Auto-ajuda ou alta ansiedade?

Como vencer o medo e enfrentar as escolhas da vida com sucesso. Responda rápido: você não se cansou ainda de ver nas prateleiras livros pretensiosos que ditam regras de como ser feliz, como vender de tudo, como alcançar a paz de espírito, como chegar ao nirvana e coisas afins?

Travestidos de textos de descoberta e auto-ajuda (não consigo me esquecer da piada do cara que entrou na livraria e pediu ajuda para achar os livros daquela seção?), o que se vê são variações sobre temas similares, releituras de visões e experiências que vem sendo contadas há milênios desde os textos sagrados (estes sim, originais?). A coisa segue em níveis cada vez mais profundos de pretensão, com títulos que prometem fórmulas e receitas em uma pequena quantidade de passos fáceis.

Efeitos colaterais ? Vamos refletir sobre um exemplo prático de temas que inundam as prateleiras das livrarias: vendas e sucesso pessoal. O primeiro efeito colateral que enxergo é uma quase que total obrigação (por parte de quem lê) de que os conselhos dos textos sejam seguidos à regra.

Explico: imagine um vendedor bem-sucedido, mas como todo o ser humano, também sujeito aos seus tombos. Quando lê um desses livros, geralmente distribuídos em uma convenção de vendas em que a diretoria já mostrou os objetivos daquele trimestre, semestre ou mesmo ano e sinaliza quase que diretamente que o livro pode ser o verdadeiro manual, o incauto se vê em uma situação complicada.

Conflitos internos ? Todos os seus pares lerão o livro. Os concorrentes também. Nada contra, até aí, leitura é sempre saudável. O problema é que nesse momento, imediatamente um botão interno é acionado e o sujeito se vê em uma sinuca. Se não praticar o que está dito ali pode não conseguir ser bem-sucedido. Nunca mais. Se praticar e não alcançar as promessas que estão no texto, ele se sentirá eternamente diminuído em relação aos outros e a si mesmo. Inicia-se então uma espiral descendente de angústia e ansiedade.

Imagine que essa situação se repete indefinidamente em momentos distintos da vida do ser humano, além dos que menciono aqui: obesidade, conflitos de relacionamento, sorte no amor, como ficar rico sem fazer força.

Resultados imediatos ? O que temos como inevitável conclusão (apontada principalmente pelas grandes tiragens e vendas desses livros) é que existem hoje algumas gerações de pessoas e empresas absolutamente ansiosas por resultados imediatos, de curto prazo e que funcionem como receitas ou mapas de entendimento fácil e aplicação rápida.

O medo corporativo ? O que sobra então para o indivíduo e sua capacidade de realização? Peter Drucker já disse que se um historiador do futuro olhasse para o final do século XX e todo os seus progressos, não diria que os grandes feitos foram a Internet ou o comércio eletrônico, mas sim a grande mudança na condição humana: a possibilidade de escolher.

Não me parece que, sob esse ângulo da auto-ajuda, estejamos realmente exercendo essa capacidade. O que vejo com cada vez mais freqüência, principalmente no ambiente corporativo, é a presença do elemento mais desestabilizador e nocivo que conheço: o medo. Medo corporativo: ?Manda quem pode, obedece quem tem juízo? Ou ainda: ?Você não é pago para pensar e sim para trabalhar? Medo que causa nas pessoas o desejo inevitável de buscar nos textos fáceis as soluções de curto prazo e, com isso, viver com ainda mais medo. Medo de não ser competitivo, de não ser vencedor, de não ter poder.

A possibilidade de escolha ? Então, a questão principal, passa a não ser mais o livro e sim o indivíduo e suas escolhas. Estar feliz com o que se é e com o que se quer ser, é o que nos diferencia, além de um comportamento quase rebelde de não se emular idéias e atitudes que de forma traiçoeira envolvem as pessoas, fazendo com que se acredite que aquele é o único jeito de fazer as coisas.

O livro é um bom ponto de partida. O que se faz a partir daí é o que importa. Se a ansiedade é maior do que a ajuda, esqueça o livro e os resultados projetados por ele. Escreva você mesmo a sua história.

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