Se antes as empresas estavam preocupadas em diversificar seu portfólio de produtos, hoje percebemos que as marcas mais inovadoras estão criando portfólios de modelos de negócios. Entenda o que isso significa e saiba como descobrir onde está a competitividade do seu modelo de negócios. Isso vai lhe ajudar a conquistar resultados cada vez melhores
O case da Nespresso ilustra como o investimento em branding é a estratégia de competitividade mais sustentável a longo prazo. Muitos ficarão surpresos ao saber que o sistema Nespresso (máquina + cápsulas) foi criado em 1974. Embora já dominasse o segmento de café instantâneo, o café expresso desafiou a empresa de tantas formas que, em 1986, a Nestlé decidiu criar uma unidade do negócio dedicada ao café premium em doses individuais.
Assim, o modelo de negócios completamente disruptivo que conhecemos hoje foi desenvolvido explorando quatro grandes forças:
- Barreiras competitivas embutidas.
- Receita recorrente.
- Custo de troca.
- Valor de estima (construção de uma “lovemark” – ou marca amada, em português).
A seguir, veremos como o investimento em branding converteu-se na vantagem competitiva mais sustentável dessa companhia bilionária.
O que é branding?É o conjunto de ações relativas à administração de marcas. São tarefas voltadas para os processos de desenvolvimento, criação, lançamento, fortalecimento, reciclagem e expansão da marca. Essas tarefas visam criar e explicitar valores tangíveis e intangíveis, construir uma identidade sólida, gerar confiabilidade e, por fim, dar à marca uma boa imagem que reflita um caráter responsável e assegure um lugar privilegiado no mercado e na mente dos consumidores. Em poucas palavras, branding pode ser definido como “conjunto das tarefas de marketing – incluindo suas ferramentas de comunicação – destinadas a otimizar a gestão de marcas.” (Rafael Sampaio; 2002, p. 27) Fonte: Dicionário de Marketing, do Portal do Marketing – www.portaldomarketing.com.br |
Sendo uma empresa de base tecnológica, a Nestlé registrou mais de 1.700 patentes para proteger legalmente seu produto desde a década de 1970. No entanto, a vantagem competitiva oferecida pela proteção industrial esgota-se em cerca de 30 anos, e em 2012, boa parte das patentes expirou (e não foi renovada) e o mercado foi invadido por cápsulas genéricas.
Por conta disso, o consumidor que possuía a máquina não se viu mais obrigado a comprar continuamente as cápsulas da marca, o que enfraqueceu a segunda e a terceira vantagens competitivas – a receita recorrente e o custo de troca. Ou seja, de repente, o cliente passou a ter opções de experimentar outras cápsulas em sua máquina Nespresso – ícone do design contemporâneo – sem custos reais adicionais.
Para entender melhor esse conceito, pense no custo de troca de um iPhone por um Samsung Galaxy: os valores extrapolam o que você paga pelo novo aparelho. Por exemplo, ao trocar de celular, você tem “custos” indiretos como esforço e tempo para atualizar a agenda, baixar novos aplicativos, prejuízo com as músicas e apps que você tinha no iPhone e não pode transferir para o Samsung e assim por diante.
Quando a Nestlé lançou o produto, o público de interesse foram os restaurantes; em seguida, vieram os escritórios e, somente após a chegada de Yannick Lang (em 1986), executivo do mercado premium, a proposta de valor começou a ser direcionada para o segmento doméstico – a despeito de todas as pesquisas de mercado terem indicado que essa decisão era equivocada. A nova estratégia incluía posicionar a Nespresso como referência, articular parcerias justas com produtores de café e produtores e distribuidores de eletrodomésticos, tornar as cápsulas recicláveis e assegurar o rápido acesso dos consumidores a elas sem, contudo, oferecer o produto em supermercados comuns.
Foram criados, então, o Nespresso Club como canal de distribuição e relacionamento e as butiques como canal de vendas e mídia e George Clooney foi escolhido como embaixador da marca pelos próprios consumidores. O Nespresso Club baseou-se na percepção de que os consumidores desse segmento querem fazer parte de algo. Não apenas “usar”, mas “se apropriar” da marca (comportamento em desenvolvimento em outros segmentos). Ao desenhar toda a “experiência Nespresso” de forma coerente com os valores da marca (perfeição, prazer, simplicidade e estética), a empresa investiu na única vantagem competitiva de longo prazo.
Quais são as forças de seu modelo de negócios?
O que é brand equity?É o termo que se refere ao valor agregado a algum produto ou serviço devido à força da marca que ele representa. Fonte: Dicionário de Marketing, do Portal do Marketing – www.portaldomarketing.com.br |
A análise SWOT da Nespresso evidencia que os ativos intangíveis (elevado brand equity, posicionamento premium,endosso de celebridades e exploração de valores associados a um estilo de vida) são as reais forças remanescentes de seu modelo de negócios inovador. Além dessas quatro forças, há mais quatro que você pode avaliar para descobrir se seu negócio tem uma vantagem competitiva real. Falaremos sobre isso a seguir.
Alexander Osterwalder, autor do livro Inovação em modelos de negócios – Business Model Generation, conseguiu propor uma ferramenta para explicar o funcionamento de modelos de negócios que se tornou mundialmente utilizada: o Business Model Generation (BMG). A princípio, o BMG, também conhecido como Canvas, foi criado para agilizar o processo de pensar em modelos de negócios novos. Ele orienta cada pessoa a criar um novo modelo a cada dois minutos! O Canvas funciona como um catalisador de brainstormings.
A ferramenta é tão simples de se aprender e faz tanto sentido que empresas estabelecidas também se apropriaram dela para explicitar seus modelos. A partir de um post de Osterwalder em seu blog, criei uma ferramenta para ajudar empreendedores a visualizar a força (ou fraqueza) de seus modelos de negócio e também a perceber onde estão as oportunidades para criar vantagens competitivas mais duradouras. A ferramenta recebeu o nome de RADAR, e serve para provocar insights de inovação em sua área de atuação.
Apliquei uma versão beta em workshops na Samsung e na Abril Plug and Play. Foi um sucesso: fácil de usar e muito útil. Porém, na prática, percebi que, para um uso mais amplo, faltava uma categoria de análise: o poder dos vínculos emocionais com a marca. Então, recorri a outro mestre: Kevin Roberts, autor de Lovemarks – O futuro além das marcas, e sua teoria sobre as “marcas amadas”. O resultado você confere agora.
Radar: Onde está a competitividade do seu modelo de negócios?
Como usar – Se você tem um negócio estabelecido
- Preenchimento – Marque sua nota para cada categoria e preencha a área correspondente. Considere que 0 significa nenhuma força e 3 significa que há uma grande vantagem competitiva naquela categoria.
- Análise – Faça as seguintes perguntas:
- Onde nosso modelo de negócios é forte frente à concorrência?
- Onde podemos criar maior competitividade?
A seguir, você pode representar os modelos de negócios de empresas concorrentes e comparar os resultados. Fique atento aos gaps –áreas não preenchidas podem revelar oportunidades.
Como usar – Se você está propondo um novo modelo de negócios
- Preenchimento – Marque sua nota para cada categoria e preencha a área correspondente. Considere que 0 significa nenhuma força e 3 significa que há uma grande vantagem competitiva naquela categoria.
- Análise – Faça as seguintes perguntas:
- Quanto tempo levará para seu modelo de negócios ser copiado? (Pense nos serviços de táxi via aplicativo. O primeiro que surgiu era revolucionário. Depois, vários outros semelhantes apareceram e mostraram que quem deseja se manter nesse negócio precisa estar sempre inovando)
- O que podemos inovar em nosso modelo para ter uma vantagem competitiva mais duradoura?
**ATENÇÃO – Startups ***
A categoria Lovemarks não se aplica a vocês, visto que uma lovemark leva tempo para ser construída. Porém, pode ser parte da estratégia de negócios catalisar a criação desses vínculos emocionais desde o início (branding como estratégia de business).
Exemplo de preenchimento caso Nespresso (antes do vencimento das patentes):
ENTENDA AS CATEGORIAS
- Custo da troca – Além do custo direto com a troca do seu serviço ou produto pelo da concorrência, quais seriam os custos indiretos? Exemplo: Troca do iPhone pelo Galaxy implica em perder todas as compras feitas no iTunes. Os custos podem ser também medidos em esforço e tempo.
- Escalabilidade – O quanto é possível expandir seu negócio sem aumentar a estrutura de custos? Exemplo: Aplicativos no Facebook se beneficiam do crescimento da rede social sem necessidade de investimento adicional.
- Receita antes da despesa – Pense nas operadoras de telefonia móvel e seus planos pré-pagos.
- Receita recorrente – Que garantia você tem de que o cliente vai continuar comprando de você? Dois exemplos de estratégia: venda por assinatura e o modelo de cápsulas da Nespresso (até quando a patente expirou).
- Uso do trabalho dos outros – Empresas como Facebook, Waze e IKEA têm seus custos reduzidos porque usuários e fãs trabalham voluntariamente para elas. Nos últimos anos, as companhias aéreas e os bancos terceirizaram para o cliente boa parte dos serviços que antes eram prestados por funcionários.
- Barreiras competitivas embutidas – Modelos de negócios que criam ecossistemas produtivos são mais difíceis de serem copiados, como a rede de desenvolvedores da Apple. Patentes são um exemplo clássico de barreira competitiva interna.
- Estrutura de custos disruptiva – A Amazon está adotando o modelo de negócios da Netflix – pagamento por assinatura – como uma opção para seus clientes consumirem livros. A AirBnb entrou no mercado de hotelaria sem investir em hotéis: a empresa une hóspedes e hospedeiros ao redor do mundo e cobra uma taxa pela administração de toda a experiência.
- Lovemark – Consumidores com fortes vínculos emocionais pela marca tornam-se menos suscetíveis a abordagens dos competidores. Para eles, a troca por outra marca incorreria em perda de status ou identidade, o que se aplica a negócios B2C. Exemplos: Apple, Havaianas e Lego.
Sabatina: quem você pensa que é?
Agora que você já entendeu as ideias desses conceitos, coloque-as em prática fazendo um exercício para explorar questões referentes ao posicionamento de mercado de seu produto ou serviço.
Rodada oral
Primeiro, responda cada questão oralmente, de forma clara e sucinta… Se você puder! Quanto mais você demorar ou gaguejar durante as respostas, mais você precisará refletir sobre seu serviço/produto na rodada escrita.
Convide alguém para fazer as perguntas. Essa pessoa poderá lhe ajudar a perceber os pontos críticos. Sugiro usar um cronômetro de um minuto para limitar o tempo de resposta por questão.
Rodada escrita
Na segunda fase, escreva as respostas sem pressão alguma. Se sentir vontade de mudar uma questão já respondida à medida que avança, tudo bem. É normal que isso aconteça. Todas as perguntas foram feitas para ajudar você a refletir sobre seu serviço/produto.
É interessante que outras pessoas envolvidas respondam às questões também, sem sua influência. Assim, você terá vários pontos de vista que lhe ajudarão na compreensão dos seus desafios de posicionamento da marca. Começando em 3, 2, 1!
Clareza
O que seu serviço ou produto faz?
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Diga de outra forma.
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Dê exemplos.
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Explique usando uma analogia.
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Espelho
Peça a clientes ou potenciais clientes para responder as perguntas acima.
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Relevância
O que as pessoas ganham com seu produto/serviço?
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O que as pessoas perdem com seu produto/serviço?
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Frame de referência
Com que outros produtos/serviços o seu pode ser comparado?
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O que há em comum entre seu produto/serviço e os comparáveis?
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Frame de diferenciação
O que faz as pessoas preferirem seu produto ou serviço?
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Força competitiva
O que os outros produtos/serviços teriam de fazer para ter seu diferencial competitivo?
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Com que grau de dificuldade?
P – M – G
Grau de dificuldade
Considerando o domínio do problema, o que seu produto/serviço poderia fazer e não faz? Por quê?
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O que seu potencial cliente ganha com isso?
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O que seu potencial cliente perde com isso?
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Que tipos de clientes poderiam se interessar pelo seu produto/serviço e você não teria interesse em atender?
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Por quê?
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Oportunidades
Quais são as duas variáveis mais importantes para os clientes em potencial? Ex.: Preço, qualidade, acesso, variedade, customização, design, inovação, etc.
1 _______
2 _______
Cruze as duas variáveis e situe as marcas de seus competidores nos quatro quadrantes gerados. Onde estão as oportunidades? Onde seu produto/serviço está posicionado?
SÍNTESE
Você diria, de acordo com as respostas acima, que o posicionamento de mercado do seu produto/serviço tende a ser:
- Claro e diferenciado (é ou será referência para novos players).
- Claro, mas genérico (o serviço/produto não se destaca no cenário competitivo).
- Confuso e diluído (difícil situar o serviço/produto em uma única posição).
- Indefinido (impossível situar o serviço/produto em qualquer posição).
Pergunta
O que deve ser feito para que seu produto/serviço tenha um posicionamento de mercado mais claro e atrativo para os clientes em potencial?
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E aí, onde está a competitividade do seu modelo de negócios? E quais são as fraquezas? Entender tudo isso vai lhe ajudar a definir melhor para onde ir e como ir. E, assim, você vai vender cada vez mais – e melhor!
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Denise Eler realiza treinamentos focados no desenvolvimento do pensamento estratégico para a competitividade. É designer, mestre em Educação e especialista em Gestão Estratégica da Informação. É professora da PUC Minas e mantém o site www.sensemakers.com.br.contato@sensemakers.com.br
Atenção
Este material não pretende esgotar as possibilidade de uso da ferramenta RADAR. Se você tem um grupo de pessoas interessadas em conhecer ou aperfeiçoar suas competências em Business Model Generation e aprender mais sobre a ferramenta RADAR, agende uma turma in-company. www.sensemakers.com.br/#workshops