Mudança de Foco no Marketing da Empresa

Falemos aqui de um exemplo que chama a atenção dos estudiosos do marketing nacional, o caso das Sandálias Havaianas, do Grupo Alpargatas. Durante anos a fio, as sandálias havaianas foram consideradas e vendidas pelo seu apelo e preço popular, portanto levando uma certa qualidade x durablidade adequada ao target da Alpargatas, o que o público queria (ou podia pagar).

A sandália do povo, o calçado brasileiro autêntico (do desfavorecido), que era utilizado para o trabalho e lazer, indistintamente por grandes massas de consumidores, preconceituosamente destinada a alguns estratos sociais, era geralmente desprezada por outras classes, talvez A e B.

Durante anos, as suas vendas foram um sucesso por razões óbvias. A sociedade brasileira era o maior motor de seu crescente aquecimento em vendas e conquista de novos consumidores, que paulatinamente vinham perdendo renda, pelos desmandos econômicos e também por pressões da chegada de um novo contexto mercadológico e econômico mundial, pela intensificação da globalização que, trazendo novos materiais e tecnologias, dava margem à entrada de novos concorrentes nesse mercado.

Até então, seu foco de marketing ou todas as suas ações de mercado visavam a essas classes, que aqui chamadas de C,D e E, não pensavam sequer em atendimento, qualidade, diferenciação, status e outros ícones do socioambiente atual do homem moderno, pelo simples fato de falta de acesso financeiro-econômico.

Caracterizado pelo consumo massificado, com mídia de massa e artistas populares como Chico Anísio, o marketing das sandálias havaianas sempre foi o suficiente para a obtenção dos lucros esperados, principalmente pela garantia de um crescimento vegetativo de demanda.

Percebeu-se, no entanto, uma radical mudança no enfoque da Alpargatas para esse produto. Após a entrada em seqüência de muitos concorrentes, destacando-se aqui o Rider, da Grendene, que vinha com uma agressiva campanha (popular, embora mais refinada), uma qualidade maior, mais cores e apelo jovem.

A Alpargatas mudou seu foco de marketing, criando um novo nicho, mas mantendo seu aspecto antigo (o popular calçado brasileiro), de produto, materiais e tecnologia empregadas. De fato, mudou-se o alvo de seu marketing. O que fazer quando o brand está comprometido, os lucros caem e o consumidor reclama? Mudança é a palavra. E foi o que a Alpargatas fez em relação às sandálias havaianas.

Astutamente, passaram a fazer um novo marketing de relacionamento com outros tipos de formadores de opinião institucionais, ou seja, boutiques, em vez de grandes magazines e atacados populares. Passaram a utilizar grifes, artistas e modelos de beleza do mundo jovem (nitidamente de classes econômicas mais altas), visando à utilização de seu produto, agora como símbolo de status e de um novo estilo de vida.

O atual estilo de vida jovem, abarcado pelo novo foco do marketing da empresa, está amparado numa nova “onda jovem urbana” chegada da Europa – a dos clubbers -, que passou a invadir grandes cidades brasileiras e a ditar um novo comportamento social de uma pequena parcela da população, o novo target da marca.

Associando a popularidade das sandálias havaianas ao que todo jovem brasileiro ambiciona ser (cult, irreverente, festivo, diferente e estar na moda), a Alpargatas retoma seu crescimento de mercado, ganha alguns pontos em sua imagem institucional e passa a vender cada vez mais, além de ter criado um novo nicho, muito diferente de seu concorrente de peso, o Rider (que nesse nicho não poderia concorrer, devido a seu apelo mais esportivo). Se a empresa não pode embater-se de frente com determinadas iniciativas concorrentes, redirecionando seu foco para uma nova ação de mercado, ela pode criar um nicho e assim reaver lucros e alguma parcela de público perdida (porém noutro segmento ou ponta de consumo, onde desenvolva algo de novo ou onde possa aproveitar uma de suas competências).

A ação de encontrar um nicho, com base num nascente comportamento social (o dos clubbers), aliado ao marketing junto a griffes famosas e boutiques, mais gente de peso no nível do status social jovem, pode aqui facilmente ser caracterizada por uma inteligente, assertiva e eficaz abertura da Alpargatas em direção a um novo marketing (novo foco da ação empresarial) e que, substituindo uma estratégia de cerca de 30 anos, redescobre com sucesso o poder da direção e do enfoque empresarial para as tendências e novas disposições do mercado.

Percebe-se que o foco da empresa ou de sua atuação pode e deve ser usado como uma importante ferramenta de marketing a favor de lucros, share of mind e conquista de mercado, barrando concorrentes e criando tendências. Confunde-se aqui, mais uma vez, o marketing com o foco e este com o marketing da empresa.

Outro breve exemplo de alteração no foco da empresa é o da Petrobrás, que no início da crise mundial do petróleo (pelos idos de 1973) passou a pesquisar novas formas de tecnologia na busca de fontes de energia alternativas, em contraposição ao combustível fóssil e não-renovável, em substituição ao seu principal foco ou core business, o petróleo.

Como o resultado de anos de pesquisa e investimentos maciços em todas as suas frentes, inclusive em algum grau na sua propaganda, a Petrobrás é hoje um dos líderes mundiais na pesquisa de novas fontes de energia, incluindo-se aí a eólica, a solar, a elétrica e outras formas alternativas.

E nas palavras do professor Theodore Levitt, a tal “miopia em marketing” teria sido substituída pela Petrobrás por uma visão sistêmica e integral do seu ambiente de mercado. Ou seja, perguntou-se naquele momento: “qual é nosso mercado? O do petróleo, gasolina e seus derivados ou o da energia?”. E por certo, encontrou-se o sucesso optando-se pelo segundo, a energia.

Novamente, mudando de foco na atuação empresarial para a consecução de um marketing de sucesso, conquista de novos mercados e nicho, atuação na mente do consumidor e contorno de barreiras ambientes, além é claro de bloquear concorrentes (especialmente, como o ocorrido, na área da energia elétrica).

Obteve-se um grande exemplo de marketing e de visão estratégica da empresa, a partir de seu foco de atuação, ou de sua melhor ação empreendedora. Criar e recriar, em vez de apenas reproduzir e repetir.

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