Mais jovem e mais pobre, o consumidor brasileiro é um otimista a toda prova. Seu sentimento positivo diante do futuro supera o exibido pelos seus vizinhos latino-americanos. E, a despeito do Plano Real, segue avesso a planejamento econômico no trato do próprio bolso. Esse é o retrato de quem vai ao supermercado na Argentina, Chile, Colômbia, México e Brasil revelado pelo AC/Nielsen, instituto de pesquisa de mercado. Ele ouviu 76.999 consumidores entre 20 e 70 anos de idade, no último bimestre de 2000. Entre os investigados, o padrão aquisitivo que preponderou foi o médio – 51% no Brasil e 54% na América Latina. A renda mensal familiar dos brasileiros ficou em US$ 848 contra US$ 1007 na média dos demais quatro países latino-americanos. Porém, só 1% dos brasileiros não dispunha de um aparelho de televisão em casa, contra 29% dos consumidores dos demais países.
Esbanjando pose, o consumidor brasileiro exibiu com mais freqüência que seus vizinhos a posse de celulares (53% contra 40%) e automóveis (47% contra 43%) e o uso de cartão de crédito (57% contra 45%). Só ficou atrás no uso de computadores (27% das famílias brasileiras contra 29% no rol das argentinas, chilenas, colombianas e mexicanas). Com menos renda, as famílias brasileiras empenhavam 17% dela a cada mês em compras de maior gasto, contra 16% das famílias dos quatro países vizinhos. O que significa que, em termos absolutos, gastam bem menos dólares que seus vizinhos.
Pelo jeito, as brasileiras de classe média ainda não aprenderam a fazer compras como manda a boa economia doméstica. Ao apanhar o carrinho na porta dos supermercados, só 47% dos entrevistados portavam lista. Pior: só 8% se mantiveram fiéis ao rol – os demais cederam ao impulso e compraram mais. Bem ao contrário das famílias argentinas: 56% delas chegavam aos supermercados munidas de listas e 13% seguiram à risca o planejamento feito em casa. Ninguém mostrou-se tão fiel à lista quanto as mexicanas. Dos 41% que relacionavam o que iam comprar, 16% ficavam por aí. Possivelmente, uma lição aprendida com o consumidor vizinho, aquele grande irmão do norte.
Grana viva continua sendo o ideal para encarar gôndolas nas grandes compras do mês no Brasil, a despeito das famílias possuírem cartões de crédito com maior freqüência. A proporção é uso de pagamento em espécie por 75% das famílias brasileiras contra 59% na média dos outros quatro países latino-americanos.
Sem planejamento prévio e com o dinheiro no bolso, o consumidor brasileiro revelou-se na atitude, o menos preocupado com o preço. Nisso, só perdeu para os chilenos. Se no Brasil, 31% deles faziam a pesquisa em vários supermercados e só adquiriam produtos onde eles eram vendidos mais baratos, no Chile esse hábito exemplar da economia só encontrou adeptos entre 12% dos entrevistados. De novo, os mexicanos lideram em termos de parcimônia: 48% deles fazem mesmo questão de pagar menos.
Uma das razões pelas quais o consumidor brasileiro é a noiva das indústrias alimentícia e de bebidas na região, fica clara na imprevidência atestada pelos entrevistados nas gôndolas de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Porto Alegre, onde a pesquisa foi feita: para 83% deles, uma simples degustação satisfatória é suficiente para comprar um produto.
De fato, o brasileiro adora novidades. Nos supermercados brasileiros, detecta a pesquisa, é mais fácil vender naturais sem conservantes, congelados, versões “light” ou de baixa caloria e ainda, ofertas combinadas de dois ou mais itens. Dos entrevistados brasileiros, 76% não rejeitavam produtos novos e 36% disseram adorar ser o primeiro a comprá-los. Contra 66% na média dos outros países pesquisados e 28%, respectivamente.
O intrigante dessa história que nos despe enquanto consumidores impulsivos e imaturos está na imagem que fazemos de nós mesmos entre os apelos que saltam de prateleiras e balcões. Diante deles, escolhemos um supermercado porque o julgamos com preços mais baixos e melhores ofertas que seus concorrentes. Tal e qual afirmam fazer os demais consumidores latino-americanos.
Por aqui, inclusive, tais critérios são ainda mais decisivos, de acordo com os índices apurados. O que a rigor, faz todo o sentido, já que no Brasil a AC Nielsen encontrou menor renda mensal familiar do que na média de Argentina, Chile, Colômbia e México. Vale a pergunta: por que o critério? Afinal, ele simplesmente não bate com o comportamento de quem não usa planejar compras. E se o faz, quase sempre não respeita o planejado e tem um fraco declarado por comprar por impulso e pagar abrindo a carteira no ato.
Tem mais: ninguém é tão otimista em relação ao próprio futuro do que as famílias brasileiras. Apurou a pesquisa que 72% delas confiam que sua própria situação econômica vai melhorar no futuro. São mais confiantes do que os previdentes e ricos mexicanos (56%), do que os cronicamente aflitos colombianos (61%) e do que os chilenos (51%). Por razões óbvias, os argentinos são os que menos apostam que vão tirar o pé da lama (30%).
Quanto a confiar no Brasil, a história é ligeiramente outra mais comedida, ainda que parecida. Somos batidos pelos mexicanos (44%). Nosso índice foi de 41%, seguidos de perto pelos chilenos com 40% e de mais longe pelos colombianos 35%. Argentinos (20%) excluídos, este é o retrato de um largo quinhão da América Latina que acredita no seu porvir.
Para 83% dos brasileiros, uma simples degustação satisfatória é suficiente para comprar um produto.
Maria Helena Passos – Gazeta Mercantil. Para contatá-la: mhpassos@gazetamercantil.com.br