Quatro Perguntas e Vagas Respostas

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O que é o Design, qual seu papel e o que é exatamente nosso trabalho? Numa sociedade onde o conhecimento, o know-how e as idéias produzidas pela comunidade científica são os principais motores do impulso criativo, onde fica o design? Gostaria de iniciar esta reflexão com uma citação do poeta e guarda-livros português e universal, Fernando Pessoa: “O universo não é idéia minha. Idéia minha é a idéia que eu faço do Universo”.  Este texto é, portanto, entre tantas outros já lidos e por ler, o universo de minhas idéias. Que cada um de vocês possa utilizá-las para criar seus próprios universos, como recomenda o Pessoa. Meu objetivo aqui não é responder perguntas, mas ao contrário, formular perguntas. As respostas estão com vocês, ou com ninguém, ou no ar, como as ondas magnéticas. 

 

I – A AVENTURA HUMANA 
A verdadeira inteligência do ser humano consiste em tornar sua sociedade inteligente. A inteligência se exprime nas mensagens e linguagens que, estabelecendo uma gramática comum, criam ferramentas de utilização coletiva, nas instituições e na nossa existência como indivíduos. A inteligência humana se alimenta da conexão com o outro, o longínquo, o passado e o futuro. Nada do que é humano nos é estranho. Nós dirigimos os mesmos carros, pegamos os mesmos aviões, desembarcamos nos mesmos hotéis, temos as mesmas casas, as mesmas televisões, os mesmos telefones, os mesmos computadores, os mesmos cartões de crédito. Nós nos informamos na câmara de eco das mídias planetárias. Navegamos na internet. Temos nossos sites e pela Web, damos a conhecer, em escala planetária, o que temos a oferecer. Nós escutamos música de todos os cantos do mundo. Nós vamos a museus cujas coleções cruzam as culturas. As grandes exposições de arte cruzam o planeta como se fossem um novo satélite da Terra. Nós estamos todos mobilizados pelos mesmos desejos: todas as coisas. Nós comemos à mesa universal: culinária chinesa e culinária indiana, pato laqueado e feijoada. Queremos provar todos os temperos, compreender todos os sabores. Somos artistas, escritores, músicos, professores, designers, jogadores de futebol, alpinistas, navegadores, consultores, comerciantes. Somos a primeira geração de pessoas que pode fazer do mundo o seu campo de ação. Nós somos móveis. Passamos de uma cidade a outra, de um bairro a outro da megalópole mundial. Vivemos em cidades e metrópoles, que se relacionam umas com as outras e que são hoje verdadeiras unidades de vida Nós somos budistas jamaicanos, programadores indianos, ecologistas chineses, pianistas japoneses, geneticistas brasileiros. Vamos onde podemos nos tornar melhores e mais úteis. Nossa identidade é cada vez mais complexa. Trabalho, raça, nação ou qualquer outra identidade são conceitos cada vez mais fluidos. Somos instáveis em nossa vida familiar, profissional. Não somos infiéis. Somos móveis. Nada é fácil. Não temos certezas. Somos os primeiros a viver uma realidade em constante mudança. Neste ponto da Aventura Humana, o que é o Design, qual seu papel e o que é exatamente nosso trabalho? 

 

II ? O SÉCULO XXI 
Em breve ? de cinco a dez anos- mais de 50% dos seres humanos terão acesso ao ciberespaço. As atividades de pesquisa, de aprendizagem e de lazer serão basicamente virtuais.  A Internet poderá representar um novo formato de agrupamento social, que sucede as cavernas, os acampamentos nômades, os grotões de beira-mar ou beira-rio, as cidades-fortaleza e as megalópoles difusas. Encontraremos nela tudo que encontramos numa cidade. A principal originalidade do espaço virtual, é que ele é único e planetário, ainda que conte com cinturões protegidos (redes fechadas), e com bairros reservados (intranets e extranets).O ciberespaço, assim como as cidades, será, ao mesmo tempo, mercado, centro de trocas de informação e desenvolvimento da cultura, da inteligência individual e coletiva, espaço de sociabilidade. As redes se assemelham a estradas e ruas, os browsers são meios de transporte e os sites são lojas, escritórios, casas, escolas e os grupos de discussão e as comunidades virtuais são praças, cafés e botequins. Oferecendo a Internet ao mundo, a comunidade acadêmico-científica nos ofertou a infra-estrutura técnica de uma inteligência coletiva que é, sem dúvida, sua mais bela descoberta. Vivemos num mundo em que a fronteira entre ciência, cultura e existência se confunde. Numa sociedade onde o conhecimento, o know-how e as idéias produzidas pela comunidade científica são os principais motores do impulso criativo, onde fica o design? Habitualmente vinculado ao projeto que determina e cria o produto, no design egresso da Revolução Industrial, onde fica o design pós sociedade da Informação e Serviços, onde o consumidor, e não mais o produto, é o centro da organização econômica? De que maneira podemos imaginar um Design de Consumidor, e não mais um Design de Produto? Como será o exercício de nossa profissão olhando não mais as características de um determinado produto e trabalhando sobre ele, mas sim olhando o consumidor, seus hábitos, seus desejos, e trabalhando sobre esta realidade? O que será exatamente o Design?  Ciência, estética, marketing, processo de criação ou comercialização?

 

III ? IDÉIAS E RIQUEZA 
O processo de criação das idéias e sua transformação em aparato social de massa compreende três momentos dinâmicos: A invenção, a tradução econômica/ideológica da invenção e finalmente seu processo de absorção pela sociedade. Idéias levam às invenções. Entre elas, a escrita, a imprensa, os sistemas de registro e de classificação de informações, os modos de representação visual ( a perspectiva, a fotografia, os gráficos, as tipologias) ; as bibliotecas e enciclopédias e até a Internet, passando por todas as formas de registro sonoro e visual. Mesmo as formas mais abstratas de criação , aparentemente distantes da economia, podem ser transformadas em riqueza: um poema transformado em canção, um conceito de molécula, transformado em medicamento, a filosofia em comportamentos sociais . Os usos dos recursos naturais são inicialmente, idéias. A força dos ventos só foi transformada em processo humano pela criação da vela e do moinho de vento. O aparato social de massa, que gera riqueza e poder, advém do espírito, da pesquisa, do conhecimento. Logo em seguida vem o processo de massificação da invenção, sua transformação em aparato econômico/ideológico, com a construção de mecanismos de reprodução. No final da linha, a absorção e o uso das idéias, agora invenções, agora produtos, agora conceitos de consumo. Qual o papel do Design ? Formular idéias ? Gerar invenções? Criar objetos e conceitos de uso múltiplo? Coadjuvar o marketing no processo de consumo? Quem é o Design? 

 

IV ? O VALOR DO OLHAR 
A atenção do público será questão prioritária para as atividades culturais, políticas e comerciais, num futuro breve. As indústrias culturais, o espetáculo e a mídia concebem, fabricam e vendem" conteúdos de consciência". As duas grandes operações das indústrias de produtos e da comunicação no futuro serão: 1 – A criação de estados mentais pela produção e distribuição de experiências sensoriais, virtuais ou reais ; 2- A luta pela posse e uso do olhar e da atenção do público. As marcas, as reputações das empresas e suas imagens ? cada vez mais importantes na economia contemporânea – visam a definir sua identidade em primeiro lugar e, depois, visam a conquistar espaços cada vez maiores e mais bem situados na atenção e na consciência do público. Exceto por algumas necessidades vitais elementares, que são hoje oferecidas numa base puramente local, a maior parte das empresas depende de maneira crescente de sua posição na consciência coletiva. Num futuro próximo, esta será a questão estratégica mais importante para os produtores de bens e serviços de qualquer espécie. Quanto menor fica o mundo, mais as comunicações se aceleram e se adensam e mais aumenta a importância das convergências semânticas e das comunidades de consciência. Do ponto de vista de um empreendimento cultural, ideológico, espiritual ou comercial, será necessário e vital que sua marca seja a primeira que nos venha à cabeça quando pensemos num certo tipo de idéia-força, bem ou produto. A planetarização ? isto é, a coexistência num mesmo espaço, de idéias e produtos oriundos de todas as partes do mundo – transferiu progressivamente a concorrência para o terreno da consciência.Um fornecedor do mesmo país ou da mesma região que você não terá mais nenhuma vantagem particular em relação aos concorrentes mais distantes. Você dará preferência àquele que estiver mais próximo, mais visível, mais desejável na sua paisagem mental, na rede de representações, de imagens, de emoções ? no grande hipertexto subjetivo- que é o seu espírito. Como um imenso hipertexto, sua capacidade pessoal de absorver conceitos e mensagens subjetivas e peculiares será o campo de prova e de batalha entre idéias e produtos. Seu olhar e sua atenção serão sua mais valiosa ferramenta de troca. Talvez mesmo até mais importante que seu trabalho e sua educação. A indexação através de mecanismos de busca e dos hiperlinks criarão comunidades virtuais que gravitarão em torno dos seus temas. As empresas do futuro lutarão para ocupar zonas do espírito coletivo para sobreviver e crescer, numa economia em rede. Falo de redes semânticas, dum espaço onde todos os locais estão somente a um clique uns dos outros e no qual as pessoas se conectam, aqui ou ali, com a mesma facilidade. O principal desafio é seduzir, atrair, canalizar, estabilizar a atenção. Trocaremos bens, relações, informações, orientações.  As pessoas irão onde se encontra aquilo que procuram. Será preciso servir-lhes a ponto de fazer com que queiram voltar: Um número, uma imagem, uma idéia, um serviço, um objeto. Um link, um clique. Nosso olhar será um instrumento de poder e nossa atenção poderá dirigir e orientar as opções da sociedade em rede. Nossa atenção coletiva e individual será a matéria prima de um novo design, que orientará o conjunto da produção. Para movimentar esta economia, não será mais necessário o ato de compra. Basta dirigir nossa atenção para esta ou aquela zona do espírito coletivo. A interface entre o mercado e a produção – e nela o design ? é instada a se tornar mais precisa, tanto quanto possível, até o ponto em que os próprios consumidores decidam o que querem ver produzido. Os segmentos de mercado deixarão de ser segmentos para ser o mercado em si. Durante séculos o mundo foi regido por uma economia de subsistência. Hoje, estamos no limiar da economia da informação e do conhecimento. Num futuro breve veremos a economia se deslocar em direção às idéias – e ainda além- em direção à atenção e ao olhar como valor de troca. Onde estará o Design então? Quem serão vocês ? Uma boa pergunta é sempre a melhor forma de obter boas respostas. Hoje e no futuro. Especialmente com um público atento e instigante como vocês, onde certamente se escondem múltiplas e fascinantes respostas.

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