O vendedor e o tirador de pedido

A melhor venda é sempre aquela na qual o cliente entra com um problema e compra uma solução, não um preço. Há quem diga que a profissão mais antiga do mundo é a prostituição. Tentando colocar uma luz na máxima briga de quem veio primeiro ? o ovo ou a galinha, fui um pouco além e cheguei à conclusão de que a profissão de vendedor é a mais antiga. Ora, se é considerada a prostituição, imagine que a primeira pessoa que realizou a oferta, na realidade, era uma vendedora. Ela descobrira que seu corpo era um produto e, se, trocado por dinheiro, lhe renderia um bom lucro.

Para que haja uma venda, é necessário que exista, de um lado, o vendedor e, do outro, um comprador. Alguém com algo a oferecer e alguém com algo a comprar. Partindo dessa premissa e retornando aos primórdios da humanidade, podemos perceber que o homem já gostava de comercializar suas coisas através da troca. Isso também era uma venda. Mercadores trocavam ferramentas por comida, comida por escravos, e assim por diante.

Essa característica da personalidade humana trouxe à luz um personagem e uma profissão que é a base de toda a cadeira comercial: o vendedor. Com ele, veio também o tirador de pedido, o que também podemos chamar de o genérico do vendedor ou um vendedor que não deixa sua marca nem estilo.

A profissão de vendedor ainda é a única que não depende de faculdade nem de formação, mas sim de vocação. É a mais democrática das profissões e exige apenas talento, não importando classe social, cor ou sexo. É ainda a única que permite que uma pessoa comece do nada, até mesmo sem capital, e se transforme, em pouco tempo, em um rico empresário ou um rico vendedor.

Mas, nas lojas, existem dois personagens que se confrontam permanentemente: o vendedor e o tirador de pedido. O tirador de pedido é aquele que reclama de tudo. Reclama da comissão, do café, dos produtos, da promoção, da publicidade. Coloca a culpa em qualquer coisa. Culpa o tempo, o feriado que passou e os que ainda virão. Culpa a economia, o camelô, o prefeito, o governador. Até o Lula leva a culpa, para que ele possa se desculpar (ou seja, tirar a própria culpa) na justificativa de não vender. No fim do mês reclama do salário e xinga a comissão que considera baixa. Por fim, está sempre mudando de loja ou matando tempo.

Já o vendedor age de forma diferente. Busca aprender sobre o produto, faz a sua meta de venda para formar o salário, etc. Geralmente não reclama, se faz isso é por conta da falta de um produto que sabe que vende bem e gira rápido.

Uma situação refletem muito bem a diferença entre eles. Certa vez, pude observar os dois em ação quando fui buscar um produto em promoção. Estava pesquisando um mouse. Ainda não havia definido a cor, marca ou tipo. Na entrada da loja, vi um desses panfletos promocionais contendo uma lista de produtos.

Um rapaz veio me atender e eu perguntei:

? Bom dia, gostaria de ver o mouse da promoção, por favor.
? Bom dia. É este aqui senhor ? respondeu ele.
Olhei, depois peguei o produto. Dei uma pausa e já estava pra sair, quando ele me disse:
? Olha, tem um mais barato.
Achei que ele estava com medo de que eu não levasse o mouse da promoção e prontamente me ofereceu uma opção mais barata, sem sequer saber se preço seria a base da minha decisão de compra.

? O.k.! Mas estou olhando ? respondi.
? Se precisar de algo, estou por aqui.

Disse isso e se afastou, indo atender outro cliente. De longe, fiquei analisando o vendedor e percebi que ele usava a mesma estratégia de venda. O cliente perguntava sobre um produto e ele indicava o mais barato, sem nem saber se era preço que o cliente queria. Depois de apresentar o preço e fechar a venda, entregava um pedidinho em um papel com seu nome e levava o cliente ao caixa. Logo percebi que aquele era um autêntico tirador de pedido. Pedido tirado, próximo cliente. Não importava se o valor da venda: ela tinha de ser rápida, barata e ele precisava preencher o nome no papel. Feito isso, ele passava a buscar outra venda, ou melhor, tirar outro pedido.

Enquanto observava o tirador de pedido, um outro vendedor chegou e se apresentou. Eu ainda estava com o mouse barato na mão.

? Bom dia, senhor. Este mouse é o mais barato que nós temos, mas me deixe mostrar uma novidade. O senhor conhece o mouse óptico e sem fio?
? Não! ? respondi com ar de interesse, eu conhecia o óptico, mas sem fio ainda não.
? Senhor, o mouse sem fio elimina o desagradável problema de acúmulo de fios e lhe dá mais liberdade e melhor mobilidade. É bem mais confortável e não exige manutenção pois, não tem bolinha. Também não trava por conta da sujeira.
? Quanto custa? ? perguntei curioso.
? O senhor usa notebook? ? respondeu ele com outra pergunta.
? Sim!
? Ele é ótimo, pois nada mais chato que aquele mouse de mesa, não é? ? lembrou ele.

Antes de me passar o preço, ele teve o cuidado de informar as condições de pagamento. Foi tão direto que eu deixei o mouse baratinho e me convenci de que ele estava certo. O melhor pra mim era aquele mesmo: o óptico sem fio.

Para alguns, ele me vendeu o mais caro. Para mim, ele vendeu o que eu precisava. Aí está a diferença: um queria tirar logo o pedido; o outro, não. O segundo já sabia que a venda estava feita. Ou seria o da promoção ou o mais barato, sendo assim, me apresentou a novidade e através de perguntas diretas percebeu que era o que precisava e me orientou. Mesmo que não viesse a comprar, pelo menos eu saberia que aquele produto existia. Ou seja: ele me mostrou uma solução e me vendeu um recurso, não um preço. Outra coisa: vendedor bom acaba incorporando a marca da empresa ao seu nome. Assim: José, da Venda S.A.

Isso me fez lembrar de uma história que falava de dois vendedores de sapatos que foram visitar uma cidade. A cidade tinha uma característica peculiar: todas as pessoas usavam sandálias. No relatório do primeiro vendedor, que nada vendeu, dizia: ?Não vale a pena tentar vender sapatos aqui. Todo mundo usa sandálias?. O segundo, que vendeu alguns pares, escreveu: ?Excelente oportunidade para vender sapatos. Aqui todo mundo só usa sandálias e, por isso, existem muitas queixas de dores nos pés, joanetes, calos, etc. Vendi alguns, mas vou voltar novamente para vender mais?.

Nos treinamentos que dou para vendedores, sempre tento decorar alguns rostos. No ano seguinte, quando volto, busco relembrá-los e pergunto quem já havia participado de um treinamento comigo. A maioria é de novatos pois, o turn over é alto. Facilmente percebo os vendedores e aqueles que no ano anteriores estavam apenas matando tempo.

Aí fica a dica: venda o recurso, pois a melhor venda é sempre aquela na qual o cliente entra com um problema e compra uma solução, não um preço.

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