitir no fim do expediente, longe dos olhares do grupo.

  1. Trate bem as pessoas: Por trás de todo profissional há um ser humano. Portanto, seja gentil e transparente; não tripudie, é um momento difícil para ambos – a menos que você seja desprovido de hormônios. Qualquer reação diferente disso pode acirrar os ânimos e terminar em acusações, insultos e ações trabalhistas.

  1. Pare de inventar: Não tente justificar o injustificável; se você não quer ou acha que não pode dizer o motivo, seja simples e direto: “Lamento, mas, a partir de hoje, você não faz mais parte do quadro de colaboradores da empresa. Agradeço pelo trabalho realizado até agora e lhe desejo boa sorte na sua próxima caminhada.”

  1. Prepare-se para o inesperado: Se ouvir algo que não lhe agrada, mantenha-se frio feito gelo e flexível feito bambu, administre suas emoções e esteja disposto a ouvir, mas não revide – afinal, se a decisão está tomada, provavelmente nada do que você disser e ouvir vai alterar o resultado.

  1. Evite desculpas e promessas: Não há pelo que se desculpar, nem o que prometer – afinal, se a pessoa errou, vai aprender com o erro e fazer diferente da próxima vez. Prometer alguma coisa só é possível quando você tem poder decisão ou quando a política da empresa permite. Por isso, não queira corrigir o problema com coisas que não pode cumprir.

  1. Muita calma nessa hora: Num momento difícil como esse, dois ouvidos são mais importantes do que uma boca. Mantenha a calma para que a dor e a raiva sejam diluídas com um pouco mais de tempo, pois, na medida em que a pessoa desabafa, tende a refletir e absorver melhor a situação. Utilize a inteligência emocional a seu favor e seja resiliente.

  1. Seja líder e coach ao mesmo tempo: Se houver clima, seja o mais líder que puder e forneça um último feedback para explicar onde foi que a pessoa errou e o que pode fazer para melhorar a própria capacidade profissional a partir dessa experiência negativa.

  1. Alinhe a equipe: Não deixe que a equipe conspire no corredor e seja o primeiro a comunicar o fato sem tripudiar sobre o demitido, e se o demitido era líder da equipe, aproveite para realinhar suas expectativas em relação ao que se espera dos membros remanescentes a partir do ocorrido.

  1. Promova a autorreflexão: Toda demissão é uma experiência que deve servir a um propósito maior: o seu próprio crescimento como gestor, líder e, acima de tudo, como ser humano. As respostas para estas duas perguntas vão ajudá-lo a melhorar as próximas escolhas:

    1. Onde foi que eu errei?

    2. O que posso fazer para errar menos da próxima vez?

Há pouco tempo, fui ministrar um treinamento para um grupo de líderes de uma grande empresa paranaense e, para minha surpresa, havia uma profissional demitida por mim naquela difícil missão de 15 anos atrás. Ao lembramos o episódio, ela simplesmente declarou: “Você foi tão gentil e elegante que eu fui para casa com uma sensação de alívio.”

Por fim, como eu sempre digo, você pode ser chefe, supervisor, gerente ou diretor, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel. Profissionais são, acima de tudo, seres humanos.


Jerônimo Mendes

Administrador, coach, empreendedor e palestrante. É autor dos livros A atitude muda tudo, Empreendedorismo para jovens e Manual do empreendedor.
Visite: www.jeronimomendes.com.br

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