Processos fracos nascem de metas confusas. Uma das coisas que mais noto quando vou fazer mentoria é que a maior parte das pessoas que me procura dizendo que precisa de ajuda com processos, na verdade precisa clarificar e definir exatamente o que quer.
O problema geralmente não é de processo. O processo sub-ótimo vem primeiro de uma forma sub-ótima de pensar. O fazer sub-ótimo ou ineficiente é consequência da ineficiência do pensamento. Então, antes de mais nada, precisamos começar otimizando o pensamento, a atitude que define determinado processo.
Afinal, se uma meta é fraca, então o processo reflete essa fraqueza. Se a meta está confusa, o processo reflete essa confusão. Metas definidas de maneira medíocre levam a processos medíocres. E o pior é que este ciclo vicioso se retroalimenta: processos medíocres levam a resultados medíocres, que levam a novas metas medíocres.
Pausa aqui porque tem gente que não gosta que eu use a palavra medíocre. Eu acho, inclusive, que grande fruto da mediocridade é essa incapacidade de encarar a realidade e de chamar as coisas pelo que elas são.
Ser medíocre significa não ter qualidades ou habilidades suficientes para se destacar naquilo que se propõe a fazer, seja na vida pessoal ou profissional. É exatamente do que estamos falando, então não vou ficar chamando urubu de canário. Está abaixo da média e, principalmente, do seu potencial? Então vou chamar de medíocre, que é justamente o que a palavra significa.
Posto isso, podemos então nos dedicar com mais calma à questão de hoje: por que alguns processos são medíocres? Por que eles ficaram assim?
Ninguém é medíocre porque deseja. Ninguém acorda de manhã e diz ‘hoje vou ser bem medíocre!’ ou ‘hoje vou ser o melhor possível nos processos medíocres que me deram para realizar’ (embora, infelizmente, possa ser a realidade de muitos).
A questão é que as pessoas (e, por consequência, as empresas) têm suas prioridades todas confusas e misturadas.
Se você notar, verá que na verdade tudo na sua vida já está otimizado para você ter exatamente os resultados que você tem hoje. Pense nisso.
Vou repetir e reforçar: tudo na sua vida já está otimizado para você ter exatamente os resultados que você tem hoje. Não existe ineficiência dentro dos processos atuais. Existe ineficiência só quando você entende que algo poderia ser melhor ou quando quer um resultado diferente. Vou explicar melhor essa ideia apresentando alguns exemplos…
Se eu dou cinco metas para um vendedor, mas só remunero de verdade por uma delas, o vendedor claramente vai otimizar para maximizar isso.
Se eu tenho cinco produtos ou serviços como mix e só um deles representa 80% do faturamento, pode ter apostar que a equipe vai trabalhar para otimizar e maximizar isso.
Se eu digo que não tenho tempo para dar feedback individual à equipe, claramente estou otimizando meu tempo (de maneira errada) para me dedicar a outras coisas que posso (erroneamente!) considerar mais importantes.
Todo mundo quer o máximo de resultados com o mínimo de esforço. Ser eficiente não é exatamente isso?
Por isso é fundamental definir antes o que queremos. Se definimos de maneira errada isso, fica uma coisa desconectada da realidade.
É como a pessoa que diz que quer emagrecer e entrar em forma, mas não vai para a academia nem muda a alimentação. Tem uma desconexão forte entre o que está sendo dito e o que está sendo feito.
Qual a raiz disso? Essa é a verdadeira questão. Não adianta nada falar de processos, produtividade, eficiência e otimização, se a raiz da questão da mudança e do verdadeiro objetivo não estão claros.
Entenda este conceito porque ele é fundamental: VOCÊ JÁ OTIMIZOU SUA ROTINA. Ela está perfeitamente otimizada para conseguir os resultados que você tem agora. Ela está perfeitamente desotimizada para conseguir resultados melhores.
Aí que mora o ‘X’ da questão. Precisamos criar e revisar processos para otimizar em relação a quê? Isso vem PRIMEIRO – o que queremos?
É difícil fazer alguém otimizado para a mediocridade entender isso, até porque essa pessoa geralmente tem anos de rotinas sedimentadas e justificativas mentais para a manutenção da zona de conforto. É duro de falar assim, mas é necessário: em muitas situações, o que está acontecendo é que a pessoa otimizou para a mediocridade.
Num caso desses não dá para mexer só no processo. O processo é SUBORDINADO à meta. A pessoa está fazendo algo por algum motivo. Se você não mexer no motivo, não tem processo que se sustente. O processo sempre será boicotado – e perderá. A tendência a voltar ao normal conhecido, anterior, mesmo que sub-ótimo, é imensa.
Um vendedor que pode dar 10% de desconto vai dar 10%. É óbvio que isso vai ser otimizado ao extremo. Otimizado em relação a quê? Note que, como não ficou claro exatamente o objetivo, o vendedor otimiza no que é mais importante para ele: fechar vendas, agradar o cliente, ganhar sua comissão.
Ou seja, para o vendedor, aquilo já está otimizado. Mas aí chega o gerente e reclama que ele está dando o máximo de desconto, e o vendedor não entende nada. “Temos desconto para dar, o máximo é 10%, eu fecho mais vendas quando dou desconto… O que há de errado?”.
O que é que não está otimizado ou funcionando nesse cenário? Do ponto de vista do vendedor está tudo certo. Já para a empresa e para o gestor, olhando de cima, claramente não está funcionando bem. Mas note como não adianta criticar o vendedor – ele está certo ao agir dessa forma. Os incentivos são claros, ele está seguindo as regras, os benefícios e resultados são tangíveis.
Portanto, concluímos que, por falta de direcionamento claro, terminamos com uma otimização medíocre. Melhorando o que não deveria estar sendo feito. Isso não é otimizar, concorda?
Olhando no micro do vendedor está de certa forma tudo otimizado. Olhando no macro da liderança está tudo uma bagunça. Essa bagunça é que eu chamo de otimização da mediocridade.
Isso fica ainda mais claro quando vemos pessoas agarrando-se a processos e rotinas ‘improdutivas’.
Sabe aquele ditado que diz que uma das definições de loucura é fazer sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes? Para mim sempre foi também um dos sinais de burrice. Mas hoje, mais experiente, entendo que na verdade a pessoa se apega aqueles hábitos e rotinas improdutivas porque eles não são improdutivos nada. Pelo contrário: são excelentes para manter a situação atual. Ou seja, a pessoa otimizou a mediocridade e agora está confortável ali.
Por isso Peter Drucker falava que nada é mais ineficiente do que tentar melhorar algo que nem deveria estar sendo feito. Essa é uma definição perfeita de otimizar a mediocridade.
Por isso o vendedor dá desconto, não planeja a semana, não se organiza, não trabalha o mix, não prospecta novos clientes etc. Porque a meta que lhe deram, no fundo, não exige tudo isso de verdade.
Por isso os gestores não definem claramente estratégia comercial, modelo de vendas, não analisam indicadores, não dão feedback.
As coisas não são feitas porque não está claro por que deveriam estar sendo feitas ou a consequência de não fazê-las.
Tudo na vida é uma questão de busca de otimização e eficiência, ou melhor, da relação benefício/custo de fazer algo ou não.
Se você ou alguém da sua equipe está fazendo algo, é porque claramente existe uma relação benefício/custo positiva. Se você ou alguém da sua equipe não está fazendo algo que deveria estar sendo feito, é porque claramente existe uma percepção de benefício/custo negativa (se não, obviamente estaria sendo feito).
Então, primeiro temos que definir o que queremos, DEPOIS definimos os processos, e aí sim trabalhamos para otimizá-los.
Na prática, todo processo de melhoria começa no fundo com estas perguntas:
- O que quero, para onde queremos ir? Defina seu X. Qual é o alvo?
- O que não quero? (O que não queremos tem força imensa também!).
- Por que quero X? Qual é o grande por quê, o reason why?
- Qual o ganho ao fazermos? O que perdemos por não fazermos?
- Onde estamos agora?
- Quando queremos chegar lá?
- O que preciso/precisamos fazer para chegar em X no tempo definido?
- Posto tudo isso: queremos realmente fazer o que precisa ser feito para conseguir X?
Note como não dá para falar de otimizar nada, nem de criar processos, sem definir primeiro o que queremos, para onde vamos.
A imensa maioria das perguntas que recebo que parecem ser ligadas a questões operacionais, na verdade são SINTOMAS do verdadeiro problema, que é a falta de clareza na definição da meta, do que se quer, do verdadeiro objetivo.
A pessoa que diz que quer ser magra, mas não quer fazer o necessário para ser magra, não quer ser magra. Não adianta ficar se enganando ou inventando desculpas.
A pessoa que quer ter dinheiro, mas não quer fazer o que precisa ser feito para ter dinheiro, não quer ter dinheiro. Não adianta ficar se enganando.
A pessoa que diz que quer vender mais, mas não quer fazer o que precisa ser feito para vender mais, não quer vender mais. Ponto.
O que interessa é o que está sendo feito, não o que está sendo dito. O que está sendo feito é a verdade, é a realidade. O que está sendo dito pode ser ou não, e pode facilmente ser uma fantasia.
As ações demonstram claramente as prioridades das pessoas. E nossa vida está otimizada para essas prioridades. Se gostaríamos que fosse diferente… aí é a questão da coisa toda. Como dizia Montaigne, vida é a soma das nossas escolhas.
Nossa vida está já otimizada para nossas verdadeiras prioridades, não para as que gostaríamos de ter, que os outros gostariam que tivéssemos ou as que falamos que temos. Preste muito mais atenção no que as pessoas fazem do que no que dizem e muita coisa se revela.
Tudo na vida é colheita. É fruto de algo. Se você quer colher algo diferente, precisa plantar algo diferente.
Então, antes de falar de processos e otimização, passe um bom tempo definindo claramente estes oito pontos:
- O que quero, para onde queremos ir? Defina seu X. Qual é o alvo?
- O que não quero? (O que não queremos tem força imensa também!).
- Por que quero X? Qual é o grande por que, o reason why?
- Qual o ganho ao fazermos? O que perdemos por não fazermos?
- Onde estamos agora?
- Quando queremos chegar lá?
- O que preciso/precisamos fazer para chegar em X no tempo definido?
- Posto tudo isto: queremos realmente fazer o que precisa ser feito para conseguir X?
Essa sequência de perguntas é uma forma lógica de ajudar a dar claridade de maneira muito forte.
Lembre que não adianta otimizar para a mediocridade. Processos estão subordinados às nossas aspirações, ao que queremos.
Sucesso não é algo que acontece por acaso. Sucesso é a soma do que você faz todos os dias. Faça com que seu sucesso seja inevitável.
Otimize para a excelência e para a alta performance e é isso que terá.
Parafraseando Thomas Watson, CEO da IBM: a excelência começa quando você decide ser excelente e parar de fazer coisas não excelentes.
Pare de tentar melhorar o que nem deveria estar sendo feito.
Note como isso vem primeiro, processo é só uma forma de colocar isso em prática e transformar em realidade. Não adianta processo novo com pensamento velho.
Abraço, $uce$$o e boa$ venda$,
Raul Candeloro
Diretor
P.S. Esta é a penúltima edição impressa da VendaMais. Depois de longos anos de jornada, decidimos descontinuar a revista em papel. A próxima será uma edição especial, de despedida… mas já fica aqui meu agradecimento por você ter nos acompanhado na jornada.