Na próxima encarnação, eu quero ser redator do programa do Ratinho. Não deve existir profissão melhor neste mundo. Muitos colegas podem até estranhar esse desejo, mas o melhor programa que existe no horário nobre da TV é o do Ratinho. Nos moldes dos freak-shows americanos, o cara está na sua melhor forma. Na próxima encarnação, eu quero ser redator do programa do Ratinho. Não deve existir profissão melhor neste mundo. Muitos colegas podem até estranhar esse desejo, mas o melhor programa que existe no horário nobre da TV é o do Ratinho. Nos moldes dos freak-shows americanos, o cara está na sua melhor forma. É um tremendo humorista. Sua equipe de palco então é uma coisa de louco: vai de anões sadomasoquistas, passando por gordos imensos, super-heróis de parquinho, caricatos de circo velhos de guerra até os impagáveis bonecos que não perdoam nenhum erro de língua portuguesa falado no ar. Tento achar algo que valha a pena nos outros canais, mas sempre caio no SBT, uma atração difícil de explicar. Vou até o canal do “seu” Silvio, principalmente para ver as reconstituições dos testes de DNA. Com direito à vinheta de abertura nos moldes da Metro-Goldwin-Mayer e tudo, onde ao invés do velho leão, aparece o Marquito urrando (sim, o Marquito! Aquele mesmo do Programa Barros de Alencar…). O programete normalmente inicia com a apresentação dos atores que interpretarão o casal envolvido na pendenga. Caricaturizados ao extremo do máximo, surgem os mesmos artistas que no palco ajudam o casal a se esbofetear, atirar sapatos um nos outros, ao mesmo tempo em que apartam a briga.
O mais engraçado não é o casal em si, mas justamente o que aparece ao fundo das cenas: o homem-aranha se ferrando, caindo do prédio, sendo assaltado, apanhando, ao que o Ratinho pergunta: – Mas o que é que o homem aranha tá fazendo aí, cacete??? Na semana do Natal, ao fundo da cena, apareceu um inocente Papai-noel conversando com duas gostosonas de bíquini. De repente, surgiu do nada um assaltante. As duas então saíram correndo, enquanto o Papai-noel tentava negociar com o bandido. De súbito, o bom velhinho encarnou sua porção ninja e começou a espancar o meliante impiedosamente. Desceu o braço mesmo, enquanto no primeiro plano da cena o casal tranquilamente conversava, trocava olhares apaixonados e se beijava em interpretações que, se fossem vistas por Fellini, o matariam de rir. Talvez tenha sido por isso que ele morreu. Insólito. Bizarro. Inacreditável, diria Jack Palance. Corta.
Nova cena, agora vista de cima, mostra um eletricista pendurado num poste, consertando alguma coisa. Explosão. Fumaça. A escada despenca com eletricista e tudo, ao mesmo tempo em que o fio se rompe e adivinhe quem desce junto com ele? O Homem-Aranha!!! Despencando de quase 5 metros de altura! Este é o melhor roteiro que pode existir num VT, liberdade total, sem aquele monte de gente chata dando palpites sobre o que é politicamente correto e o que não é. Sem compromisso algum com resultados, além de divertir. Finda a superprodução, vem a esperada hora da abertura do envelope contendo o resultado do teste. Antes ainda rolam mais alguns sopapos, voam mais alguns sapatos e surgem impropérios capazes de corar torcida organizada.
No meio da pancadaria, um dos personagens segura um cartaz onde está escrito: “Uma camisinha custa R$ 1,00. Além de prevenir a AIDS, ela evitaria isso tudo”. Um tiro mais certeiro que do que os milhares de dólares gastos pelo Ministério da Saúde. Tudo ao som da bandinha, que segue tocando em ritmo frenético e é composta pelas piores figuras da história da música. É quando entra o Marquito, em mais uma dublagem com música acelerada e caracterizado ao extremo. Cenários despencam. Barulhos ensurdecedores de sirene se misturam com os gritos do auditório, que de pé entra em delírio. O caos total. E o Ratinho, entre um quadro e outro, desce a lenha, digo, o cacetete de borracha, em tudo aquilo que todo mundo acha incorreto, em política principalmente, mas poucos tem cara-de-pau de falar no ar. Quem não viu ainda, deveria deixar o preconceito intelectual de lado e se dar esse prazer, tomando este banho de povo ao menos uma vez na vida.
Que novela, que nada! Que documentário da Discovery, o quê! Seinfeld, o cacete! Chega de entrevistas chatas e enfadonhas com os mesmos formadores de opinião de sempre. A distância entre a opinião e a ação destes modelos-atores-apresentadores que disputam a telinha à tapa ainda é um grande abismo. Show mesmo é o Ratinho, onde as principais estrelas são os mais anônimos e esquecidos brasileiros. Gente simples, analfabeta e banguela, fazendo valer seus 15 minutos de fama simplesmente sendo quem são. Sem maquiagem ou pré-produção. Se alguém souber de alguma vaga no programa do Ratinho, por favor me comunique. Pode ser para escrever roteiros ou então atuar neles. Nariz grande, cara de turco e óculos fundo de garrafa eu já tenho. Quem sabe lá eles poderão ser úteis para alguma coisa.