A ditadura dos vendedores

Ainda há empresas que resistem à tendência de impor seus padrões ou considerar como um custo dispensável o que deve ser investido em atendimento. Mas infelizmente são poucas. A máxima de que ?o cliente sempre tem razão? já não é mais tão verdadeira. O que se percebe, hoje, é que certos cuidados, como tapete vermelho e atendimento cordial ficaram para trás. Evidentemente, não para todas as empresas, é claro, mas para grande parte. Atravessamos uma fase em que muitas companhias fazem questão absoluta de deixar marcado o seu ?conceito de negócio? a qualquer custo, mesmo que essa prática represente incomodar e irritar os clientes. Cada marca, varejista ou prestadora de serviços criou um estereótipo próprio, do qual, de certo modo, ficou prisioneira.

É justo ponderar que o conceito de cada negócio é o que o identifica perante o público, motivo pelo qual é importante que seja bem resolvido, de fácil leitura e bastante divulgado. Ocorre, no entanto, que muitos desses padrões têm se fixado de maneira impositiva, quase ditatorial. É uma postura equivocada, pois não permite à empresa saber o quanto aquilo agrada (ou não) o seu público. Temos, então, o ponto de partida para uma ?ditadura dos vendedores?, que se torna hegemônica a ponto de inverter os princípios básicos do marketing e da qualidade.

Nesse cenário, o cliente deixa de interessar como indivíduo. Não é mais o centro das atenções e torna-se apenas um número na contabilidade. Agora é ele quem deve se adequar aos novos paradigmas e à forma de atendimento que vem ?de fábrica?.

No varejo, principalmente em shoppings, é comum que o cliente seja recebido por funcionários vestidos como andarilhos, sugerindo algo que a pessoa não quer ou perguntando algo que ela não tem interesse em responder. O incômodo é ainda maior em lojas que subverteram a idéia do que é música ambiente. Algumas parecem mais uma danceteria, tal o tipo de música e o volume, não importando qual seja o perfil dos freqüentadores. Está dado o recado: cabe ao freguês se adaptar àquilo que a marca julga ser o melhor.

Há, ainda, exemplos pontuais. São os casos de lojas de roupas que, preocupadas apenas em vender, deixam de prestar a assistência necessária no pós-venda: o comprador que se vire para fazer a barra da calça ou para reparar eventuais defeitos na peça. Ou de redes de supermercados cujos programas de fidelidade oferecem benefícios e descontos irrisórios, que mais irritam do que agradam tal é a insignificância dos valores. Ainda no caso dos mercados, é forçoso constatar que, em nome de folhas de pagamento mais enxutas, foi abolida a figura do empacotador, um diferencial considerável no atendimento.

O caso desse último personagem, por sinal, é emblemático. Cada vez mais despenca o investimento com recursos humanos ou materiais para prestar uma melhor assistência aos freqüentadores de qualquer ambiente. Seja no cinema, onde não mais existe o lanterninha, em lojas de varejo, em que a quantidade de caixas costuma ser insuficiente para evitar filas ou em eventos esportivos ou culturais, onde o conforto e a segurança do público são artigos de luxo.

Igualmente importantes seriam os esforços para determinar a satisfação de quem consome um produto ou utiliza determinado serviço. Mas nem isso acontece. Muitas marcas resolveram não pedir mais a opinião de seus clientes, essencial para aprimorar o que é oferecido. Em alguns casos, o freguês sente-se até constrangido quando pensa em fazer qualquer tipo de reclamação.

Esses são apenas alguns elementos que traduzem a nova realidade imposta ao cliente. Ainda há empresas que resistem à tendência de impor seus padrões ou considerar como um custo dispensável o que deve ser investido em atendimento. Mas, infelizmente, são poucas. A situação só vai mudar quando o consumidor exigir seus direitos. Só então o mercado vai perceber que chegou o momento de deixar de lado o que cada marca ?acha? para, novamente, respeitar o cliente.

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