Por Marcelo Caetano
Os líderes no Brasil têm uma tolerância absurda com desvios de conduta de suas equipes. As pessoas se comprometem a entregar algo no prazo, não fazem, e tudo bem. A reunião tem hora para começar, atrasa, e tudo bem. E o pior, fazemos isso na empresa, internamente, mas acreditamos que nossa equipe não fará o mesmo com os clientes. Ou fingimos que acreditamos.
Ora, isso é uma ilusão, pois o comportamento dentro da organização reflete diretamente na maneira como a equipe trabalhará com os clientes.
Se sua empresa é aberta à tolerância excessiva, torça para que seus clientes também sejam, pois você dependerá disso. Não existe uma membrana que delimite o que acontece dentro e fora da sua empresa, tudo está interligado.
Por que os vendedores não cumprem regras?
Mas o que faz um líder tolerar que a equipe não cumpra regras? Vamos analisar alguns pontos que fazem com que essa situação aconteça e se torne comum nas empresas. Ao final, farei alguns questionamentos sobre você.
1 – O próprio líder não cumpre regras
Esse é um problema sério. Por trás de uma equipe que não cumpre regras quase sempre tem um líder com o mesmo perfil. Aquele líder que combina uma reunião por semana com a equipe, mas nem sempre cumpre, ou que só faz a reunião quando ele está na empresa.
2 – Líder ruim de feedback
Outro perfil de líder é aquele que pede para a equipe apresente uma ação e não cobra se ela foi adotada ou não. Que pede para algo seja feito e se esquece de avaliar se foi bem feito ou, ao menos, realizado. Então, não cumprir o que foi solicitado passa a ser normal.
3 – Líder refém da equipe
Alguns líderes tornam-se reféns da equipe. Eles têm na ponta da língua o discurso de que se procurarem no mercado, vão achar pessoas iguais às da equipe – ou piores. Dessa forma, ficam com quem não cumpre regras e, muitas vezes, fingem que não veem. Isso rapidamente se torna uma epidemia, pois o desvio de comportamento passa a ser comum em um curto espaço de tempo.
Esse gestor investe seu tempo gerindo concessões para a equipe, pois os profissionais passam a testar seus limites a cada passo. Querem mais descontos, mais benefícios, maiores premiações, enfim, fazem de tudo para tirar proveito do líder vulnerável.
Vejo muitos líderes nessa situação quando o RH da empresa é deficitário e o líder é responsável pelo processo de contratação. Como ele é quem contrata e quem demite, acaba por adiar substituições necessárias – afinal, encontrar outro vendedor bom “dá muito trabalho”.
4 – Tudo pelo resultado
Para atingir o resultado, vale tudo, até estimular pessoas com mau comportamento dentro da equipe. Esse caso é muito sério e um comportamento muito comum até em líderes de alto desempenho. Eles toleram pessoas que não cumprem regras, mas atingem metas, e pensam que isso ficará circunscrito apenas àquele vendedor.
Isso é um engano, comportamentos são repetidos pelas equipe, principalmente se os que não cumprem regras forem valorizados pelos resultados obtidos. Eles são referência do grupo e isso é um grande perigo.
Veja este caso:
Tínhamos uma pessoa de alto desempenho em um cliente de consultoria que não cumpria regras, era antiético e aliciava a equipe para seguir o mesmo caminho. Daqueles que derrubam o gerente se preciso for.
Em alguns episódios, o gerente vinha para falar com nossa equipe de consultores claramente agoniado pelos constantes desvios do subordinado. Algumas vezes, sugeri para o diretor que o funcionário fosse demitido, pelo bem do grupo e do gerente. Não tolero falta de ética.
Já tinha desistido dessa situação quando ele fez algo realmente complicado: entrou no sistema e alterou dados importantes. Foi sumariamente demitido – pelo diretor, pelo gerente e até pelo presidente.
Cinco ou seis meses depois, em uma conversa com o diretor, depois de um problema no departamento no qual essa pessoa trabalhava, ele me disse: “Sabe que quando isso acontece, me arrependo de ter demitido o fulano”.
Esse é um dos melhores diretores com os quais já trabalhei e, mesmo assim, veja que ao primeiro obstáculo após a saída do funcionário sem ética, ele diz que tê-lo mantido seria uma boa alternativa.
Não acreditei no que estava ouvindo, mas fiquei quieto. O ambiente havia melhorado, os resultados não pioraram com sua saída, o grupo passou a ter um comportamento virtuoso, mas a lembrança era apenas do bom desempenho. Dessa forma, repito que esse modelo é o mais comum, no qual o líder tolera e, de forma indireta, incentiva esse comportamento.
Deixo para sua análise algumas perguntas:
- Você cumpre o que promete para sua equipe? Incluindo frequência nas reuniões e assiduidade nos horários?
- Quando você solicita que alguém da sua equipe cumpra uma tarefa ou atividade, você cobra a execução?
- Você usa a tecnologia para auxiliar nessa gestão ou confia na sua cabeça?
- Você tem sua tolerância claramente definida com sua equipe – por exemplo, eu dou três advertências para uma pessoa, se ela não se adequar, está fora?
- Você tolera pessoas com desvio de conduta na sua equipe porque atingem resultados?
- Você é responsável por contratar pessoas para sua equipe ou tem suporte de um RH interno ou uma boa empresa de recrutamento?
- De zero a dez, o quanto você considera sua equipe cumpridora de processos?
- Qual seria a nota ideal para o cumprimento de processos?
- Que passos precisa dar para atingir esse objetivo?
Um diretor pode até traçar grandes metas e olhar de longe, ele é responsável por dar o rumo da embarcação. Já gerenciar está diretamente ligado a ter disciplina de envolver, motivar e cobrar. Fazer parte do dia a dia cuidar de todos os processos.
Se você tolera indisciplinas e desvios de conduta, não vai gerenciar uma equipe ou uma empresa, você vai gerenciar exceções, e isso vai consumir seu tempo. Você não será estratégico, não conseguirá ter rotina e, provavelmente, com o tempo, também se tornará indisciplinado.
Gerenciar é olhar de perto!
Marcelo Caetano
Sócio-diretor da consultoria Soluções VendaMais e autor dos livros Vendedor fiel, cliente fiel e Chega de desconto!
E-mail: [email protected]
.
.