Como se preparar muito melhor para uma negociação

Existem inúmeras razões que podem levar uma negociação ao fracasso, mas o principal “pecado” é não entender que a maioria das negociações se ganha ou se perde de acordo com a qualidade da preparação – entre outras coisas, quando não se faz uma análise de riscos.

Benjamin Franklin costumava dizer: “Quem não leva a sério a preparação de algo, está se preparando para o fracasso”. Assim, se quiser fracassar, você já tem a receita e pode fazer o que muita gente faz: inventar uma porção de desculpas para não se preparar, tais como: “não é preciso, eu já sei tudo”, ou então, “eu não tenho todos os dados, foi tudo de improviso, ou “eu não tenho tempo”. Essa é apenas uma pequena lista das desculpas daqueles que se preparam para o fracasso. Cabem algumas considerações.

  1. Quem não tem tempo para preparar vai acabar tendo que arranjar tempo para o retrabalho ou para amargar o fracasso.
  2. Existem duas espécies de preparação: a específica e a não específica. A específica é quando se sabe de antemão com quem se vai negociar. A não específica é para as negociações imprevistas. Essa preparação é do tipo “corpo de bombeiros”. Os bombeiros se preparam para apagar incêndios, não importa onde e como ocorram.
  3. A questão da dinâmica emocional: o ser humano age no sentido de buscar o prazer e evitar a dor. E não existe nada atraente em preparar uma negociação, a menos que você consiga dar um grande significado a essa preparação, como na história dos três operários que estavam fazendo uma mesma obra e, perguntados sobre o que estavam fazendo, responderam respectivamente: “Estou assentando pedras”, “Estou fazendo uma escada”, “Estou construindo uma catedral”. Portanto, uma mesma obra suscitou três respostas muito diferentes. A maioria das pessoas não prepara porque acha que está assentando pedras. Se conseguir entender que preparar uma negociação é construir uma catedral, já temos um excelente ponto de partida.

Também é preciso que se domine a tecnologia de preparação. De acordo com Sun Tzu, é preciso ver uma situação por dois pontos de vista: o nosso e o do outro lado. Mas, atualmente, isso só não basta, é preciso um terceiro olhar, que é o de um observador neutro.

Por outro lado, podemos seguir com Ilya Prigogine, Prêmio Nobel de Química, que postula o fim das certezas. Isso quer dizer que o enfoque determinístico já era. Assim, também temos que adotar uma abordagem probabilística. Para tanto, considere três possibilidades:

  • Otimista, ou o que de melhor pode acontecer. Assim, esteja preparado para o melhor – caso contrário, você poderá não percebê-lo e perder oportunidades, ou seja, achar que é bom demais para ser verdade. Nem tudo é tempestade. Às vezes, os ventos sopram a favor.
  • Pense depois no que seria o mais provável, tendo em vista não só o que aconteceu no passado, mas também as tendências que estão se manifestando, bem como as projeções de futuro.
  • E, finalmente, no que pode acontecer de pior. Sempre pode acontecer a Lei de Murphy ou aparecer um imprevisto, uma surpresa negativa. De qualquer forma, é preciso estar atento aos pequenos sinais que podem tanto se transformar em tempestades como em grandes oportunidades.

Baseado nesses pontos de vista e possibilidades e para que se possa fazer uma análise de risco, desenvolvi a Matriz de Preparação de uma Negociação, que é uma estrutura conceitual única, que já testei em meus seminários de negociação com resultados surpreendentes e extremamente positivos, fazendo, inclusive, com que os participantes mudassem radicalmente a forma como vinham conduzindo suas negociações, inclusive as que já estavam em andamento.

MATRIZ DE PREPARAÇÃO

 

Possibilidades de desfecho

Pontos de vista

Otimista

Realista

Pessimista

Eu

     

Outro

     

Neutro

     

Para preparar bem uma negociação, é fundamental que se leve em conta nove dimensões – em geral, as pessoas atentam para apenas uma ou, no máximo, duas. Quem for otimista, considera a dimensão Eu/Otimista. O pessimista, a dimensão Eu/Pessimista.

Dominar essa matriz requer um bom aprendizado, mas compensa. Você terá uma visão mais abrangente de suas negociações. A estratégia de aprendizado comporta três passos. Primeiro, aprenda a ver a situação pela sua ótica, considerando as três probabilidades. Depois, pela ótica do observador neutro. E, finalmente, pela ótica do outro. Houve um tempo em que considerei que o segundo passo deveria ser ver a situação pela ótica do outro, mas constatei que, para a maioria das pessoas, isso é mais difícil. A partir da matriz, cabem algumas considerações:

  1. No caso de uma negociação com mais de duas partes, as linhas da matriz devem contemplar todas as partes envolvidas.
  2. Para utilizar a matriz, é preciso criatividade e imaginação. Não se trata de um exercício burocrático. Na realidade, a preparação é um exercício de imaginação e criatividade.
  3. O que de pior pode acontecer para um negociador? Negociar com uma pessoa desonesta e muito competente. Um caso clássico disso foi a negociação entre Hitler e Neville de Chamberlain, primeiro ministro do Reino Unido, para tratar da questão da paz na Europa. Chamberlain foi iludido por Hitler e fez um péssimo acordo.
  4. Tenha planos contingenciais para os casos de imprevisto.
  5. Tenha em mente que o que importa não é o que você faz, mas a resposta que você obtém pelo que faz. Assim, se o que você estiver fazendo não levar para onde você quer, tenha alternativas e mude.
  6. Saiba quando é importante mudar, mas também quando é importante manter a posição. Isso se chama flexibilidade. As duas frases abaixo explicitam melhor esse conceito:
  • “Insanidade é fazer as mesmas coisas repetidas vezes e esperar obter resultados diferentes.” (Jeff Olson)
  • “Quando nada parece ajudar, eu vou e olho o cortador de pedras martelando sua rocha talvez cem vezes sem que nem uma só rachadura apareça. No entanto, na centésima primeira martelada, a pedra se abre em duas e eu sei que não foi aquela a que conseguiu, mas todas as que vieram antes.” (Jacob Riis)

Isso significa que flexibilidade é comportamento adequado à situação. De qualquer forma, lembre o que disse Albert Einstein: “A mente que se abre para uma nova ideia jamais volta ao seu tamanho original.” Assim, quando você compreender a Matriz de Preparação da Negociação, você vai se abrir para novas possibilidades e resultados. Outras considerações sobre a preparação:

  1. Prepare-se para todas as etapas. Sempre tenha em mente que a negociação não acaba quando o acordo é firmado, mas sim quando o acordo é cumprido.
  2. Procure saber se a negociação deve ser conduzida na base da barganha de propostas ou na base da solução de problemas. Isso pode fazer uma grande diferença.
  3. Tenha cuidado com discursos do tipo ganha/ganha. Só sabe efetivamente o que é ganha/ganha quem conhece muito bem as táticas ganha/perde, como a falsa negociação, a surpresa final, o falso acordo e uma série de táticas psicológicas. Caso contrário, pode-se estar sendo profundamente ingênuo.
  4. Faça uso do MIN – Modelo Integrado de Negociação. O MIN é um modelo que desenvolvi com o objetivo de possibilitar uma abordagem holística de uma negociação. Tem como ponto de partida uma pergunta bastante simples: quais são todas as condições necessárias e suficientes para que se tenha sucesso em qualquer negociação, seja ela nos níveis estratégico, tático ou operacional, não importando o grau de complexidade envolvido? O modelo compreende cinco aspectos fundamentais e presentes em toda e qualquer negociação, que são:
    1. Conhecimento do negócio pelas óticas técnica, financeira, contábil, jurídica, tributária, etc.
    2. Cenários da negociação. Toda negociação ocorre em três cenários: o primeiro é aquele em que se dá a negociação. O segundo é o do eleitorado, ou, seja das pessoas importantes para os negociadores. O terceiro é o do macroambiente econômico e social.
    3. O processo de negociação, suas etapas, estratégias e táticas de informação, tempo e poder, as formas de se fazer concessões e de superar impasses e objeções.
    4. O relacionamento interpessoal, que importa, entre outras coisas, nos estilos comportamentais de negociação, catalisador, apoiador, analítico e controlador.
    5. A realidade pessoal do negociador, com suas crenças, valores, determinação, paixão e capacidade para superar adversidades.

O que qualquer negociador que queira alcançar um patamar de excelência deve entender é que sem uma boa preparação, não há possibilidade de sucesso real. Assim, prepare suas negociações. Construa a sua catedral que você vai começar a ver que existem milagres e sempre tenha em mente que quem pode mais pode menos.


José Augusto Wanderley é consultor em Negociação e Liderança e autor do livro Negociação total. É master practitioner em Programação Neurolinguística e tem formação internacional em coaching. Já treinou mais de 20.000 pessoas.
E-mail: [email protected]

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