Quando a coragem e o trabalho se unem, o aviĆ£o decola

Dizem que quando um homem deseja algo com o coraĆ§Ć£o e transforma um sonho em um objetivo, o universo conspira para que ele o conquiste. A EMBRAER, de Ozires Silva, Ć© a prova de que o impossĆ­vel sĆ³ existe na mente limitada de quem nĆ£o sabe sonhar Cheia de anjos da guarda, otimismo, vontade de acertar, amizades e cuidados. Assim Ć© a histĆ³ria da criaĆ§Ć£o da primeira fĆ”brica de aviƵes do Brasil. Quem olha para ela hoje vĆŖ uma empresa que deu certo, que fabrica e exporta aviƵes para os Estados Unidos, Europa e Oriente MĆ©dio. Privatizada hĆ” menos de dez anos, a EMBRAER transformou um paĆ­s de terceiro mundo em concorrente temido pelas naƧƵes mais ricas do universo. Foi defendida por presidentes e chefes de estado e mantida pelo trabalho incessante de homens e mulheres entregues a uma paixĆ£o: acreditar na possibilidade de colocar o Brasil nas alturas.

Voando alto, chegando longe, planando sob as asas de um coraĆ§Ć£o valente; o coraĆ§Ć£o do homem que idealizou esse sonho, o criador da EMBRAER, Ozires Silva. Essa, definitivamente, nĆ£o Ć© mais uma histĆ³ria com final feliz. Foi escrita com garra, coragem, preparo, humildade, muito amor, luta, trabalho e pela ousadia de construir algo que ninguĆ©m jamais sonhou.

Em busca de respostas ? Desde os primeiros anos de vida os amigos Ozires Silva e Benedicto Cezar, o Zico, acalentavam o desejo de voar. Durante uma aula de QuĆ­mica, Ozires perguntou ao professor qual era o motivo de nĆ£o se fabricarem aviƵes no Brasil. O mestre ficou sem resposta, e o garoto saiu em busca dela.

Quando crianƧa, Ozires tentava construir pequenos planadores e fazĆŖ-los voar. Para nĆ£o perder o sonho de vista, ele estudou muito. Viajou de Bauru, sua cidade natal, para o Rio de Janeiro, onde passou em um teste para ser oficial da ForƧa AĆ©rea Brasileira, e formou-se aviador. Estudou mais, entrou no Instituto TecnolĆ³gico de AeronĆ”utica (ITA), e tornou-se engenheiro aeronĆ”utico. Foi para o exterior, especializou-se, voltou ao Brasil e deu seqĆ¼ĆŖncia ao seu objetivo.

PĆ© no chĆ£o ? Diferente dos demais sonhadores, ele nĆ£o desistiu, lutou com todas as forƧas, superou perdas, noites longe da famĆ­lia, desaprovaĆ§Ć£o dos pais e seguiu em frente, porque aquele sonho era maior. O foco de Ozires Silva era muito claro, sempre foi. E seu comportamento mostrava que ele nĆ£o desistiria de subir ao cĆ©u em um aviĆ£o feito a partir do prĆ³prio suor.

Silva conta, em seu livro A Decolagem de um Sonho, que nĆ£o foram raras as noites que se transformaram em madrugada e em dia de novo, antes que o trabalho no hangar parasse. Ao ser questionado sobre de onde vem tanta motivaĆ§Ć£o, Ć© categĆ³rico: ?Creio que vem da crenƧa do que fazĆ­amos. Acredito que tudo depende de inovaĆ§Ć£o, de coragem e muito amor (posso dizer, paixĆ£o!). Esses trĆŖs atributos estavam permanentemente nas nossas cabeƧas?.

O primeiro aviĆ£o brasileiro ? Depois de muito estudo, persistĆŖncia e bastante trabalho, nasceu o primeiro aviĆ£o construĆ­do no Brasil. Bandeirante era o nome dele. Com espaƧo para nove poltronas, o protĆ³tipo voou pelo cĆ©u de SĆ£o JosĆ© dos Campos, onde a equipe de Ozires trabalhava, sob o olhar atento dos engenheiros e de suas famĆ­lias. O teste foi um sucesso e deu mais Ć¢nimo a quem vinha dedicando tempo integral da vida Ć quele sonho.

Mas Ć© preciso lembrar que dificuldades sempre existiram. ?Muitas coisas deram errado, os recursos financeiros eram curtos, nĆ£o tĆ­nhamos dinheiro. Para construir o primeiro protĆ³tipo recorrĆ­amos Ć s Unidades de ManutenĆ§Ć£o da ForƧa AĆ©rea Brasileira e conseguĆ­amos ajuda de outros departamentos da aeronĆ”utica. Tudo era difĆ­cil?, recorda Silva.

Lidando com as perdas ? Uma semana depois do primeiro vĆ“o do Bandeirante, o piloto de testes que havia feito o aviĆ£o decolar, perdia a vida em um acidente de demonstraĆ§Ć£o com outro aviĆ£o da FAB. O fato mexeu com toda a equipe. Mas atĆ© nessas horas, o grupo encontrava uma maneira de se fortalecer. ?GraƧas ao espĆ­rito que prevalecia com a equipe, Ć©ramos todos amigos, sempre buscĆ”vamos nas revezes algo que nos ajudasse a prosseguir?.

Depois de algum tempo, Zico, o amigo de Ozires, tambĆ©m faleceu em um acidente aĆ©reo. O garoto que queria construir aviƵes sofreu, mas nĆ£o desistiu. Pelo contrĆ”rio, teve suas crenƧas fortificadas e empenhou-se mais para que o amigo, de onde estivesse, visse a criaĆ§Ć£o da fĆ”brica. Zico esteve na histĆ³ria da aviaĆ§Ć£o desde a Ć©poca das construƧƵes de pequenos planadores na infĆ¢ncia, atĆ© a formatura como aviador, no Rio de Janeiro. Depois dos estudos, Zico e Silva se separaram para pilotar aviƵes diferentes, mas o sonho continuou fazendo com que os dois se encontrassem.

Silva recebeu a notĆ­cia em meio aos preparativos para o primeiro vĆ“o do Bandeirante. ?Finalmente conseguimos realizar aquilo que se tinha sonhado. Infelizmente o Zico nĆ£o estava vivo para ver que tĆ­nhamos vencido. Mas acredito fortemente que ele, mesmo depois de morto, ajudou. O nĆŗmero de coincidĆŖncias favorĆ”veis que ocorreram nĆ£o foi somente ao acaso?, reflete. Nesse momento, muita gente teria desistido, mas Ozires trabalhou com maior afinco e concentraĆ§Ć£o. E, pouco tempo depois, lanƧava ao cĆ©u seu Bandeirante, frente Ć s autoridades mais importantes do paĆ­s. ?As perdas foram sempre muito difĆ­ceis, mas tinham de ser superadas?, reconhece. Anos mais tarde, esse mesmo aviĆ£o teria novos modelos e estaria atravessando outros continentes com a mesma perfeiĆ§Ć£o e leveza, tĆ£o peculiares a seu fim, quanto a seu criador.

Contatos ? Silva conta que muitos foram os momentos marcantes no processo de criaĆ§Ć£o da EMBRAER. E um deles determinou a criaĆ§Ć£o da empresa. Foi em maio de 1969, quando a equipe havia se empenhado em conseguir capitais privados para criar a empresa que fabricaria o Bandeirante. ?O ministro da aeronĆ”utica da Ć©poca insistia que o governo nĆ£o criaria mais uma empresa estatal e nĆ£o encontrĆ”vamos capitalistas no Brasil dispostos a colocar dinheiro em um aviĆ£o projetado no Brasil. EstĆ”vamos num impasse?.

O problema foi resolvido com a chegada do presidente Costa e Silva no hangar onde Ozires trabalhava com a equipe. NĆ£o havia autoridade para receber o presidente, por isso os engenheiros receberam-no e mostraram todo o processo de criaĆ§Ć£o de um aviĆ£o. ?Conversamos por uma hora com ele. Tivemos sorte e, sem dĆŗvida, conseguimos impressionĆ”-lo com o programa de desenvolvimento da indĆŗstria aeronĆ”utica que apresentamos?. Costa e Silva gostou da idĆ©ia e permitiu a criaĆ§Ć£o da primeira fĆ”brica nacional de aviƵes.

ExportaĆ§Ć£o ? A EMBRAER foi criada em 19 de agosto de 1969. A diretoria da empresa foi escolhida e tomou posse no dia 27 de dezembro do mesmo ano. Ozires Silva tornou-se presidente e seus colaboradores ganharam cargos de responsabilidade dentro da fĆ”brica. Para sobreviver, a EMBRAER fazia os aviƵes para treinamento de cadetes da aeronĆ”utica, o que nĆ£o era suficiente. Por isso os mercados da FranƧa, Inglaterra e Estados Unidos foram explorados.

Depois de muita paciĆŖncia e vĆ”rias reuniƵes, a empresa passou a fabricar os aviƵes que os clientes queriam ter. Segundo crenƧas da equipe, a EMBRAER nĆ£o vendia aviƵes, os aviƵes eram comprados pelos interessados. Todos possuĆ­am um certo ?ineditismo? nos mercados nacional e internacional.

Receita ? AlguĆ©m jĆ” mencionou a idĆ©ia de que verdadeiros grandes lĆ­deres sĆ£o conhecidos por sua simplicidade, que permanece depois que o objetivo traƧado torna-se real. Simples e educado. Assim Ć© Ozires Silva. Ao ser questionado sobre o que sente ao olhar para a empresa que idealizou a ajudou a construir, lembra das pessoas que o rodeavam enquanto a realidade era trabalho e sonho. ?Ɖ emocionante ver que aviƵes brasileiros voam por todo o mundo e ver aqueles que os fabricaram, pessoas e cidadĆ£os como nĆ³s, que aqui vivem, ao nosso lado!?.

E se alguĆ©m tiver um sonho que julgue grande e difĆ­cil de ser conquistado, o que deve fazer? ?A essas pessoas eu diria, sonhem e sonhem com coragem. Com determinaĆ§Ć£o, obstinaĆ§Ć£o e persistĆŖncia. Como sempre, os problemas precisam ser atacados por partes, como num bolo que Ć© comido por fatias. Se forem leais para com os objetivos, as chances de conseguir chegar Ć s metas crescem bastante. As dificuldades, em geral, nascem nas nossas cabeƧas?.

Para Saber Mais: A decolagem de um sonho ? A histĆ³ria da criaĆ§Ć£o da EMBRAER, de Ozires Silva. Editora: Lemos Editorial. Onde encontrar: www.livrariascuritiba.com.br Ozires Silva foi aviador da ForƧa AĆ©rea Brasileira (FAB), Ć© engenheiro aeronĆ”utico formado pelo ITA. Mestre em ciĆŖncias aeronĆ”uticas, pelo CalifĆ³rnia Institute of Technology (CALTECH). Trabalhou no Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro TĆ©cnico Aeroespacial (CTA), como diretor do departamento de aeronaves. Foi presidente da EMBRAER desde sua fundaĆ§Ć£o, em 1970, atĆ© 1986. Presidiu a Petrobras, foi ministro da infra-estrutura. Voltou Ć  presidĆŖncia da EMBRAER atĆ© sua privatizaĆ§Ć£o em 1995. Hoje trabalha como consultor empresarial e comunitĆ”rio.

Frases ?Por uma motivaĆ§Ć£o acima do comum, nunca pensamos em desistir. Sempre nos dizĆ­amos, nĆ£o percamos tempo em chorar com lĆ”grimas, usemos a disponibilidade do choro para colocar um parafuso a mais no nosso aviĆ£o?.

?Tudo depende de inovaĆ§Ć£o, de coragem e muito amor (posso dizer, paixĆ£o!). Esses trĆŖs atributos estavam permanentemente nas nossas cabeƧas?.

?Ainda hoje fico surpreendido por ver que o sonho foi superado pela realidade?.

?A legiĆ£o dos crĆ­ticos Ć© sempre ampla e criativa. Afinal, eles nĆ£o correm os riscos; somente aqueles que procuram construir Ć© que estĆ£o sujeitos a ser comparados com os resultados?.

ConteĆŗdos Relacionados

Pin It on Pinterest

Rolar para cima