Valores e condição da natureza humana contam e farĂŁo cada vez mais diferença no mundo das planilhas. Ă hora e tempo de atentar a esse novo e fascinante universo. HĂĄ uma reação psicolĂłgica muito curiosa, em alguns consumidores, por meio da qual o menor preço de um produto indica ou denuncia uma qualidade inferior. Assim, inconscientemente, muitas vezes o produto mais barato Ă© rechaçado de plano, sem que tenha sequer a chance de ser avaliado por uma parcela do pĂșblico.
O movimento inverso acaba ocorrendo, muitas vezes, diante de um produto mais caro: o consumidor vĂȘ-se estimulado por sua curiosidade. Pode ser que nĂŁo venha a se tornar usuĂĄrio da marca, mas pelo menos uma vez sinta-se convidado a provĂĄ-la.
Ă freqĂŒente e recorrente o emprego de estratĂ©gias de marketing e comunicação, nos Estados Unidos, baseadas no conceito indulge yourself, uma feliz alusĂŁo ao universo de tudo aquilo que vocĂȘ merece ter ou alcançar, apesar do custo nominal elevado: pondera-se o custo, nĂŁo necessariamente pelo benefĂcio tangĂvel do produto, mas pelo valor que o consumidor atribui a si e a seus prĂłprios e meritĂłrios esforços para conquistĂĄ-lo.
E sob essa perspectiva, claro, o céu é o limite. Afinal, qual o limite do seu merecimento? à de nos remeter à måxima de que o melhor negócio do mundo seria comprar um homem pelo que ele vale e vender pelo que ele julga que vale.
NĂŁo Ă© exagero pensar que, consciente ou inconscientemente, o grande insight dessa estratĂ©gia tem raĂzes em um avançado conhecimento da natureza humana. Ressalvadas as barreiras econĂŽmicas de entrada, como classe social e poder aquisitivo ? e sempre raciocinando em tese ? nĂŁo hĂĄ orçamento que resista Ă imensa e sempre generosa elasticidade de valor atribuĂda a si por cada um de nĂłs.
Recentemente, a onda de indulgence marketing estĂĄ fortemente atrelada ao mercado de alta renda e de luxo nos Estados Unidos, sempre embalada por peças publicitĂĄrias sedutoras e muito bem acabadas: carros de luxo, spas, hotĂ©is, destinos turĂsticos exĂłticos, jĂłias e acessĂłrios sofisticados e, em outra vertente, aos pequenos deslizes permissĂveis da culinĂĄria, mais acessĂveis, mas nĂŁo menos inebriantes, desde raras infusĂ”es dos modernos chefs internacionais atĂ© gulodices mais prosaicas, como chocolates e afins.
A grande tacada mercadolĂłgica, se somada Ă correta oferta de crĂ©dito para viabilizar os desĂgnios do self indulgence, Ă© um case irresistĂvel de explosĂŁo de consumo.
O site Business Insights (www.globalbusinessinsights.com) este ano anuncia o ?Consumer Goods Reports? (Ă venda por nada mĂłdicos 1.910 dĂłlares), que oferece pistas e dicas muito interessantes em um estudo de fĂŽlego, que apresenta um mapeamento de como e cada vez mais os pequenos mimos passam a determinar importantes tendĂȘncias de comportamento de consumo e desvenda o coração da decisĂŁo de compra ?indulgente?.
Claro que é uma estratégia refinada e de aplicação dirigida e segmentada, cujos resultados devem ser melhor entendidos e medidos, mas o seu surgimento aponta para uma perspectiva criativa muito interessante na gestão de preços no mercado consumidor.
A boa notĂcia aqui Ă© que existem fatores ainda pouco explorados capazes de mover positivamente a elasticidade de preços e, por conseqĂŒĂȘncia, potencialmente ampliar as margens operacionais de maneira consistente. O desafio estĂĄ exatamente em saber quando e como lançar mĂŁo dessas novas variĂĄveis, atribuindo-lhes peso e valor condicionantes no processo de construção e manejo de preço.
Em poucas palavras: um Lexus, por exemplo, tem diversos atributos objetivos de valor que o credenciam ao preço praticado no mercado. Tradicionalmente, as estratégias de marketing terão cumprido o seu papel institucional ao apontar as vantagens competitivas como diferenciais a compor a sua proposta de (alto) valor.
O spice oferecido pela abordagem do indulgence Ă© exatamente o aspecto subjetivo dessa avaliação. E mais: trata-se da avaliação subjetiva do produto cotejada pela avaliação subjetiva dos mĂ©ritos pessoais que credenciam o consumidor Ă aquisição de tal proporção. A equação publicitĂĄria resultaria em: vocĂȘ trabalhou duro para chegar atĂ© aqui; vocĂȘ sabe o quanto vale o seu sacrifĂcio; ninguĂ©m pode tirar isso de vocĂȘ! Permita-se essa recompensa agora: vocĂȘ merece um Lexus! VocĂȘ conquistou esse privilĂ©gio!
Ă o marketing levado ao prĂłximo nĂvel: vocĂȘ jĂĄ conhece as benesses do produto, agora nĂłs vamos mostrar que vocĂȘ merece ter esse privilĂ©gio. Ă mais ou menos o mesmo que dizer que vocĂȘ pode resistir a um motor VHT com aceleração zero a cem em seis segundos, bancos de couro, air bags quĂĄdruplos, freios ABS, painel de cristal lĂquido e cĂąmbio progressivo de Ășltima geração, mas nĂŁo poderĂĄ resistir a se conceder um mimo pessoal depois de tantos anos de trabalho e sacrifĂcio. Afinal, vocĂȘ merece!
Tão simples quanto isso. No final do dia, nenhuma estratégia pode ser maior ou melhor do que a própria natureza humana. Melhor para quem souber e conseguir aliar seriamente microeconomia e marketing à psicologia.
HĂĄ poucos dias, recebi uma nota falando sobre a criação de uma nova empresa de comunicação se definindo como uma equipe multifacetada que vai combinar a força da pesquisa, psicologia, relaçÔes pĂșblicas e marketing integrado para gerar resultados aos clientes. A agĂȘncia vai incorporar ao seu trabalho metodologias de pesquisa mais amplas e baseadas na emoção.
Longe de ser uma digressĂŁo, isso Ă©, portanto, uma tendĂȘncia. IrrefutĂĄvel. O futuro do mundo da gestĂŁo e de marketing serĂĄ cada vez mais diverso, multidisciplinar e humano.
Valores e condição da natureza humana contam e farão cada vez mais a diferença no mundo das planilhas. à hora e tempo de atentar a esse novo e fascinante universo.