Negociando com estilo

Desde tempos imemoriais o ser humano vem tentando descobrir meios e métodos que lhe permitam entender seu comportamento e o de seus semelhantes. Desde tempos imemoriais o ser humano vem tentando descobrir meios e métodos que lhe permitam entender seu comportamento e o de seus semelhantes. Na Caldéia, na cultura asteca e na antiga China, verificamos sistemas astrológicos que pretendiam “prever” o comportamento das pessoas. Passam os séculos, mas a curiosidade continua. Chegamos ao século XXI e somos cada vez mais cobrados quanto a nossa rapidez e criatividade na solução de problemas, mas continuamos nos conhecendo muito pouco.

É claro que muitas teorias foram formuladas sobre o comportamento humano. Mas uma questão permanece: a resolução dos conflitos e impasses criados nas relações entre pessoas depende, em alto grau, do quão previsível será o comportamento da outra parte. Os economistas, por exemplo, desde a década de 30 do século passado tentam encontrar modelos matemáticos que permitam antecipar os movimentos dos consumidores. Von Newmann tornou-se mundialmente famoso por duas razões: sua contribuição ao projeto Mannhattan (desenvolvimento das duas bombas atômicas lançadas sobre Hiroxima e Nagasaki) e sua contribuição à teoria dos jogos, uma formulação matemática que pretendia ser capaz de prever antecipadamente o comportamento das pessoas em um mercado de consumo.

Se sairmos de um campo amplo como a economia e passarmos a analisar uma atividade eminentemente prática, verificaremos que, nas negociações, a possibilidade de antever como a outra parte reagirá a uma proposta pode ser considerado um diferencial que fará com que o processo se resolva mais rápida ou lentamente e com maior ou menor efetividade. Mesmo pretendendo defender a idéia que procurar identificar o estilo de negociação da outra parte permite abreviar a obtenção do acordo e permitir o menor desgaste entre os negociadores, é inegável que nem todos estão imbuídos de boas intenções ao tentar prever como a outra parte se comportará. O objetivo deste artigo é analisar quatro razões básicas que levam os negociadores competentes a tentar antever como a outra parte se comportará:

a) prever para neutralizar;
b) prever para apoiar;
c) prever para discutir;
d) prever para manipular.

Defendemos o uso dos estilos de negociação durante os processos de obtenção de acordos sobre temas conflituosos, mas não podemos prosseguir sem fazer duas ressalvas importantes:

1. A análise dos estilos de negociação baseia-se – qualquer que seja o modelo – nos estudos de personalidade. Esse é um campo complexo, no qual mesmo os mais experientes profissionais freqüentemente cometem erros de avaliação e julgamento.

2. Há pessoas que conseguem sublimar/dissimular seu verdadeiro estilo por bastante tempo, na esperança de conquistar simpatia, confiança ou aceitação (vários filmes famosos mostram crianças judias fingindo pertencer a juventude hitlerista para fugir dos horrores do nazismo).

3. Essas pessoas partem da premissa – nem sempre equivocada – que um determinado comportamento irá provocar na outra parte uma atitude mais positiva (ou menos restritiva) durante a negociação.

Resta, ainda, lembrar que várias são as classificações de estilo. A maior parte delas tem origem no modelo jungiano dos oponentes estilísticos. Independente da forma que se combine os 4 estilos primários propostos por C.G. Jung com seus oponentes, o que se procura – no que concerne a negociação – é buscar táticas e métodos eficazes de lidar com a outra parte. Na verdade, trata-se de tentar tornar previsível o comportamento do outro, através do uso de determinados estímulos. Embora possa se perceber um certo ranço behaviorista nesta tentativa, o simples esforço de entender o outro já leva a um nível diferenciado de empatia, uma vez que, para tentar prever ações e reações da outra parte, é preciso aprender a pensar como o outro pensa (nos treinamentos que conduzimos aqui no MVC utilizamos um modelo próprio de identificação de estilo baseado no LIFO – Life Orientations -, a partir da consultoria americana INTERGRO. De posse dessa ferramenta nossos treinandos podem se conhecer melhor – e também à outra parte – e, a partir daí, buscar aumentar seu grau de flexibilidade como negociadores).

Dando prosseguimento a nossa idéia original, lembremo-nos que há pelo menos 4 razões para que o negociador se preocupe em entender o estilo da outra parte.

a) Prever para neutralizar

Ao tentar prever o que a outra parte fará visando neutralizá-la, o negociador assume o comportamento ardiloso, bem a feição daquilo que Jung classificaria como um impulso para a desconsideração (ou impulso para rebaixar os outros) e para a deferência (impulso para deixar outros assumirem o comando). Segundo Sparks – estudioso do tema – o estilo ardiloso “parte da suposição que os negociadores devem ser evitados ou mantidos à distância, pois representam uma fonte de aborrecimentos”. O autor complementa essa idéia dizendo que a premissa básica deste estilo assume que “é inútil tentar negociar no nível pessoal; é melhor concentrar-se nos procedimentos e regras”. Em suma, o negociador com esse estilo procura antecipar o que o outro fará, para preparar formas de neutraliza-lo no “tapetão”, já que acredita que negociar não adianta (se você já foi “by passado” por um colega ou concorrente ardiloso, não terá grande dificuldade de compreender esse estilo).

b) Prever para apoiar

Já aqueles que tentam prever o comportamento da outra parte para apóia-lo, apresentam um estilo do tipo amigável, segundo o modelo jungiano. O amigável também possui acentuado impulso para a deferência, combinado com o impulso para a confiança (desejo de incluir os outros como parceiros no trabalho, por acreditar que a colaboração é a melhor forma de se realizar uma tarefa). O negociador amigável costuma ser simpático e cooperativo. Mesmo nas questões que envolvem competição, o amigável tenta preservar o relacionamento com a outra parte, evitando usar “táticas sujas”.

c) Prever para discutir

Os negociadores preocupados em prever o comportamento da outra parte para discuti-lo são, segundo Jung, classificáveis como confrontadores. Dotados de impulso para a confiança (já descrito anteriormente) tem, simultaneamente, forte orientação para o controle – necessidade de dominar e governar os outros; crença na justiça da rivalidade direta e desenfreada. O confrontador combina confiança e controle na suposição que a equidade deve, sempre, ser buscada. De forma dialética, contesta as proposições da outra parte, buscando chegar a uma síntese que se transforme num acordo aceitável para ambos. Acredita que, se houver uma opção aceitável para as partes, o objetivo do acordo terá sido atingido.

d) Prever para manipular

Já os negociadores que buscam prever o comportamento da outra parte para manipulá-la são classificáveis, segundo Jung, como restritivos. Seus dois principais drives são o controle e a desconsideração. Acreditam que os acordos nas negociações só são obtidos se uma das partes tiver o poder de impor suas condições à outra. É por isso que não são cooperativos e agem sempre em função, apenas, de seus próprios interesses. O único resultado que consideram aceitável em uma negociação é a incondicional derrota da outra parte.

Ao ler essas 4 descrições básicas, tendemos a nos identificar com uma delas e achar que “é assim que somos”. O sentimento seguinte é rejeitar o estilo que está no extremo oposto ao nosso. Contudo, é importante pensar que, dependendo da situação, todas as 4 tipologias tem sua importância e exigem conhecimento e preparo para lidar com elas. Você pode afirmar com convicção que sabe exatamente como se comportaria em cada situação potencialmente conflituosa que se estabelece com freqüência nas negociações?

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