Liberdade, liberdade

Quer conversar com um especialista?
Entre em contato!

A recente discussão em torno dos movimentos de Open Source e Software Livre reabriu uma polêmica que parecia estar se encerrando com a compra do Napster pela empresa alemã Bertelsmann: a liberdade do usuário. A recente discussão em torno dos movimentos de Open Source e Software Livre reabriu uma polêmica que parecia estar se encerrando com a compra do Napster pela empresa alemã Bertelsmann: a liberdade do usuário. No caso dos softwares, a liberdade de alterar o código-fonte de um programa para adaptá-lo às necessidades de cada um; no caso do programa de download de MP3, a liberdade de ouvir qualquer música que se queira, independente da permissão de seus autores.

Parecem duas questões inteiramente diferentes, mas ambas tratam da mesma coisa: o direito pelo livre acesso à informação.

Informação tem dono?

Ao descentralizar o controle de transmissão de dados e permitir que todos os seus usuários possam veicular informações, a Internet se tornou um meio de comunicação proativo, ou contrário dos demais meios produtores de informação, que detém o poder de emissão sobre seus usuários, transformando-os em meros espectadores passivos.

Isso gerou o que hoje pode ser considerado um sistema relativamente anárquico. Para os desavisados de plantão não custa lembrar: por anarquia entenda-se não desordem ou caos, mas a idéia de poder sem centro fixo. A Internet não tem uma sede, e nela todos podem ter acesso a tudo.

Ou quase tudo. O dilema da propriedade intelectual na Internet é que, na Rede, tudo passa a ser encarado como informação – e portanto, deve circular livremente. Só que a coisa não funciona bem assim.

Do e-commerce ao e-scambo

Em um artigo de fevereiro deste ano para a revista digital WebWorld (IDGNow), Alex Menotti aponta de forma inteligente uma falha no raciocínio dos detratores do Napster, o famigerado programa de downloads de MP3 que tanta polêmica tem gerado: se cópia para uso próprio é crime, então até mesmo copiar LPs ou CDs em fitas cassete pode ser enquadrado no mesmo caso. Até onde se sabe, ninguém nunca foi preso apenas por gravar fitas em casa para “consumo próprio”, ou seja, execução em sua própria casa. E nem por emprestar essas fitas a terceiros para que eles, por sua vez, pudessem também tirar cópias para uso pessoal.

A dinâmica do Napster é praticamente a mesma. Mas a grande diferença entre uma inocente gravação no formato cassete e um download de um arquivo eletrônico no formato MP3 é a velocidade: como diz o filósofo francês Paul Virilio em seu livro Velocidade e Política, a velocidade é “(…) a surpresa absoluta, uma informação que não coincide com a realidade porque a realidade vai mais rápido que a informação.” A incrível velocidade da Internet eliminou as distâncias entre pessoas que desejam se comunicar, ou seja, trocar informação ? e os arquivos MP3 são apenas parte dessa informação.

A abrangência dessa distribuição ? ou seja, o âmbito mundial em que se dá essa troca incessante e insaciável de informação musical ? é função direta da velocidade que a Internet nos legou. Se no tempo da fita magnética a disseminação de uma determinada música ocorria de forma lenta, gradual e sem qualquer tipo de organização, agora o sistema de redes e servidores permite uma “centralização” e roteamento. Desde que você conheça a URL do site, ou seja, seu endereço na World Wide Web, é só se cadastrar, baixar o software (dependendo do programa, eles costumam variar entre 600 e 1600k) e pronto: você já pode procurar as músicas que quiser e fazer o download delas para seu computador. Milhares de pessoas podem estar baixando a mesma música simultaneamente.

A quem interessa?

Um dos maiores potenciais da Internet ? e ainda pouco explorado ? está justamente no comércio eletrônico, que a cada dia se adapta à realidade do mercado e encontra novas formas de atrair o usuário da Rede para que ele se torne também um consumidor. E, desde que as empresas dêem aos consumidores o que eles necessitam e desejam, já não está mais fazendo tanta diferença se a compra é efetuada dentro de uma loja ou através de um site.

No entanto, a troca de arquivos em formato MP3 não se insere no contexto do e-commerce, por um motivo muito simples: as músicas estão disponíveis gratuitamente no sistema criado pelo programa. Portanto, classificar os usuários de criminosos ou piratas não só não é correto como também não resolve o problema.

É claro que o que move essa discussão é o fator econômico, representado neste caso pelo cartel da indústria fonográfica, que está se unindo para defender seus interesses. No caso, os direitos autorais das músicas. Não é nada pessoal: afinal, essas empresas investiram muito dinheiro para chegar ao ponto em que chegaram. Sem falar dos músicos, que lutam para gravar seus álbuns e obter reconhecimento ? financeiro, inclusive. Juntos, artistas e gravadoras criam e divulgam produtos ? porque é exatamente isto o que eles são: produtos artísticos, mas produtos. Concebidos para ser vendidos.

Mas vendidos para quem?  

Quem paga pelos programas de TV?

Quando as emissoras de rádio e televisão foram criadas, seus donos jamais pensaram em cobrar do público receptor e ouvinte pelo direito de ouvir os programas. A solução encontrada era a que já se utilizava em revistas e jornais: os anúncios, ou reclames, como se dizia então. As emissoras vendiam “fatias” da programação, e cada uma dessas fatias (um noticiário, uma novela, um programa de auditório, por exemplo) era patrocinada por uma empresa de publicidade. Hoje, com exceção da TV a cabo ? onde o assinante paga justamente para ter uma programação diferenciada, e com pouca ou nenhuma espécie de propaganda ? nenhum cidadão que possua um radinho de pilha sequer precisa pagar pelo conteúdo ao qual tem acesso.

Existe realmente alguma diferença entre apertar o botão do controle remoto de um televisor e clicar com o mouse sobre o ícone de uma conexão dial-up? As duas ações são formas diferentes de acessar meios de comunicação. A única diferença concreta é a interatividade que o computador oferece ao seu usuário ? mas isso não é motivo suficiente para a cobrança irrestrita do conteúdo. Até porque há outra diferença entre a mídia eletrônica e a mídia digital, e que já pesa no bolso do usuário: você não precisa pagar provedores de acesso ou conexão dedicada em banda larga para ouvir rádio ou ver TV.

Uma possível saída para programas como o Napster seria considerá-lo como uma emissora no sentido clássico, e administrá-lo como tal. Isso implicaria na obtenção de patrocínio para o pagamento dos direitos autorais às empresas fonográficas. Os músicos continuariam ganhando a cada acesso de suas obras. E o consumidor poderia continuar a fazer o download de suas músicas preferidas. Sem que ninguém saísse prejudicado.

O que não se pode esquecer, no entanto, é que o e-commerce faz parte da Internet ? mas não é a Internet. Produtos podem ser vendidos; liberdade de informação não.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.

Conteúdos Relacionados