Não, o título não está errado. Ele não se aplica a tão corriqueira ?inflamação das amídalas, angina tonsilar, esquinência?, como tão bem a define o clássico Novo Dicionário Aurélio. Não, o título não está errado. Ele não se aplica a tão corriqueira ?inflamação das amídalas, angina tonsilar, esquinência?, como tão bem a define o clássico Novo Dicionário Aurélio. O título refere-se a uma enfermidade muito mais grave. Porque, para ela não há produto farmacêutico que sirva, e a podemos chamar de ?Síndrome de Magda?!
Magda é aquela personagem interpretada pela excelente atriz Marisa Orth em um famoso programa de televisão transmitido nas noites de domingo. Falante, muito falante, Magda sempre ?tropeçava? nas palavras que apresentam semelhança na forma, mas diferença no sentido. Ela, porém, não está sozinha nisso… Aliás, São Tiago afirma que: ?Se alguém não tropeça na palavra, esse alguém é perfeito…?!
O grande e sério problema é que, às vezes, a palavra que dizemos significa exatamente o oposto do que queremos dizer. Assisti a uma palestra em que o orador afirmou o tempo todo que o ser humano é autômato, quando o que pretendia dizer é que o ser humano é autônomo! Há quem fale em ratificar um erro, quando sua intenção é dizer retificar…
Para combater a Magdalite ? aguda ou crônica ? temos de recorrer à Gramática Normativa. Como todos se lembram, a gramática se subdivide em três partes: fonética, morfologia e sintaxe. É na morfologia que se encontra o estudo do significado das palavras.
Ora, é nessa parte da morfologia que deparamos com os homônimos, antônimos, sinônimos e parônimos. (Para que comecemos a entender bem a coisa, é bom lembrar que o termo grego ?onoma? pode ser traduzido aqui por ?palavra?.)
Os primeiros, os homônimos, são os que apresentam igualdade. (?homos?, como se sabe, significa ?igual?. Daí, homos + onoma = palavra igual). Se essa igualdade se verificar na forma escrita, gráfica será um homógrafo; se ocorrer na forma falada, sonora teremos um homófono. (É claro que você sabe que graphos significa escrita ? do verbo graphein, escrever. Fonós, por sua vez, significa som). Agora os exemplos: pélo e pêlo são palavras homógrafas, de grafia igual, enquanto cela e sela são homófonas, de som igual. A seguir, vêm os antônimos, que traduzem oposição. Ocorre que o elemento de composição ant dá idéia de antagonismo. E aí vão alguns exemplos: rico e pobre; bom e mau; bonito e feio.
Os sinônimos, por sua vez, apresentam um tipo diferente de igualdade: não é aquela que se dá na forma, mas sim no sentido. (A rigor não seria igualdade, mas equivalência). O prefixo grego syn contém sentido de composição, arranjo, acordo. São sinônimas as palavras rico e abastado; bonita e formosa; meiga e terna.
Eis que surgem, por fim, os prediletos da Magda e das demais vítimas da Magdalite: os parônimos, que são vocábulos parecidos, tanto na forma escrita como na falada, porém com significados distintos! E é aí que ?mora o perigo?: a pessoa pensa estar falando uma coisa, e está dizendo algo totalmente diferente!
Há algum tempo, um empresário confidenciou-me que sua firma sofrera um prejuízo no exercício anterior, mas a empresa absolveu o prejuízo. Como advogado, vi a cena desenhar-se em minha mente: o tribunal composto, o Meritíssimo Juiz presidindo a sessão, o digno representante do Ministério Público apresentando seu libelo acusatório, o advogado defendendo ardorosamente o ?réu?, o Conselho de Sentença dando seu voto e ? por fim ? o ?acusado prejuízo? sendo absolvido, isto é, inocentado! É óbvio que não foi isso que ele quis contar-me, mas sim que a empresa tinha absorvido, ou seja assimilado o prejuízo.
E a moça que me disse que morava numa casa germinada, enchendo-me de preocupação?! Imaginem que perigo: uma casa cheia de vermes! Só fui me despreocupar quando ela assegurou que não era nada disso, não. Era apenas uma casa ligada a outra, como gêmeas, portanto geminadas!
Em uma dessas demonstrações gratuitas de cultura chamadas novela, uma personagem dizia à outra: ?Ele não vai aceitar uma situação dessas: ele tem brilho!? Confesso que ? não habituado a novelas ? fiquei a pensar se seria o brilho da tela, ou dos projetores, ou da iluminação do estúdio ou, quem sabe, da brilhantina. Não, não era. A atriz apenas quis ?corrigir? o texto que se referia a ?brio?: dignidade, valor moral…
Em uma reunião em que se discutia qual das equipes venceria uma determinada disputa, um dos participantes da discussão falou alto e bom som: ?Não vale angorá!? Como não se tratava de nada relacionado a gatos, achei estranha a referência a essa raça de felinos… Pois é, realmente nada tinha aquilo a ver com gatos. O moço quis prevenir que não valia ?augurar?, fazer presságio, mau agouro!
Um outro, pediu-me que o colocasse a par do que poderia ocorrer em caso de cisão da empresa ou de dissolução da sociedade. Ele estava muito preocupado porque, de uma hora para outra, seu sócio poderia resolver partir para uma dessas situações e, segredou-me ele: ?Eu não quero ser pego de enxofre!?
Numa belíssima cerimônia de condecoração, o orador descrevia a peça que iria ?pela primeira vez ? ser outorgada a personalidades prestantes. Falava da bela medalha dourada, de seu significado e de sua apresentação, destacando que numa das faces, trazia a ?esfinge? de um notável vulto da história da instituição! Procurei alguma relação entre a solenidade, o patrono e o Egito ? terra da Esfinge ? e não encontrei. Fui forçado a concluir, então, que não se tratava daquele ser mitológico com cabeça humana e corpo de animal, mas sim de ?efígie? , imagem estampada ou cunhada em peças de ornato…
Nem me lembro quem foi, mas alguém me falou de uma pessoa que era ?Kardexista? fanática. Na época atual, pouca gente sabe o que é Kardex. Mas, tendo curiosidade, pergunte a um velho contabilista ? de preferência a um daqueles que ainda se intitulam (a propósito: o verbo é intitular e não ?entitular?…) ?guarda-livros? ? e ele vai dizer que Kardex é o nome de um antigo sistema de contabilidade e que ? tanto quanto se sabe ? nada tem a ver com o codificador Allan Kardec, nem com a doutrina Kardecista.
Em mais de uma publicação ? em livros, jornais e revistas ? tenho visto uma palavra que, pelo ?jeitão? e pelo sentido, parece derivar do verbo impedir. E se, de fato, deriva de ?impedir?, é ?impecilho?, não é? Não! A palavra certa é ?empecilho? e sua origem é o verbo (que ninguém usa!) ?empecer? ? cujo sentido é estorvar, dificultar, impedir.
É assim, pegando ?pelo jeitão?, que pessoas falam ?sombrancelha? em lugar de ?sobrancelha?, ou, pior ainda, falam ?a somatória? ? por ?derivação? de soma! Quando a forma correta é ?o somatório?, no masculino!
Ainda hoje, pouquinho antes de redigir este texto, ouvi um homem culto dizer ? em uma reunião de pessoas igualmente cultas ? que certa e nobre instituição deveria ser a ?receptadora? de determinados produtos… Ora, receptação é crime grave! Não seria melhor, então, que tão digna entidade cuidasse apenas da ?recepção? daquilo a que ele se referia?
No dia-a-dia, não faltam expressões corriqueiras ao estilo de ?aviso breve?, ?cheque avisado?, ?assustar o protesto?, ?infração galopante?, ?mandato de prisão? e ?mandado de vereador?!
O mais grave em tudo isso é que a Magdalite é altamente contagiosa.Trate, pois, de vacinar-se com ?Dicionarol? ou ?Gramaticalis?. E, em relação à Magda, é bom verificar se não há qualquer relação de parentesco com ela em sua ?árvore ginecológica?!


