O Imaginário da Marca

Existe uma maneira radicalmente oposta à forma tradicional de se olhar o mercado, o olhar através da emoção. O produto e nome do fabricante têm um poder ilimitado de criar identidade e valor para a marca. Imagine duas camisetas brancas, uma sem marca , a outra com o logo da Calvin Klein. A Calvin Klein tem um valor muitas vezes maior, porque associa a imagem chique simples que está no imaginário do consumidor.

O produto em si tem um poder de atração limitado para o consumidor. Em 1991, o diretor de marketing da Levi””s decidiu mudar o apelo do espírito Levi””s para o tecido e as cores. Os consumidores pararam de comprar e a participação de mercado caiu de 40%, em 91, para 31%, em 92. O presidente foi para a mídia e declarou que eles cometeram um erro em pensar que vendiam roupas de qualidade, o que as pessoas compravam era o espírito Levi””s. Resultado, a Levi””s recuperou seu mercado.

Todo o arsenal teórico e prático em marketing é baseado apenas na razão-estratégica competitiva baseada nos atributos do produto e no posicionamento conceitual. A “personalidade da marca”, que é fator de atração emocional, não é considerada estrategicamente. Meus anos de trabalho em agências multinacionais mostraram que poucas marcas têm um imaginário definido, porém algumas poucas marcas têm uma imagem tão bem definida, que podemos descrever sua personalidade em poucas palavras. Por exemplo:

Marlboro significa o domínio do seu território;
Chanel é a beleza clássica;
Nike é o espírito cosmopolita e rebelde;
Desodorante Impulse é o sonho de ciderela;
BMW é sofisticação e poder;
McDonald””s passa o espírito lúdico e familiar;
Benetton respeito e solidariedade humana;
Free significa inteligência e espontaneidade
Levi””s é o rústico autêntico
OMO significa respeito e valorização da dona-de-casa.

Permanece um “gap” entre o enfoque do marketing e o do consumidor. A motivação das empresas é vender os produtos e a dos consumidores, comprar sonhos. Profissionais de marketing buscam grandes idéias, os consumidores querem satisfazer suas emoções. Quando o consumidor vai às compras, ele procura marcas para se sentir elegante, casual, rebelde, sensual, esportivo, chique. Não está procurando grandes idéias criativas. O que deveria ser a essência da estratégia de marketing é a definição do espírito da marca. A personalidade é importante porque tem o poder de atrair ou repelir o consumidor. Tendemos a valorizar, nas marcas, atributos, entidades e pessoas com as quais temos identificação.

Vamos dar um exemplo de duas imagens de produto bem conhecidas: Hollywood e Carlton. Os fumantes de Hollywood são atraídos pela marca porque ela passa juventude, emoção, vitalidade; o fumante de Carlton vê em Hollywood traços grosseiros, imaturos, sem mentallidade. Já o fumante de Carlton vê em sua marca maturidade, refinamento, cultura; enquanto o fumante de Hollywood percebe o fumante de Carlton como mauricinho, fresco e presunçoso. Isso mostra a relação afetiva entre a personalidade da marca e seu consumidor. Com as marcas que não possuem uma personalidade definida, a relação com seu consumidor é puramente funcional. Durante 15 anos, pesquisei as características de personalidade que atraem o consumidor e cheguei a 25 padrões básicos de identidade, que defini como Arquétipos ( modelos, padrões) Emocionais. Como no caso de Hollywood e Carlton, as pessoas escolhiam uma imagem que elas gostavam muito e a descreviam. Meus colegas de trabalho diziam que a imagem é ambígua e preferiam “cair” no conceitual, mas, apesar da diversidade de opiniões inicial, a percepção de valor se repetia a cada 20, 50, ou 100 consumidores. Na continuidade do trabalho, que o que importa é a personalidade do produto e não a do consumidor, e isso é uma visão oposta à tradição dos processos de pesquisa. Isso significa que marketing trabalha com o inconsciente coletivo e não o pessoal. Por exemplo, a rosa tem um “espírito refinado”, independente de classe social, idade, sexo ou cultura. O morango tem um “espírito sofisticado”, em qualquer país. A melancia é matrona protetora dos filhos e nutre. Cada arquétipo também tem um espírito, e pensando assim é muito mais fácil trabalhar o imaginário da marca. O espírito da marca precede o próprio produto. Na indústria automobilística, por exemplo, com uma palavra podemos definir melhor a imagem de um carro do que um plano de marketing de 300 páginas. O “espírito aventureiro”, off-track, tipo jeep, robusto, sem frescura. O “espírito playboy”, convencional, caro, pintura brilhante, todas as mordomias. “Espírito tradicional, grande, seguro, família, alto consumo.

Uma análise competitiva que tenha como enfoque o posicionamento emocional das marcas pode nos revelar mais oportunidades concretas do que a análise tradicional do produto. Tomemos o mercado de jeans nos Estado Unidos como exemplo:

Guess: é o prazer da sensualidade (arquétipo Exaltação dos Sentidos)
Gap: é o casual moderno ( arquétipo Expressão)
Calvin Klein: é o simples sofisticado (arquétipo Sensibilidade)
Levi””s: o rústico autêntico (arquétipo Expansão)

Vemos que no mercado brasileiro não existe marca ocupando a posição da Gap, e, o mais gritante, nem da Levi””s – posicionamento usado, no passado, com algum sucesso na campanha ””Uma calça velha e desbotada”, da US TOP.

Um refinamento da definição da imagem é a simbologia relacionada ao produto. Podemos Ter dois produtos com suas marcas associadas ao “arquétipo raiz”. Por exemplo: Biscoitos Maria e comida caseira. Os dois passam a emoção da simplicidade, laços afetivos fortes, aconchego e proteção. Mas seus universos simbólicos são diferentes, o biscoito está associado a uma mesa de cozinha de madeira, com toalha xadrez azul e branco, 4h30 da tarde, o bule e bolo de fubá, a avó por perto O prato, ao sol de 11h30 da manhã, batendo no pé de laranjeira, o fogão à lenha, feijão com arroz e salada de alface. As cores têm também u efeito de fortalecimento da imagem. Se o consumidor ver uma travessa cheia de iogurte, ele associa o branco e azul. A embalagem mais próxima do ideal é a da Danone. Já o biscoito de chocolate é mais valorizado numa embalagem azul marinho, transmite mais qualidade.

Esses elementos estão no inconsciente coletivo, porque já trabalhei com estes produtos no Brasil e no exterior, e os resultados são os mesmos. Existem elementos de imagem que estão além dos limites culturais.

Os arquétipos demonstram que a emoção faz mais sentido que a razão na comunicação de massa, e os uso adequado das imagens traz os consumidores para um nível de satisfação mais elevado.

Qual a percepção de um vinho de qualidade? A pesquisa tradicional nos leva a uma infinidade de conceitos que aparentemente se somam: o vinho é uma bebida saudável que não faz mal como outra bebida alcoólica. Tem um processo natural de produção. Lembra Jesus. Ninguém toma vinho para se embriagar. Está associado à longevidade. Mesmo o vinho barato não é vulgar, é nobre e ritualístico, símbolo de refinamento. O vinho branco é light e sensual.

Só quando apresentamos imagens conseguimos destrinchar estes conceitos embaralhados e definir o que é mais relevante quando o mercado “pensa””em bom vinho. Se for uma casinha italiana, lembra família, a amizade, um garrafão. Se for um lugar como o Fasano (restaurante de São Paulo), lembra o refinamento, a elegância, a etiqueta, o prazer do paladar apurado. Se for uma mesa à tarde, em Búzios (RJ), lembra a sensualide e a sofisticação, essa é a emoção mais forte que liga o vinho ao mercado. A imagem transcende o conceito tradicional do racional e lógico.

Os passos no desenvolvimento de uma marca são:

1
Conceito competitivo. Ë a síntese do posicionamento de mercado de marca. Por exemplo, a Volkswagen americana, na década de 70, se posicionava como “Pense Pequeno” (Think Small), depois demonstrava as vantagens disto.
2
Personalidade. Cada conceito que concebemos se associa inconscientemente a uma personalidade suave, delicadamente sensual e nutritiva. Molico é o líder do segmento por explorar esta imagem.
3
Atributos.O s atributos do produto devem reforçar a personalidade/conceito da marca. Um carro com o “espírito playboy”, já deve Ter todas as mordomias, tais como: telefone celular, poltronas de couro, ar condicionado.


Em síntese, a marca deve passar uma “personalidade definida”, integrada ao conceito competitivo. A marca forma um elo emocional muito mais forte com o consumidor.

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