Os desafios do dragão chinês

Como enfrentar um concorrente estrangeiro que vende muito mais barato que você

ocê tem um concorrente que é onipresente, está em todos os setores. De repente, até faz parte do que você fabrica. De pecinhas para equipamentos eletrônicos a motos, os produtos chineses invadem o mercado brasileiro. De acordo com uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em 2007, 26% das empresas brasileiras sofrem concorrência direta das companhias chinesas.

Se você tem mais de 40 anos, deve se lembrar de ter visto algo parecido com a invasão de produtos e marcas japonesas. Começaram com produtos mais baratos, depois investiram em próprias marcas com produtos inovadores e de qualidade. Caso tenha menos de 40 anos, pode se lembrar de que algo semelhante aconteceu com os chamados Tigres Asiáticos. Hoje, temos marcas como Samsung, LG e Petronas conquistando o mundo.

 

Agora é a vez da China. Daqui a pouco, teremos outros países chegando ou, até mesmo, concorrentes internos – aquelas empresas brasileiras que colocam o preço de seus produtos e/ou serviços lá embaixo. Muitas vezes, seu dragão chinês está ao seu lado. A China é apenas o exemplo mais visível hoje de concorrência a preço absurdamente baixo.

 

E para mostrar o quão forte é esse dragão chinês, uma parcela das empresas brasileiras já perdeu mercado com a entrada dos produtos e serviços chineses no Brasil. Veja a tabela a seguir:

 

Participação no mercado doméstico em função da concorrência com produtos chineses

(média ponderada de acordo com % das respostas dos entrevistados)

 

A competição está em todos os lugares, de commodities a produtos de alta tecnologia. Muitos empresários brasileiros resolveram unir-se a empresas chinesas, importando peças ou terceirizando parte da produção. Tais atitudes podem, sim, ajudar com o custo, mas é preciso tomar cuidado para que não ocorra o que aconteceu, por exemplo, com a Embraer e a Boeing que, ao abrirem fábricas na China, viram as indústrias aeronáuticas locais copiarem toda sua tecnologia.

 

Mas o problema maior é o que acontece dentro do Brasil: o impacto dos produtos chineses na concorrência. Como mostra o estudo da CNI, nenhum setor está a salvo. Confira no quadro a seguir:

 

Competição da indústria brasileira com produtos chineses no mercado interno

O que fazer

 

Assim como o Japão nas décadas passadas, não adianta fingir que a ameaça chinesa não existe ou que se trata apenas de uma “marolinha”. É necessário se adaptar a ela. Os empresários ouvidos pela CNI mostraram quais são as estratégias que estão usando para enfrentar a invasão dos chineses (resposta múltipla):

 

  1. 1.    Reduzir os custos/ganhos de produtividade – 48%
  2. 2.    Investir na qualidade/design dos produtos – 40%
  3. 3.    Diferenciar a marca/imagem/esforço de marketing – 28%
  4. 4.    Lançar novos produtos – 27%
  5. 5.    Reduzir drasticamente os preços e/ou a lucratividade – 16%
  6. 6.    Buscar parcerias com outras empresas, mesmo que sejam as chinesas – 13%

Algumas dessas alternativas apresentam mais resultados que outras. A número 5, reduzir drasticamente o preço, por exemplo, pode jogar a empresa em uma batalha que ela não consegue ganhar: só é possível baixar os custos até certo ponto. Para os chineses e países especializados em exportar produtos de baixo custo, esse ponto é muito menor, pois contam com facilidades governamentais, regras trabalhistas mais flexíveis e economia de escala.

Então, vamos analisar as outras opções:

 

Redução dos custos/ganhos de produtividade

 

Uma das melhores características das crises é que elas ajudam as empresas a identificarem áreas que devem ser melhoradas, custos que podem ser cortados, etc. É o que acontece com muitas companhias quando enfrentam uma concorrência que coloca o preço muito abaixo do que o que eles praticam. Ao tentar cortar custos, essas organizações descobrem vários pontos em que recursos estavam sendo desperdiçados.

 

É claro que o aumento dos custos não é feito de propósito. Com o passar do tempo, ações se acumulam no dia a dia da empresa, pessoas são contratadas, procedimentos são criados sem que se pense muito em seu impacto econômico, entre outros. Afinal, a companhia está ganhando dinheiro. A chegada de um concorrente de baixíssimo custo muda tudo isso. As empresas são forçadas a encontrar uma maneira mais inteligente de trabalhar, uma forma de produzir por menos.

 

No entanto, apenas reduzir custos não é suficiente. Para enfrentar esse tipo de concorrência, é preciso apelar para as outras saídas apontadas – que serão tratadas a seguir, confira:

 

Investimento na qualidade/design do produto

 

Talvez, a maior vantagem de uma empresa local contra uma estrangeira, que cobra muito barato, seja a proximidade geográfica. Você pode trabalhar junto a seu cliente, desenvolver produtos com ele, saber o que ele quer, etc. Vocês falam a mesma língua e possuem experiências culturais parecidas.

 

A qualidade dos produtos vindos de países especializados em vendas de baixíssimo custo está melhorando, até porque muitos deles, como a China, estão interessados em desenvolver marcas próprias. Mas esse nível de qualidade que eles fornecem pode não ser o que seu cliente esteja esperando. Talvez, ele queira produtos para um nicho muito específico de mercado ou com alguma característica especial. Assim, qualidade e design andam juntos e só podem acontecer quando fornecedor e cliente caminharem lado a lado.

 

Foi o que fez a Ciser, fabricante catarinense de porcas e parafusos. Ao ouvir as necessidades de clientes da construção civil, ela lançou um sistema de parafusos voltado para estruturas metálicas, com características e design próprios para o serviço pesado. Concorrentes chineses e de outros países têm parafusos que podem ser usados em construções? Lógico. Possuem algum desenvolvido exclusivamente para ser usado por construtoras brasileiras, projetado para desempenhar bem nas condições daqui? Não, não têm. A Ciser agora possui uma vantagem competitiva: um parafuso projetado para o que as construtoras precisam. Com isso, a empresa conquistou até os mercados mais exigentes, como o dos Estados Unidos, mesmo com seu parafuso custando 20% a mais que o de seu concorrente mais próximo.

 

Diferenciação da marca/imagem/esforço de marketing

Ao diferenciar sua marca, criar sua imagem, você passa para seu cliente a ideia de que oferece algo que seus concorrentes não têm. É o que faz a Randay, fabricante de produtos para salões de beleza. Os secadores vindos de outros países são bons, baratos. O que o presidente da Randay, Deusdete Lourenço, mostra é que, ao contrário dos estrangeiros, ele está sempre ao lado dos profissionais do salão. Não está a milhares de quilômetros de distância e seu produto não é apenas mais um na prateleira. A Randay tem uma ampla rede de assistência técnica em que qualquer salão de beleza pode falar com a indústria por telefone ou e-mail. O trabalho do cabeleireiro não corre o risco de ser interrompido por um equipamento que falha, cuja peça tem de vir sabe-se lá de onde.

 

Essa diferenciação é explorada em sua comunicação, no que seus vendedores falam.

Mais um exemplo aqui é a Marisol, presente em um dos setores mais afetados pelos chineses: o têxtil. Em vez de continuar tentando combatê-los com produtos genéricos, sem marcas fortes, ela resolveu ir às compras. Em 2005, comprou a Pakalolo e, no ano seguinte, a Rosa Chá.

 

Encontre também o que você faz e seus concorrentes não fazem e explore essa característica em sua comunicação.

 

Lançar novos produtos

 

A verdade é que você precisa ser mais ágil que os chineses. E essa não é uma tarefa fácil: eles são especialistas em mover um produto do primeiro esboço para a linha de montagem em pouquíssimo tempo. Esse é o motivo de tantos brinquedos serem produzidos naquele país: é preciso ser rápido para que bonecos, jogos, roupas e outros produtos ligados a filmes estejam disponíveis para o consumidor em tempo hábil. E isso, eles fazem muito bem.

 

Mas eles não veem o que acontece nas ruas brasileiras nem conversam diretamente com os empresários daqui. E você pode fazer isso. Identifique as tendências, descubra o que seu cliente precisa e lance no mercado. Sim, nada impede que seu concorrente estrangeiro lance uma cópia, alguns meses depois. Mas, a essa altura, você já terá uma boa parcela do mercado.

 

Você pode fazer o que empresas como a fabricante de computadores Apple faz: quando seus concorrentes estão para lançar algo parecido com seus produtos, ela lança algo melhor e diferente. Essa estratégia exige que fique em constante análise do mercado. E, como vantagem, permite que tenha mais liberdade na hora de precificar seu produto: as pessoas estão dispostas a pagar mais por novidades, desde que percebam que as novas características lhe sejam úteis.

 

É o que faz também a malharia Malwee, de Santa Catarina. Quando os produtos chineses invadiram o mercado, ela mudou toda sua linha de produtos e passou a investir em tecidos e produtos para as classes C e D, que ainda não eram atendidas por outras empresas.

 

Fazer parcerias com outras empresas, mesmo que sejam as chinesas

Sempre há outras companhias com as quais você pode se associar e criar novos produtos, ou diminuir o custo, para enfrentar as ameaças que vêm de fora.

 

Em última análise, você pode usar os estrangeiros para ajudar sua empresa. Se os produtos muito baratos vêm mesmo para o Brasil, é melhor que venham com sua marca, ajudando-o a ganhar maior participação no mercado.

 

Prepare sua empresa

Hoje, a China incomoda. Se ela continuar a seguir o caminho de outros países, em breve irá abandonar o mercado dos produtos com preço muito baixo para produzir marcas, serviços e bens de alto valor agregado. Então, outros países preencherão esse nicho do precinho. A ameaça sempre existirá. Da mesma forma, sempre existirão maneiras de sua empresa se destacar e superar os concorrentes. Não importa se você já sofre ou não com a concorrência dos importados, mostre para seus clientes que o preço não é tudo, que você possui vantagens suficientes para superar qualquer proposta de valor inferior.

 

A ajuda do governo

 

Para tentar fazer com que as relações comerciais entre os dois países fossem mais justas, o governo criou vários acordos comerciais, por exemplo: em 2005, os dois governos assinaram um acordo no qual a China limitaria as exportações ao mercado nacional e, em contrapartida, o Brasil evitaria criar barreiras. No entanto, o acordo venceu no fim do ano passado. O Itamaraty chegou a enviar negociadores para avaliar a situação e propor novo acordo, mas os chineses não aceitaram.

 

Alguns setores da economia já falam em um processo de dumping por parte da China. Segundo eles, com o fim do acordo, os fabricantes estrangeiros apresentaram um valor artificialmente baixo para seus produtos na esperança de ganhar o mercado nacional. Só não se sentiu mais efeitos dessa prática porque as exportações chinesas, em geral, caíram em decorrência da crise internacional.

 

O problema é que o setor têxtil brasileiro também vive uma queda nas exportações. Só em janeiro, a redução nas vendas para o exterior foi de 33,5%. Mas as recentes reuniões do G-20 (grupo que reúne os 20 países mais importantes do mundo) mostraram que o protecionismo, criação de leis que impedem a livre entrada de produtos estrangeiros, tende a diminuir.

 

Para se resguardar, vale a pena se reunir em associações profissionais e encontrar maneiras criativas de garantir seu mercado.

 

Colaboração: Brasílio Andrade Neto 

 

Para saber mais:

Livro: A estratégia do oceano azul: como conquistar novos mercados e tornar seus concorrentes irrelevantes

Autor: W. Chan Kin

Editora: Campus/Elsevier

 

Livro: O que os clientes amam

Autor: Harry Backwith

Editora: Best Seller

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