Marketing Share Vs. Client Share, Uma Revolução a Caminho

Apenas 1,2% de nosso tempo é dedicado hoje a uma efetiva e séria análise conjunta do faturamento do nosso negócio

No ano de 1886, numa fria tarde de inverno alemão, um senhor de nome Daimler, mais tarde sócio do sr. Benz na produção dos automóveis Mercedes, promovia uma reunião com os funcionários de sua indústria ainda nascente.

Durante o encontro, ele fez uma previsão otimista do potencial máximo de automóveis que poderiam vir a ser um dia consumidos pelo mundo todo. Nesse exercício de futurologia ele procurava exagerar no número para demonstrar todo o potencial do seu negócio e impressionar os seus colegas de fábrica. E chegou à incrível soma de um milhão de unidades! Isso era tudo que sua imaginação conseguia enxergar.

Hoje, cerca de 450 milhões de automóveis circulam pelas ruas e estradas do planeta, transformando a então exagerada estimativa de Herr Daimler numa pífia e ridícula quantidade. A razão desse monumental equivoco é que ele havia feito uma previsão do futuro baseada em uma visão do presente, sem a capacidade de antever as profundas transformações que o automóvel traria para a sociedade moderna.

Da mesma forma, se alguém tivesse calculado o potencial de mercado para as máquinas Xerox, baseando-se no número de folhas de carbono que eram vendidas na época de sua invenção, talvez nem tivessem se dado ao luxo de iniciar a produção.

Assim é o futuro, cheio de surpresas e fatos inesperados, mas para os quais nós devemos e precisamos estar preparados.

É praticamente impossível trabalhar em marketing e vendas sem estar constantemente auscultando o futuro, tentando identificar o que nos reserva os próximos anos, e buscando antecipar como será o nosso mundo, nosso ambiente de trabalho e, principalmente, nossa missão daqui para a frente.

Algumas pesquisas realizadas recentemente nos EUA revelaram que executivos de empresas em geral dedicam apenas 40% de seu tempo analisando, conhecendo e pesquisando o mercado. Olhando da porta da rua para fora. Desses 40%, apenas 30%, analisam as perspectivas desse mercado a médio e longo prazos. E desses 30%, apenas 20% fazem isso em equipe, transformando esse esforço numa real contribuição para seu negócio. Temos, então, a equação

(40% x 30% x 20%) = 2,4%
Onde conclui-se que, no mercado americano, apenas 2,4% do tempo dos executivos é dedicado ao esforço de analisar o que vem por aí. Se fizéssemos essa análise no Brasil, que tem sido até hoje um País onde as pessoas estão mais preocupadas com o fim do mês, do que com o fim do mundo, esse tempo deve ser no máximo a metade do americano. Com isso, teríamos entre nós a seguinte equação:

(40% x 30% x 20% = 1,2%
2
Ou seja, apenas 1,2% de nosso tempo é dedicado hoje a uma efetiva e séria análise conjunta do futuro do nosso negócio.

Por isso devemos aproveitar toda e qualquer oportunidade para avaliar o que nos reserva o futuro. Qual o impacto das mudanças sociais e mercadológicas no nosso negócio, e como se antecipar a isso, aproveitando-as melhor à medida que vão surgindo à nossa frente.

Dentre todas as grandes alterações por que passa atualmente a área de Marketing e Vendas, e que já projeta intensas transformações no cenário competitivo futuro, uma das mais importantes é o conceito de Market Share Vs. Client Share.

CONQUISTANDO E MANTENDO O CONSUMIDOR

Os especialistas e estudiosos afirmam que o futuro do Marketing e das Vendas será determinado pela produção taylor made (sob medida), distribuição individualizada e mídia segmentada e interativa, alterando completamente as regras da concorrência como conhecemos hoje e redefinindo radicalmente o conceito de liderança de mercado.

Em vez de market share (participação de mercado), o objetivo de qualquer empresa será conquistar o client share (maior participação por cliente), o pedaço da preferência de cada consumidor ao nosso produto ou serviço, individualmente. Não se pensará mais na escala da transação de Marketing e Vendas, e sim no alcance, no âmbito, no scope dessa relação.

Em outras palavras, as empresas deixarão de tentar vender um determinado produto para o maior número de consumidores possível, e passarão a ter como objetivo vender para um determinado consumidor o maior número possível de produtos, durante todo seu ciclo de vida. A verdadeira medida do sucesso das empresas, portanto, deixará de ser market share e passará a ser client share.

No quadro-resumo logo abaixo, é possível perceber as diferenças básicas entre as duas formas de relacionamento.
Função – Gerente de produto
Objetivo – Vender um produto de cada vez
Target – Maior número possível de cada vez
Diferenciação – Produto
Concentração – Economia de escala
Fluxo – Novos clientes para os mesmos produtos

Função – Gerente de mercado
Objetivo – Vender o maior número possível de produtos
Target – Um consumidor de cada vez
Diferenciação – Cliente
Concentração – Economia de scope
Fluxo – Novos clientes para os mesmos clientes

Hoje, a preocupação com o client share começa a ficar tão evidente nas organizações que algumas fórmulas matemáticas já começam a ser aplicadas em modelos de simulação. Elas procuram identificar e traduzir a melhor maneira de se posicionar frente a esse novo objetivo para os principais especialistas em Marketing e Vendas das empresas.

LTV – Lifetime Value
i – Resultado das vendas para aquele determinado consumidor durante o período i, mais todos os benefícios pós-venda (referências, etc) no período i, menos o custo de manutenção do relacionamento durante esse mesmo período.
d – Discount Rate (faturamento futuro total descontado a valor presente).
n – Período final, estimativa do horizonte de tempo de vida daquele consumidor.

A razão básica disso tudo é que é muito mais barato manter um cliente do que conquistar outro. Pesquisas revelam que, em média, tomando-se em conta uma cesta variada de produtos e serviços, essa proporção é de cinco para um:

Conquista vs. Retenção
Custo de aquisição de um novo cliente: US$ 20,00
Custo do manutenção de um atual cliente: US$ 4,00

Se tomarmos como exemplo duas organizações, uma com ênfase na conquista de novos clientes e outra na manutenção dos atuais, fica muito fácil identificar qual delas está no caminho certo:

Ênfase na aquisição
6 novos clientes: $ 120
5 atuais clientes: $ 20
Custo total: $ 140
Total clientes: 11

Ênfase na manutenção
3 novos clientes: $ 60
20 atuais clientes: $ 80
Custo total: $ 140
Total clientes: 23

A verdade é que os profissionais de Marketing estão descobrindo que consumidores são como rádios, não possuem apenas o botão liga-desliga, mas também os botões de sintonia e de volume. Cabe às empresas buscar uma melhor sintonia com seus atuais clientes e ir, gradativamente, aumentando o volume de consumo. Caso a sintonia sofra qualquer interferência, seguramente o botão de volume será acionado para baixo, ou até desligado.

De acordo com o Princípio de Pareto, 80% dos negócios de qualquer empresa são realizados com apenas 20% de seus clientes. Os índices podem variar de segmento para segmento, mas o princípio permanece. De acordo com James Putten, da área de Information Management da American Express, os heavy users de cada setor investem na proporção de 16/1 no varejo, 13/1 em restaurantes, 12/1 em passagens aéreas e 5/1 em estadias de hotel. E são eles exatamente que respondem mais favoravelmente a qualquer esforço de girar o seu botão de volume. Os programas de frequent flyers, considerados hoje o mais bem-sucedido esforço de fidelização, são baseados justamente no Princípio de Pareto.

MAIS TEMPO DE CONSUMO

Outra razão importante para a busca da fidelidade do consumidor é que as pessoas estão vivendo mais tempo e começando a consumir mais cedo. A vida média de consumo dobrou nos últimos trinta anos. E com ela, dobrou também a importância e eficiência do conceito de client share.

Antigamente, uma pessoa tornava-se um consumidor ativo quando atingia a maioridade, e aos cinqüenta anos já era considerada fora da curva-padrão de spending. Hoje, aos sete ou oito anos já começamos a consumir ou influenciar o consumo, e até os setenta anos continuamos adquirindo bens e serviços em quantidade. O que só reforça a importância de se cultivar essa relação próxima, individualizada e preferencial com seus atuais e futuros clientes.

Segundo Carl Sewell, escritor, palestrante e dealer de automóveis, cada indivíduo que entra no show room de sua revendedora representa um potencial de consumo médio de US$ 300 mil durante toda a sua vida.

O cálculo leva em conta o preço médio de todos os carros que esse consumidor vai adquirir até o fim de sua existência economicamente ativa, além dos serviços e peças que vai consumir nesse mesmo período. Já a GM estima o valor médio de um cliente fiel, incluindo aí os produtos financeiros como financiamento e seguro, ao redor de US$ 400 mil.

Essa mesma análise vale para todos os outros segmentos de mercado. De acordo com a empresa de consultoria TARP – Technical Assistance Research Programs Institute, um fiel cliente de um supermercado gasta em média US 3,8 mil por ano. Já para as companhias aéreas, o valor estimado de viagens de negócios durante uma vida profissional é de mais de US$ 100 mil. Tudo isso faz com que o conceito de client share cresça em importância para as organizações, e acabe forçando as áreas de Marketing e Vendas a se prepararem para essa nova abordagem de mercado que já começa a revolucionar estruturas, revisar conceitos pré-estabelecidos e tirar o sono de profissionais em todo o mundo.

Concordo com um dos gurus dos tempos modernos, Peter Drucker, quando ele diz que podemos ter duas certezas sobre o futuro: será diferente do que existe hoje e nada parecido com o que imaginamos dele. Mas, como empresários e executivos, não podemos esperar que os fatos se comprovem para só então nos prepararmos para reagir.

Ficar apenas lendo ou escrevendo sobre o futuro do Marketing sem uma ação concreta e efetiva é, no fundo, como perder tempo discutindo a posição das cadeiras no convés do Titanic. Há um enorme iceberg à nossa frente, e ainda podemos desviar de seu curso. É apenas uma questão de tempo. Você decide.

O futuro do Marketing e das vendas será determinado pela produção taylor made (sob medida), distribuição individualizada e mídia segmentada e interativa

Oitenta por cento dos negócios de qualquer empresa são realizados com apenas 20% de seus clientes

OS PRÓXIMOS DEZ ANOS

Em uma entrevista exclusiva para a revista HSM Management, Philip Kotler, considerado o maior especialista mundial em Marketing, destaca o que ele considera as principais tendências para o final desta década e início da próxima.

  1. As companhias estão avançando mais na direção do marketing de relacionamento, afastando-se do marketing voltado para transações. Em vez de procurar fazer uma venda rápida, preferem cultivar um cliente de longo prazo.
  2. Consequência direta disso, as companhias estão dando maior ênfase à manutenção e satisfação do cliente que à conquista de novos compradores.
  3. As companhias também estão dando mais ênfase ao aumento da sua “cota de clientes” e não apenas à “cota de mercado”.
  4. As empresas estão montando, por conta das três tendências anteriores, sistemas de marketing apoiados em banco de dados, nos quais poderão manter uma grande quantidade de informações sobre cada um dos clientes, tais como dados demográficos, histórico das transações, hobbies, preferências, etc.
  5. As equipes de venda estão sendo aparelhadas com computadores portáteis, faxes, telefones celulares, pagers, o que acrescenta mais eficiência às suas atividades. Chama-se a isso de automação das vendas.
  6. O poder está sendo deslocado dos fabricantes para os gigantescos varejistas que hoje estão lançando marcas de loja de alta qualidade, vendidas a preços mais baixos. Os fabricantes estão procurando encontrar maneiras para preservar a força de suas marcas em face do poder crescente dos varejistas.
  7. A publicidade cede espaço a uma abordagem mais abrangente, denominada “Comunicações Integradas de Marketing”, na qual há uma mistura de publicidade, promoções de vendas, relações públicas e marketing direto.

PARA SABER MAIS

Mantendo Clientes – Coletânea de artigos de sucesso publicados pela Harvard Business Review. Makron Books.

Mitos do Marketing que Estão Matando Seus Negócios – Os autores lançam luz sobre 170 mitos que podem estar prejudicando sua empresa. Makron Books.

Mantendo Clientes Fiéis e Para Sempre – Analisando 200 empresas orientadas para o cliente, os autores apresentam 12 etapas estratégicas que resultam em concentrar seus serviços aos clientes. Makron Books.

Walter Longo é diretor da Unimark/Longo e presidente da Abraforte – Associação Brasileira dos Fornecedores de Televisão por Assinatura. Para contatá-lo: (011) 3043-7260

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