OS DOIS CLIENTES

O guru Richard Whiteley mostra como ouvir as vozes do lucro. Todos os dias você se encontra com dois clientes. Nem sempre o interesse desses dois estão alinhados. Agradar um significa desagradar outro. E não há escapatória. Todas as vezes que você encontra um, lá está o outro, lembrando-lhe que o que você acertar com o primeiro cliente afetará o segundo. Muitas vezes afetará positivamente. Outras vezes, trará complicações que devem ser administradas

O primeiro cliente você já conhece, é aquele que você visita, que entra em sua loja, que compra o que você vende.

O outro é seu cliente interno. Seus colegas, chefes, diretores, subordinados. Enfim, todas as outras pessoas da sua empresa com as quais você lida normalmente. Você está sempre pedindo ou fornecendo algo a elas.

É isso que Richard Whiteley defende. Autor de A Empresa Totalmente Voltada para o Cliente e Bruxaria Corporativa. Recentemente participou do Fórum Mundial de Alta Performance, realizado pelo HSM Group em São Paulo, e mostrou como gerenciar esses dois grupos de pessoas.

Ouvindo vozes
Para Richard Whiteley, uma empresa só terá sucesso, só poderá focar nas necessidades presentes e futuras de seus clientes se conseguir ouvir três vozes diferentes ao mesmo tempo:

1. Ouça a voz do cliente
Essa parece ser a mais óbvia, e todas as empresas dizem que a ouvem. Ou pelo menos tentam. Perguntar coisas para o cliente é fácil. Fazer pesquisas é fácil. Mas utilizar essas informações em algo útil e aproveitável para a empresa, ah, isso é algo para poucos, infelizmente.

Uma delas é a Tigre, cuja matriz possui o “andar do cliente”, onde ficam todos os departamentos com atividades voltadas para o consumidor: atendimento, distribuição, marketing e vendas. A integração entre as áreas aparece inclusive na remuneração dos colaboradores. O alcance das metas de logística, por exemplo, baseadas em atendimento no prazo e de acordo com os pedidos, se refletem no bônus dos funcionários em todas as áreas. “Os colaboradores da empresa têm um único objetivo: dar um atendimento diferenciado ao consumidor final. Isso cria unidade e sinergia enormes entre os diversos departamentos, colabora para uma maior cooperação entre as áreas e gera um clima interno de mais confiança e menor competição”, explica o presidente da empresa Francisco Amaury Olsen. Essa integração permite que a Tigre ouça a voz do cliente, que pode lhe dizer:

    · Quais coisas importam
    · Como você está se saindo
    · O que está errado ou faltando

2. Ouça a voz dos seus processos
Processos, aqui, inclui tudo o que você faz e como faz. A maneira de a empresa funcionar, o fluxo lógico pelo quais produtos, serviços, informações, dados fluem. É talvez a parte mais esquecida dentro de uma empresa, mas sozinhos eles podem causar um rombo enorme: basta desenhar uma forma de conseguir informações ou de vender que necessite de dezenas de carimbos, autorizações, idas e vindas. Pronto, mais uma empresa foi por água abaixo.

Existem, lógico, aqueles que escutam muito bem seus processos, como a rede de lanchonetes Rei do Mate. Antonio Carlos Nasraui, diretor comercial e de Marketing, diz que na Rei do Mate vários treinamentos são desenvolvidos para melhorar os processos: ?Investimos em programas de qualidade de atendimento, preparo de produtos, buscando inovação e perfeição, motivacionais e de relacionamento interpessoal. Normalmente são programas desenvolvidos internamente ou especificamente para a rede?. Essa melhoria constante é fundamental quando o ticket médio fica na casa de R$3,50 a R$4,00, como no caso da Rei do Mate. Não há espaços para procedimentos demorados, dispendiosos ou que gerem prejuízo. E é isso mesmo que a voz dos processos lhe diz:

    · Como está funcionando o processo atual
    · Onde há desperdício no processo
    · Onde estão as barreiras ao cliente

3. OUÇA A VOZ DO SEU PESSOAL
?Acredito que sozinhos nós não fazemos nada. Por isso mesmo, não trabalhamos a relação empregado/patrão. Trabalhamos como uma família. Se eles têm problemas, eles se dirigem a mim. Se eu tenho problemas, eu me dirijo a eles. Tive muito apoio por parte dos meus funcionários quando pensei em desistir do empreendimento. Já tivemos casos interessantes de clientes para os quais demos grande estímulo. Por exemplo, uma cliente que tinha uma prótese mamária e precisava de uma peça sob medida. Nós fizemos! Isso foi muito importante para nós e para a funcionária que atendeu, nossa costureira-chefe. A consumidora ficou maravilhada, porque não conseguia encontrar uma peça íntima que lhe servisse.? O depoimento é de Ana Maria Quito, proprietária da marca de lingerie para mulheres especiais Ana Lisboa. É a prova que mesmo uma empresa pequena, de apenas três funcionários, pode ouvir bem a voz do pessoal, que diz:

    · Se os funcionários estão motivados para tratar bem os clientes.
    · Se eles têm poder e autonomia para agir.
    · Se são competentes e estão alinhados.

A arte de ser bonzinho?
Algumas empresas acham que, para ouvir uma resposta positiva dos funcionários (clientes internos) basta ser bonzinho e fazer tudo o que o pessoal quer. O que conseguem com isso é um passaporte direto para a falência, da mesma forma que agradar o cliente externo vendendo tudo por cinco centavos também é o fim de qualquer empresa.

Para Richard Whiteley, as práticas que promovem a satisfação do cliente interno não precisam, necessariamente, custar dinheiro. Os passos mais importantes são:

    · Colocar os interesses dos funcionários acima dos de outras pessoas e partes interessadas. Você recebe dois telefonemas na mesma hora. Um da oficina onde está seu carro, outro de um colega querendo ajuda com um problema profissional. Dar atenção ao colega é colocar os interesses dele ? e, em conseqüência, os da empresa ? acima do resto, criando um ambiente favorável à maior produtividade e atenção.

    · Trabalhar para desenvolver produtos que sejam mais atraentes ao público-alvo que o dos concorrentes. Poucas coisas fazem o pessoal de uma empresa ficar mais contente do que ter orgulho do que faz. Aquela satisfação de olhar, perceber as diferenças, saber que, fazem algo melhor.

    · Acreditar que, proporcionando aos clientes uma experiência invariavelmente superior, a empresa poderá crescer e ser lucrativa. Um objetivo que já está presente em sua companhia, seja por causa do cliente interno ou não. É preciso dar espaço para que todos se sintam parte do negócio, querendo contribuir para melhorar as vendas e o contato com o cliente.

Se funciona? Richard menciona o resultado de uma pesquisa feita pela McLagan International, que mostra que empresas com funcionários dedicados, entusiasmados e responsáveis geram, entre outras coisas, um aumento de 500% na receita. E, segundo o instituto de pesquisa The Ken Blanchard Companies, têm 50% a mais de chances de terem clientes mais reais que a média das empresas. Não é preciso se esforçar muito para entender esse número. Com quem você prefere comprar, de alguém de bem com a vida ou de uma pessoa que vive reclamando, que lhe recebe com uma cara de quem gostaria de estar em qualquer lugar, menos ali, vendendo?

E também um aumento de:

    · até 800% no lucro;
    · até 200% a mais de patentes de produtos, serviços e processos novos.

Em busca desses resultados, as empresas fazem de tudo. Na Tigre, por exemplo, todos os funcionários são estimulados a ver a empresa como um único organismo, interdependente entre as suas funções. Na matriz e nos centros operacionais, não existem salas, portas ou divisórias, nem sala exclusiva para o presidente. Isso facilita a comunicação e minimiza as barreiras hierárquicas. O custo disso? Só o de uma reforma, e olhe lá.

Ana Maria concorda: ?A gente passa mais tempo no trabalho do que em casa. Se eu não tenho os meus funcionários, como eu faço? Penso que é dando que se recebe. Não é um ditado da igreja. Você dá com a mão direita e recebe com a esquerda. E não adianta trabalhar irritado, indisposto com alguém que você não gosta.?

Criando seus embaixadores
Agora você tem uma empresa que ouve a voz dos clientes, dos processos e do pessoal. Isso não quer dizer nada, segundo Richard Whiteley, se tudo isso não for canalizado para um fim. O de criar verdadeiros embaixadores da marca, pessoas que defendem o local em que trabalham (ou a marca que compram) até debaixo d?água. É usar toda essa força de seus funcionários, integrando-os em sua capacidade de construir e fortalecer sua marca.

Segundo Whiteley, não importa o quanto você gasta na publicidade de sua marca. Tampouco têm muito valor o trabalho de assessoria de imprensa ou relações públicas. A qualidade do produto ou serviço também não influi em um primeiro impacto. E preço, você já sabe que ninguém compra apenas preço. O principal valor que determina como os clientes vêem a sua marca é a maneira como os funcionários interagem com eles, clientes. É essa primeira impressão, esse momento da verdade, que conta. Ou, como diz Francisco, da Tigre: ?Nossa capacidade de inovar e gerar valor para o consumidor vem do trabalho e da motivação de cada profissional”.

Nas palavras de Antonio, da Rei do Mate, ?todo cliente bem atendido quer voltar, compra sempre, indica a loja ou até a rede. Assim sendo, o funcionário bem preparado poderá fazer da loja um sucesso?. Mesmo sentimento, mesma força, mesma determinação de tornar funcionários os embaixadores da marca. Para que isso aconteça, Richard Whiteley identificou sete passos:

    1. É preciso que a diretoria da empresa entenda e comprometa-se a fazer o que realmente for preciso para a empresa centrar-se no cliente. Não podem haver barreiras ou impedimentos, locais intocáveis ou procedimentos sagrados. Você não pode passar uma imagem para seus funcionários que só o que importa é o cliente e continuar a imprimir seu material em cor-de-abóbora, azul e rosa-choque só porque são as cores preferidas do presidente.

    2. Disseminar a visão da nova direção da empresa. Isso é ir além do manual dizendo: ?Agora somos focados no cliente, vocês são embaixadores da marca?, é despertar, em cada pessoa, o desejo e possibilidade de fazer mais, de adotar aquela marca como se fosse um brasão pessoal, que deve ser levado a diante. Gaste o tempo que for necessário explicando, criando a cultura, estimulando idéias.

    3. Ajude cada pessoa na empresa a incorporar essa visão a seu trabalho. Não existe ?no que eu faço não dá para aplicar?. Dá sim. Se não der, se a pessoa insistir em continuar a fazer o que fazia sempre sem mudar a mentalidade ou sem focar no cliente, você fez algo errado. O faxineiro pode dar informações e fazer com que o ambiente fique mais agradável a todos. O ascensorista é responsável por, com um sorriso e um ?bom dia? afetuoso, mudar o humor de todos. E assim por diante.

    4. Fornecer treinamento necessário.

    5. Criar novos heróis e exemplos, reconhecendo os primeiros que adotaram a visão de embaixador da marca e fizeram algo por ela. Procure reconhecer nos diferentes departamentos e níveis hierárquicos, para que todos tenham em quem se espelhar.

    6. Usar sistemas de recursos humanos para reforçar os comportamentos desejados.

    7. Fornecer regularmente feedback dos clientes a todos os ?embaixadores?. É assim que eles se estimularão a fazer mais.

Quando as três vozes forem ouvidas, e você se comprometer integralmente, terá sua empresa voltada ao cliente e aos seus embaixadores. Em um mundo em que a tecnologia domina, cada vez mais faz diferença essa paixão, esse desejo de fazer melhor por seu semelhante. Entre os dois clientes, você não pode ter um contente, e outro insatisfeito. Faça a diferença para seus dois clientes.

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