O paradoxo da experiência

para pensar

“Seja você mesmo, mas não seja sempre o mesmo.”
Gabriel Pensador

Recentemente, um gerente nacional de vendas de uma empresa de Campinas me contou a seguinte história…

Primeiro ato:

Um jovem executivo – recém promovido a gerente regional de vendas – assume exultante o novo cargo em uma empresa de médio porte.

Analisando o mercado, ele percebe que as ameaças preponderam sobre as oportunidades e que a empresa se encontra numa situação mais frágil do que seus principais concorrentes.

Lembrando-se das lições aprendidas sobre Planejamento Estratégico Comercial, o executivo decide empreender uma série de ações táticas que – na sua opinião – poderiam garantir a sobrevivência da empresa enquanto durassem as adversidades.

Três meses depois, é sumariamente demitido. Sua decisão ocasionara a perda de preciosos pontos de participação de mercado, que a empresa levaria muitos anos para recuperar. Na entrevista de desligamento, ouve do departamento de RH que a inexperiência fora sua maior inimiga.

Cai o pano.

Segundo ato:

O mesmo executivo é contratado como gerente nacional de vendas de uma outra empresa (em outras palavras, “caiu para cima”).

Lá ficou durante mais de dez anos, e nesse tempo vivenciou as mais diversas situações. Numa determinada época, o mercado mostrava-se muito promissor e a empresa encontrava-se plenamente preparada para aproveitar as oportunidades de diversificação que se ofereciam. Depois, o mercado enfrentou uma grave recessão. Foi preciso sacrificar violentamente os lucros para não abrir mão do market share (como o executivo aprendera a duras penas, perder pontos de mercado poderia significar a perda do emprego do gestor comercial). Na medida em que lidava com as novas situações, a autoconfiança do executivo ia aumentando. Já não temia mais enfrentar novos desafios. Todos na empresa invejavam sua experiência e competência.

Cai o pano novamente.

Disposto a enfrentar tudo que aparecesse pela frente – e com a autoconfiança ainda mais reforçada, em função dos inúmeros prêmios e elogios que acumulara nos últimos dez anos –, nosso personagem aceita um novo desafio e vai dirigir a área de comercial de uma empresa multinacional, instalada num setor com amplas possibilidades de crescimento.

Acreditando ter aprendido muito na “dura escola da vida”, o experiente executivo dá início ao procedimento que lhe assegurara o sucesso no passado. Analisa o mercado, avalia oportunidades e ameaças. Analisa a empresa, seus produtos e pessoas, avalia pontos fortes e fracos. Tudo reforça a mais importante premissa estratégica que aprendera: perca dinheiro, mas mantenha o market share. Arregaça as mangas e começa a repetir a sequência de ações que, nos últimos dez anos, lhe garantira fama e reconhecimento.

Entretanto, as coisas não acontecem do jeito previsto. Os resultados que deveriam aparecer nos primeiros três meses não se materializaram (aliás, o EBITDA diminuíra significativamente). Sem entender direito o que estava acontecendo – afinal, agira exatamente como fizera nos últimos dez anos –, pela primeira vez em muitos anos, nosso experiente executivo lembrou-se do fracasso do primeiro emprego.

Mas como tinha enorme confiança na sua própria capacidade, resolveu seguir em frente e ser proativo. Trabalhou duro na preparação de uma convincente apresentação para a diretoria. O objetivo era convencer o board de que aquele era um momento em que coragem e ousadia fariam a diferença. Sua estratégia propunha algo que ele mesmo já havia feito com muito sucesso no passado: apostar na contramão do mercado e comprar as três principais empresas concorrentes, que, por estarem enfrentando os mesmos problemas de mercado, podiam ser adquiridas “na bacia das almas”.

Tendo usado seu sucesso anterior como fiador da estratégia, obteve sinal verde e seguiu em frente. É verdade que no final gastara um pouco mais do que o previsto (cerca de 10% mais, para ser exato), mas sua experiência mostrava que nada era mais importante do que obter significativas economias de escala para manter a participação e se preparar para o novo ciclo de crescimento que, com certeza, viria (afinal, depois da tempestade sempre vem a bonança).

Seis meses depois – e pela segunda vez na sua vida – foi demitido por falta de resultados.

Alguns dias após a demissão, leu numa coluna especializada que a empresa contratara um brilhante executivo cuja fama era de “ressuscitador de empresas”. O nome do “salvador da pátria” lhe pareceu familiar. Fez um esforço de memória e lembrou-se do jovem trainee que havia demitido alguns anos antes, quando era diretor na segunda empresa em que trabalhara. Tentou lembrar a causa da demissão. Pensou, pensou, pensou e finalmente lembrou-se: ele havia sugerido uma estratégia de marketing que acabaria por levar a empresa a perder preciosos pontos de market share.

Cerram-se as cortinas.

Você pode ter se identificado com essa história, que talvez seja muito parecida com a sua própria. Se quer saber porque tudo falhou no terceiro ato, lembre-se do que nos ensina Peter Senge: na vida executiva, um dos maiores desafios é aprender a desaprender.

A lição prática é simples, direta e contundente: as razões do sucesso no passado não garantirão o sucesso no futuro. Aqui vale a pena relembrar o grande cientista Albert Einstein: “é absolutamente insano pensar em conseguir novos resultados agindo sempre da mesma forma”.

Pense nisso (e ouça mais o Gabriel Pensador).


JB Vilhena é coordenador acadêmico do MBA em Gestão Comercial da FGV, doutorando em Gestão de Negócios pela FGV/Rennes (França), consultor e palestrante.

E-mail: [email protected]

 

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